Reflexões sobre o Desenvolvimento – I

Sobre o ecoimperialismo malthusiano, o desenvolvimento e a questão nacional

Um dos sinais mais evidentes da barbárie que ora vivenciamos é o neomalthusianismo ecoimperialista travestir-se de ideologia progressista, ultrarreacionário que é em toda a linha. Sua visão é neomalthusiana, nega a possibilidade de a Humanidade superar os desafios do crescimento populacional e da qualidade de vida. O problema seria inerente ao ser humano e sua natureza egoísta.

É uma visão conservadora, porque não enfrenta o imperialismo e o neocolonialismo, ao contrário, é sua tributária. É uma distopia segundo a qual o problema é o ser humano, em vez do capitalismo, e apela a um misticismo apocalíptico para interditar o debate…. Esse verniz de pureza é falso, e esconde interesses poderosos.

Fundamentalmente, longe de defender o Norte do Brasil, ignora as necessidades dos seus habitantes, chega até a defender o esvaziamento da região. Em vez de ver o desenvolvimento como único caminho possível à defesa da Amazônia, com a busca de um padrão sustentável, o que demanda recursos, volta-se contra os interesses do país e de seus habitantes com inexplicável orgulho.

De boas intenções, diz-nos o ditado, o inferno está abarrotado. E, a despeito delas, cabe-nos observar o mundo em que vivemos antes de nos iludirmos com o ecoimperialismo.  Afinal, é sabido e notório (a própria ABIN já o verificou) o financiamento estrangeiro a organizações célebres por sua campanha sistemática contra o desenvolvimento nacional. Vemos até jovens abnegados e sensíveis às causas solidárias iludirem-se e somarem-se a um verdadeiro roteiro de autoflagelação pátria, que serve ao extremamente subsidiado agronegócio europeu e estadunidense, mas não ao Brasil, nem à agricultura familiar ou à nossa soberania alimentar.

O complexo de vira-latas, que no passado recente assumiu ares de verdade econômica, com a teoria do PIB potencial, segundo a qual o Brasil “não suportaria” crescer acima de 3% ao ano, o que geraria inflação, agora se traveste de um “humanismo” anti-humano. Esposa uma suposta causa universal, que não teria fronteiras de classe, e com essa ilusão, soma-se a organizações financiadas por fontes do imperialismo interessadas em impedir o desenvolvimento do Brasil.

Nós, filhos do colonialismo e da escravidão, maiores preservadores e os que menos poluímos, somos convidados a sentarmo-nos cabisbaixos no banco dos réus da mídia oligopolista, e a nos conformar com um século XXI às escuras, literalmente. Sobre a Europa? Nada. E sobre os EUA? Nada. Mas sobre o Brasil, haja pancada.

É preciso, todavia, diferenciá-los dos lutadores consequentes do meio ambiente, dos lutadores sem-terra e da agricultura familiar, dos amazônidas afetados, dos brasileiros que defendemos a Amazônia. Essa diferença foi clara na Assembleia Mundial dos Movimentos Sociais, recentemente havida em Porto Alegre nos marcos do FST. Não é à toa que sua ênfase foi na denúncia do capitalismo e em defesa da Justiça climática. Mas há uma legítima desconfiança acerca do desenvolvimento, em face das deformações inerentes ao autoritarismo da Ditadura, e de episódios de modernização que dizimaram e expulsaram populações indígenas, além de malograr em grande medida. O “crescer o bolo para depois dividi-lo” ainda assusta.

Por isso mesmo é preciso refletir e agir segundo o presente e o futuro, no marco da atual realidade política, marcada pela tríplice conjunção de crescimento econômico, democracia, e novas forças sociais no governo central, uma realidade ainda marcada pela transição, pela busca de um novo Projeto Nacional de Desenvolvimento. Há um sentido progressista nas bandeiras do desenvolvimento dos países do Sul, da retomada do planejamento estatal em detrimento do fundamentalismo de mercado e em favor da superação da miséria e das desigualdades regionais. E ainda mais diante da crise capitalista e da contradição principal que o país enfrenta, com o capital financeiro e parasitário. Sem essas balizas, o debate perde o rumo.

O buraco é mais em cima: a hipertrofia do capital financeiro

Não é o desenvolvimento, mas a subserviência ao capital financeiro nesse tempo de crise do neoliberalismo que cobra alto preço à nossa soberania e ao meio ambiente. O capitalismo se choca com os interesses da Humanidade e a ameaça. E esse dreno a nós imposto atrasa o país e impede-nos de erigir, à imagem e semelhança das virtudes nacionais, o Brasil que queremos.

