O projeto da Alca está de volta com nova roupagem

A Amcham (Câmara de Comércio Americana) propôs nesta terça-feira (30) a promoção de um acordo de livre comércio entre o Brasil e os Estados Unidos, ideia que também foi defendida pelo presidente Donald Trump e tem amplo respaldo no governo Bolsonaro. É uma nova versão do projeto de uma Área de Livre Comércio das Américas (Alca), apresentado em 1994 pelo ex-presidente Bill Clinton, que depois de anos de negociação e diante da forte oposição dos movimentos sociais e de forças e lideranças políticas progressistas acabou sendo derrotado e abandonado em 2005 durante a 4ª Cúpula da América.

Vivia-se à época uma conjuntura marcada pela rebeldia contra o imperialismo estadunidense, anseio de soberania e integração solidária dos países latino-americanos e caribenhos, com governos progressistas como o de Hugo Chávez na Venezuela, Lula no Brasil, Néstor Kirchner, na Argentina, Rafael Correia no Equador, Evo Morales na Bolívia, entre outros.

Anexação

Nas palavras do ex-presidente Lula, a Alca representaria uma “anexação” das economias latino-americanas e caribenhas pelos Estados Unidos. A assimetria no desenvolvimento da indústria e da tecnologia propiciaria enormes vantagens à maior potência capitalista do mundo na negociação, mas as nações americanas mais frágeis sairiam no prejuízo.

No Brasil, em particular, a redução ou eliminação de tarifas pode ser o golpe final na frágil indústria nacional, que já padece um crônico processo de desindustrialização, acelerado nos últimos anos pela crise econômica e o emagrecimento do mercado interno.

Mas o cenário geopolítico mudou, ou melhor regrediu miseravelmente. Desde o golpe de Estado perpetrado em 2016 a política externa tomou outro rumo no Brasil. Desprezou os ideais de integração solidária e soberania e alinhou-se novamente aos interesses e à orientação política emanados de Washington, começando pela entrega do pré-sal e a ofensiva contra a revolução bolivariana na Venezuela.

Bolsonaro radicalizou o retrocesso. Chegou ao ponto de bater continências à bandeira dos EUA, declarou que o bilionário Trump era seu grande ídolo e colocou o seu governo literalmente no colo do atual chefe da Casa Branca, entregando a base de Alcântara e acenando claramente para a neocolonização do Brasil. É algo que podemos definir como vergonhoso e indigno. A reação direitista por aqui foi complementada pela restauração do neoliberalismo na Argentina, no Equador, Chile e outros países. É a regressão em toda linha.

O acordo de livre comércio pode ser, para nós, o coroamento deste movimento reacionário no plano econômico. O império está colhendo os louros do golpe, do qual foi provavelmente o maior protagonista, grampeando e espionando a ex-presidenta Dilma Rousseff, a Petrobras, a Odebrecht, instruindo Sergio Moro e a Força Tarefa da Lava Jato numa operação que, embora sacralizada pela mídia burguesa, foi deletéria para a economia e nossa frágil democracia, pavimentou o caminho para o impeachment e a eleição de Bolsonaro. É imperioso resistir.

Umberto Martins