Temporão: Construção da hegemonia na era digital

Enquanto a esquerda não descer do salto intelectualóide e não criar fórmulas de popularização do seu projeto, a coisa só vai piorar. E me incluo nessa. Queria saber como ajudar nesse processo.

Nos últimos meses, desde o processo eleitoral, eu venho acompanhando os canais do YouTube por onde a direita se fez absoluta na comunicação fácil com os jovens no país. É uma surra. Não há, nem de longe, qualquer iniciativa democrática, progressista, nem precisa ser exatamente de esquerda, que chegue perto daquilo que o neo-direitismo ultraliberal construiu: diversos canais de diálogo, proliferação de ideias e, claro, espaços de difamação de qualquer coisa que pareça minimamente transformadora e humana.

Tenho acompanhado os vídeos do Mamãe Falei, do pânico da Jovem Pan, do Nando Moura, Danilo Gentilli, Olavo de Carvalho e muitos outros. São dezenas de canais, todos com milhões e milhões de views e milhões de seguidores fanáticos.

Quando entendi que, para combater essa direita orgânica e fascista, seria preciso entende-la, passei a acompanhar quase que diariamente o conteúdo dos vídeos. E fiquei bem assustado. A esquerda, os jovens universitários de humanas, a academia, uma certa elite intelectual mais polida, terá um trabalho que, se não é impossível, é hercúleo: conseguir popularizar o debate político dentro de um linguajar acessível e contextualizado.

Vendo esses vídeos da galera de direita o que mais me assustou foi a inacreditável superficialidade, a notável falta de qualquer leitura política aprofundada, a irresponsabilidade ética e o oportunismo absurdo dessa gente. Os caras demonizam a esquerda com argumentos totalmente frívolos, superficiais, mentirosos, porém fáceis, acessíveis, confortáveis e simples, acima de tudo, simples.

A esquerda precisará de uma nova forma para os seus conteúdos. Precisará sim fazer PROPAGANDA de si, precisará sim usar o SISTEMA para seu benefício. Enquanto a esquerda tiver esse discurso velho, acadêmico, empoeirado, antiquado e engessado do capitalismo malvado, do proletário oprimido e etc, nós seremos devastados pelo rolo compressor da contemporaneidade.

Esses formadores de opinião de direita representam pensamentos do senso comum ignorante que precisam ser rebatidos não com arrogância acadêmica, mas como uma forma de diálogo nova e igualmente simples. E o ponto mais sensível nesse debate é fazer as pessoas entenderem que ser de esquerda não é ser comunista. Ser de esquerda não é querer transformar o Brasil em Cuba.

Nós precisamos destruir esse maniqueísmo imbecilizado dos neoliberalóides da internet. Nós precisamos conseguir falar sobre equidade, políticas sociais, direitos humanos, direitos reprodutivos e etc e etc, DENTRO da lógica de uma sociedade moderna, capitalista, atual. Precisamos mostrar para as pessoas que essas preocupações SE ENCAIXAM na agenda atual, no mundo em que vivemos, que não é necessário nos tornarmos uma ditadura bolivariana para que essas pautas tenham lógica ou espaço.

Acho bacana o humor do Porta dos Fundos, da galera que tem feito coisas bacanas na Globo. São iniciativas de perpetuação da civilização. Mas ainda é muito pouco. Esses fascistas da neo-direita não têm a mais remota ideia do que eles estão construindo. São pessoas sem qualquer noção dos desdobramentos macropolíticos dos seus atos.

Esses caras estão construindo um Brasil cada vez mais selvagem, desumano, preconceituoso, racista, explorador, desigual, em nome da ‘modernização’ das coisas. São fantoches idiotizados de uma lógica liberal de botequim virtual. Não leram nada, não entendem nada, mas são poderosos. Hoje, quem tem o poder de ditar a agenda dos debates que estão no coração da nossa juventude é essa gente profundamente despreparada e equivocada.

Enquanto a esquerda não descer do salto intelectualóide e não criar fórmulas de popularização do seu projeto, a coisa só vai piorar. E me incluo nessa. Queria saber como ajudar nesse processo.

É preciso pensar nisso!

*Fernando Temporão é músico e compositor


Os artigos publicados na seção “Opinião Classista” não refletem necessariamente a opinião da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) e são de responsabilidade de cada autor.

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