Pressão dos EUA sobre tribunal da Lava Jato é inaceitável intervenção no Brasil

O dirigente comunista José Reinaldo Carvalho (*) denuncia o caráter intervencionista da visita que o conselheiro para Assuntos Políticos da Embaixada dos EUA em Brasília, Willard Smith, fez na terça-feira (3) ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), o que na sua opinião configura também uma cumplicidade entre os Estados Unidos e a Operação Lava Jato

A visita nesta terça-feira (3) do conselheiro para Assuntos Políticos da Embaixada dos EUA em Brasília, Willard Smith, ao Tribunal da Lava Jato, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), onde foi recebido pelo presidente da corte, o desembargador Victor Luiz dos Santos Laus, é um inadmissível ato intervencionista nos assuntos internos do Brasil.

E da parte dos torquemadas que na usina de sentenças forjadas fabricaram as condenações ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva – uma das quais resultou no seu encarceramento durante 580 longos dias – é ato de lesa-pátria, uma vergonhosa demonstração de subserviência, uma ata de acusação a si próprios de que procuradores e juízes da Lava Jato estão ao serviço da estratégia de guerra jurídica de Washington contra a democracia na América Latina, que no caso do Brasil tem por alvo principal o ex-presidente Lula.

Causa repugnância a uma nação estarrecida, sob um golpe político e jurídico que resultou na instalação de um governo neofascista, que os torquemadas de Curitiba e Porto Alegre e os imperialistas estadunidenses não tenham tido sequer a preocupação de guardar as aparências.

É como se o pudor nas condutas políticas e diplomáticas tenha mesmo ido embora nesta época em que se abre nova etapa do golpe continuado no Brasil e da estratégia intervencionista estadunidense na região que o império considera seu quintal.

Tudo já acontece sob a luz dos holofotes e o esplendor das imagens de televisão. Na época dos golpes de antanho, certas ações eram feitas às escondidas e só vinham à tona décadas depois quando arquivos eram desclassificados.

Hoje, não. O golpismo doméstico, em contubérnio com o intervencionismo imperialista, atua de forma explícita. Têm a sensação da impunidade, tomados pela embriaguez da vitória, mesmo que conquistada no tapetão do “Parquet”.

Foi o que deixaram evidente o juiz e o diplomata no encontro desta terça-feira em Porto Alegre. O conselheiro representante de Trump no Brasil ressaltou que está se atualizando no acompanhamento da Operação Lava Jato, os julgamentos do Supremo Tribunal Federal (STF) e debates sobre temas como o compartilhamento de dados sigilosos de órgãos de controle financeiro sem prévia autorização judicial.

Por seu turno, o desembargador-chefe da corte da Lava Jato, que já atuou por duas vezes como algoz do ex-presidente Lula, destacou a importância de órgãos como a Embaixada norte-americana se aproximarem da Justiça e dos tribunais, pois isso a seu ver, possibilita uma maior integração e articulação entre as instituições.

A nova geração dos golpes de Estado na América Latina tem contado com o componente da chamada lawfare. Engendrada nos Departamentos de Estado, Justiça, Tesouro e órgãos de espionagem dos Estados Unidos, a estratégia foi e continua sendo aplicada com toda a intensidade no continente. Foi planificada durante mais de uma década para atacar, desestabilizar e derrubar os governos democráticos, populares e progressistas, que iniciaram uma experiência de integração regional, desenvolvimento autônomo e exercício de uma política externa anti-hegemônica.

Esta ofensiva, que integra a política de mudanças de regime, derrubou governos e condenou – em alguns casos, como o de Lula, prendeu – importantes líderes populares: Dilma Rousseff, Fernando Lugo, Cristina Kirchner, Jesús Santrich, Rafael Correa, Jorge Glas, Maurício Funes, que foram alvo de golpes de Estado ou processos judiciais.

A guerra jurídica, como instrumento de intervenção imperialista, aparece às claras – como a visita desta terça-feira do diplomata de Trump ao tribunal da Lava Jato deixa transparecer.

Em momentos como este e diante de tamanhas evidências de intervencionismo, convém refletir sobre as palavras do experiente diplomata Rubens Ricupero, que advertiu, em entrevista à revista “Isto É”, em maio deste ano: “É um equívoco ver os EUA como o país que deve nos liderar”.

Ou sobre a sentença do saudoso acadêmico Moniz Bandeira, um dos mais lúcidos estudiosos que tivemos sobre as ligações do Brasil com os Estados Unidos, que ele classificava como “relações perigosas”.

(*) Jornalista, editor do Resistência e Brasil 247, dirigente comunista e diretor do Cebrapaz.