Quem paga 47% do Orçamento da União aos especuladores draculescos não pode ter dinheiro para investir num Projeto Nacional de Desenvolvimento com Valorização do Trabalho e Sustentabilidade. A sangria, aos borbotões, só não mata o paciente porque o BNDES, a Petrobrás, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica, o Bolsa Família e a Política de Valorização do Salário Mínimo nos salvam das garras da crise e do roteiro de miséria e desalento dos anos FHC. E cada uma dessas alavancas do crescimento vive verdadeiro bombardeio que busca desprestigiá-las. Não é à toa.

Há um intento de colocar o desenvolvimento como antagônico à sustentabilidade, o que deve ser rechaçado. Dissemina-se a ilusão perniciosa de que seremos salvos pela pequena propriedade, ignorando a inexorável força do avanço científico e tecnológico, do próprio capitalismo, e do imperialismo. Vejam a conveniência… Com um mundo caracterizado por empresas maiores que muitos países, o Brasil logrou erigir ferramentas da magnitude das empresas citadas que cumprem e cumprirão papel decisivo na luta por nosso futuro.

Nesse contexto, longe de demonizar as empresas públicas modernas e de porte, no campo ou na cidade, devemos entendê-las como parte do nosso projeto nacional e da integração latino-americana. Isso não significa negar o papel da pequena e da microempresa, tampouco o da pequena produção mercantil que se qualifica como agricultura familiar. Mas, para não ser demagógico, cumpre registrar que a sobrevivência e o papel de ambas carece é de investimento e apoio, e que a complementariedade econômica de distintas formas de propriedade deve ser uma meta, inclusive na primeira fase de transição do capitalismo para o socialismo.

A pobreza, o atraso tecnológico, o isolamento não são ideais progressistas, e nem é isso que os camponeses, ribeirinhos e indígenas desejam. Querem, sobretudo, serem parte do debate e das decisões sobre o futuro do país, e anseiam pela justa inclusão no projeto nacional e pela preservação do meio ambiente, é certo. Isso só é possível com recursos. Nós amamos os mais pobres e odiamos a pobreza.

Não podemos defender o atraso econômico e social como utopia. E isso não implica uma visão etnocêntrica, que negue as raízes culturais ou os modos de vida tradicionais. O que os nega é o silente extermínio da fome e de doenças, o abandono por parte do Estado, o isolamento e a exposição a formas bárbaras de exploração do meio ambiente típicas do abandono. E o Norte é muito mais que isso. Há metrópoles, há uma História, e todos são brasileiros.

Nem podemos tergiversar sobre as contradições inerentes ao conflito de classes na sociedade capitalista. A defesa da Nação e das populações deve estar no centro das lutas dos movimentos sociais que fazem suas legítimas lutas e pela primeira vez podem ter interlocução com o Estado em democracia.

É necessário de enfrentar o tema caso a caso, sem demagogia e preconceitos, e jamais à luz de fáceis e hipócritas lições de filmes da indústria do maior poluidor – como Avatar – ou de suas organizações. Esse é um assunto de brasileiros, de latino-americanos.

Sustentabilidade, só com soberania

Vivemos a crise do neoliberalismo, mas persiste o domínio do capital financeiro, acima dos interesses dos países, povos e do meio ambiente. O Estado deixa de ser mínimo e passa a ser o máximo para descer o porrete nos indignados, para saquear os trabalhadores, para promover guerras e amparar os parasitas da finança.

Ademais, é um cenário de mudança geopolítica imensa nos últimos 25 anos! É decisiva a dimensão estratégica do desenvolvimento, sem o que não poderemos resistir à ganância e agressividade das potências capitalistas, cuja crise permite antever a radicalização destes atributos. Ou seja, além de não ser correto o elogio da pobreza e do conservacionismo, é perigoso por ocultar a relevância da soberania nacional para a sustentabilidade.

Seguindo tão maus conselheiros, arriscamo-nos a menosprezar medidas urgentes e estruturais que precisam desafiar interesses poderosos. Medidas cujo impacto futuro assegurará ou comprometerá a integridade do Brasil, ameaçada em face de nossas imensas riquezas. São preocupantes os elementos que permitem antever infiltração imperialista na Amazônia, por compra de terras, por ONGs, assim como o intento de fazer esta distopia do elogio do atraso e da pobreza vicejar no próprio movimento social.

Assim, se não houver estratégia, projeto nacional, avanço tecnológico e industrial, soberania, se ficarmos ao bel prazer das forças do mercado e do saque dos especuladores, se não pensarmos o campo e a cidade, se não enfrentarmos as graves desigualdades regionais, não poderemos defender e desenvolver o Brasil, não poderemos preservar nem defender nosso meio ambiente, nem a Nação. (continua)


Paulo Vinícius é secretário da Juventude Trabalhadora da CTB

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