O FED entre a cruz e a espada

O Federal Reserve (FED, banco central dos Estados Unidos) resolveu manter a taxa básica de juros em 2% na quarta-feira (25), depois de dois dias de reunião, interrompendo a política de gradual redução promovida desde setembro do ano passado (quando a taxa estava em 5,25%) em resposta à forte desaceleração da economia provocada pela crise imobiliária e financeira.

A decisão é um sinal de que o FED está entre a cruz e a espada. De um lado, a perspectiva de recessão realça a necessidade de uma redução maior da taxa, a exemplo do que foi feito em 2001 e 2002, quando os juros básicos desceram a 1% nos EUA. De outro, a aceleração da inflação e a persistente queda do dólar em todo o mundo sugerem que é imperativo mudar o viés da política monetária, ou seja, que é preciso começar a elevar a taxa básica.
 
Efeitos contraditórios

Os efeitos da política monetária norte-americana são contraditórios. Juros baixos beneficiam a economia por um lado, ao expandir o crédito e a demanda, incentivando o crescimento e amenizando ou revertendo processos de estagnação como o que se verifica neste ano. Em contrapartida, o dinheiro barato fortalece a tendência de declínio do dólar ao reduzir o apetite dos investimentos estrangeiros por ativos estadunidenses e também constitui um excelente alimento para a inflação ao estimular o consumo e encarecer as importações.
 
Não restam dúvidas de que a queda do dólar frente ao euro, ao iene, ao yuan, ao real e a diversas outras moedas foi alavancada pela redução dos juros básicos nos EUA. Daí emerge o dilema do senhor Ben S. Bernanke, presidente do FED. Os sinais mais fortes emitidos nos últimos dias indicam que em agosto será inaugurada uma nova trajetória para os juros, de viés altista.

Inflação

“Embora os riscos de redução do crescimento continuem, eles parecem ter diminuído de alguma maneira, mas os riscos de alta da inflação e as expectativas inflacionárias aumentaram”, afirmou o FED em comunicado à imprensa. As autoridades econômicas também externaram preocupação com a franca decomposição do padrão dólar, que compromete a hegemonia dos Estados Unidos no mundo. Mas, é pouco provável que possam fazer alguma coisa relevante a este respeito.

O declínio da moeda que por enquanto ainda lidera os negócios internacionais tem causas mais profundas, ancoradas no déficit comercial e no passivo externo dele conseqüente, que exacerba a necessidade de financiamento do balanço de pagamentos e torna os EUA cada vez mais dependentes da boa vontade dos governos e grandes capitalistas estrangeiros. É preciso acrescentar que o banco central não tem as mãos totalmente livres para manejar a política monetária. Juros em alta vão agravar a crise econômica e criar outros problemas.

Recessão

Convém lembrar, neste sentido, declarações recentes feitas pelo economista Alan Greenspan, ex-presidente do Federal Reserve. Em sua opinião nada otimista, a economia dos Estados Unidos está “à beira” de uma recessão. Por meio de videoconferência, Greenspan disse durante um evento em Johanesburgo (África do Sul) que as chances da produção recuar nos Estados Unidos superam os 50% e uma recuperação é improvável. Mas, o que nós temos a ver com tudo isto?
O x do problema é que ninguém está a salvo das perturbações que abalam as finanças de Tio Sam. As dificuldades da economia norte-americana afetam o mundo todo, incluindo (é óbvio) o Brasil. A depreciação do dólar talvez seja a principal causa da inflação mundial, pois infelizmente o dinheiro cunhado por Tio Sam cumpre as funções de unidade de conta e padrão de preços para as commodities e outras mercadorias negociadas no comércio internacional.
 
Juros no Brasil

O eco da mudança no viés da política monetária dos Estados Unidos já está ecoando por aqui. Declarações recentes do diretor de Política Econômica do Banco Central, Mário Mesquita, sugerem, nas entrelinhas, que os juros serão elevados na próxima reunião do Copom. O BC “fará o que for necessário para manter a inflação alinhada com a trajetória das metas”, salientou Mesquita.

O presidente da instituição, Henrique Meirelles, foi na mesma direção, ao reiterar quarta-feira (25-6) que “o Banco Central do Brasil está comprometido com sua política de metas de inflação”. Além disto, pediu maior “responsabilidade fiscal” (leia-se arrocho fiscal, novos cortes nos gastos e investimentos públicos). Este conservadorismo renitente da área econômica do governo pode abortar a retomada do desenvolvimento nacional e reverter a tendência de queda do desemprego. Os movimentos sociais devem colocar as barbas de molho e redobrar os esforços de mobilização contra os juros altos e por mudanças na política econômica.
 
 Umberto Martins é jornalista e assessor da CTB

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