Trabalho de curta duração: a face moderna do retrocesso

No dia 14 de janeiro, a pedido do secretário geral da CTB, Wagner Gomes, representei a Central em uma reunião no Ministério do Trabalho para discutir um pré-projeto de lei, de iniciativa do governo, denominado “Trabalho de Curta Duração”. Nesta reunião estavam presentes representantes do governo, dos trabalhadores e do patronato.

A proposta apresentada pelo governo objetiva alterar a CLT criando mais um artigo, de maneira a permitir a celebração de contrato de trabalho de curta duração. Estabelece que o contrato não exceda a 14 dias corridos e nem ultrapasse, no período de 12 meses, 60 dias de contrato com relação ao mesmo trabalhador.

O pré-projeto traz algumas “pérolas” do tipo: “na contratação (…) não se aplicam o disposto nos artigos 29, 41, 451 e 452 da CLT”. Ou seja, o patronato se desobriga a efetivar registro na carteira de trabalho, se desobriga ainda de vincular a qualificação profissional à atividade desenvolvida. E mais, caso haja prorrogação do contrato, este não implicará em efetivação. Também está subentendida a ausência dos sindicatos nas negociações. Os representantes do patronato adoraram a proposta.

Para minha surpresa, o secretário de Relações do Trabalho do MTE, Manoel Messias, inicia a reunião sobre o trabalho de curta duração dizendo que traz uma importante “inovação nas relações trabalhistas”; que a motivação inicial para tal “inovação” são os eventos da Copa do Mundo e as Olimpíadas. Acha ele, entretanto, a ideia “tão nova, moderna e boa”, que merece se tornar permanente. Daí a necessidade de ser incluída na CLT.

Atente a maneira sutil como a questão é colocada. Aquilo que parece uma insípida nuance na relação capital-trabalho, carrega mudanças estruturais, com desdobramentos extremamente nocivos ao trabalhador e as suas organizações.

O que está por trás do trabalho de curta duração não é Copa do Mundo não são os shows que necessitam de pessoal para o evento. O que está por trás desta proposta são as exigências do mercado atual, onde a produção, antes em série e em massa para obter economia de escala, passou à produção variada, diversificada e pronta para suprir o consumo.

Este novo mercado exige que a produção e os serviços aconteçam por meio de um processo de acumulação flexível, sustentada num estoque mínimo e ancorado em um sistema de reposição, do tipo presente nos supermercados, onde a necessidade do consumidor é que irá determinar o que será posto a venda. Ela se apoia na flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e serviços e padrões de consumo.

A inversão da lógica da produção em massa faz com que a empresa se estruture a partir de um número pequeno de empregados, e a variação na demanda do produto ou serviço é que vai determinar se este pequeno número será aumentado ou não. E para que isto aconteça, um exército de reserva de trabalhadores desempregados é necessário.

Entretanto, para que a efetiva flexibilização do aparato produtivo e de serviços se realize, é também imprescindível a flexibilização das leis trabalhistas, e para tanto, a fragilização dos sindicatos por meio da sua retirada como porta vozes dos trabalhadores é, sem a menor dúvida, o maior alvo do patronato em uma economia que avançou da sua condição oligopolista para transnacional.

Em síntese, o que o mercado quer é usar os representantes dos trabalhadores para legitimar e o Estado para legalizar este, hoje, ainda pré-projeto de lei.


Francisco das Chagas Firmino do Nascimento, o Chaguinha, é economista, mestre em Educação pela Universidade de Brasília e secretário de Política Sindical e Relações Institucionais da CTB.

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