Não é por salário, é pela Educação

A greve foi declarada. Nasceu da indignação. E essa indignação foi canalizada em um grande movimento que chegou a 70% da categoria.

Uma resposta quase que automática, visto que a questão econômica que assola os educadores do RS é grave. E se agravará com certeza, caso continue a mesma linha política do governo.

Temos o exemplo do Rio de Janeiro como um horizonte nada agradável, visto que lá a lógica do governo foi exatamente a mesma.

Esmagar o servidor público a fim de garantir as privatizações das estatais e serviços públicos.

Nascida dessa indignação e insuflada por constantes ameaças do governo de que a situação pode piorar, a greve fez com que a categoria (até então em estado de passividade) tomasse as proporções em que nos encontramos.

Completamos agora praticamente 2 semanas de greve. Até quando conseguiremos manter nossos colegas entusiasmados e esperançosos com a luta? Esse é um questionamento que deve ser central nesse momento. A indignação, por si só, não é motivo para manter uma categoria inteira mobilizada e em luta.

A indignação passa. O vislumbre de uma falta de perspectiva para a luta não só é nociva, mas pode ser fatal para o movimento.
O movimento precisa, a esta altura, alcançar um novo patamar. Atingir um nível de politização maior. Envolver muito mais do que somente os educadores em greve. Ganhar corações e mentes em toda a sociedade. Elevar o nível de conscientização da categoria.

O primeiro ponto a ser discutido é consolidar a nossa força e colocá-la em constante movimento. Conquistar todas as pequenas vitórias que estão aí para serem conquistadas.

Garantir o apoio dos estudantes, dos pais, da comunidade. Trazê-los para dentro da luta. Não há, para os educadores, melhores aliados do que a comunidade escolar. Não haverá vitória dos educadores sem a comunidade escolar.

A conquista da comunidade escolar para o apoio à greve trará, do ponto de vista pedagógico, um novo patamar de relação comunidade-escola quando as aulas forem retomadas.

O segundo ponto é a elevação do debate acerca da greve. Não é só pelo parcelamento. Não é somente pelas perdas salariais.

Deve ser, principalmente, pelas graves ameaças à nossa profissão que já estão sendo colocadas em prática tanto pelo governo estadual quanto o federal. A situação da Educação é de crise porque esta não é uma crise, mas um projeto.

Crise tem um caráter temporário, provisório. Um desafio a ser superado. A “crise” da educação é um projeto de desmonte das ações públicas junto à parcela mais vulnerável da sociedade.

Assim como é a “crise” da saúde e a “crise” da segurança.
Vendido como crise, o projeto de desmonte da salvaguarda estatal aos problemas sociais acaba ganhando apoiadores que acreditam nas “saídas” para tal crise, privatizações, terceirização, extinção de direitos.

Aqueles mais atentos sabem, que estas “soluções” apenas aprofundarão os problemas sociais que se acumulam a cada dia em nosso país e nosso estado.
No discurso neoliberal, o estado se torna um inimigo e as políticas públicas se tornam um peso para a população que já paga altos impostos.

E a Educação, ao fazer parte destas políticas públicas, fica na mira dos governos de tal afiliação ideológica.

Portanto, apontar o verdadeiro inimigo. Desconstruir seu discurso. Apontar que o único caminho para a educação pública, gratuita, universal e de qualidade é através do investimento estatal.

Do constante processo de qualificação dos espaços pedagógicos e dos educadores. Do investimento justo e necessário na Educação, embora previsto em lei e não talvez jamais levado à consequência.
E o terceiro ponto é a consolidação do grupo mobilizado e mobilizador como ponta-de-lança da luta pela Educação.

Muitos educadores tem se posicionado firmemente dentro do processo da luta. Estas lideranças que agora despontam já o são, na prática, durante o processo educativo normal, dentro de suas comunidades. Porém, o processo incomum da greve destaca as qualidades destes colegas.

Então, neste momento, estes líderes por força das circunstâncias precisam liderar com perspectiva. Para além da greve. Vislumbrar não só a vitória neste processo mas construir convicção sua e dos demais na força do coletivo.
Cada grevista agora é um líder. Elaborador de táticas, movimentações, mobilizações.

Cada grevista agora tem uma responsabilidade ainda maior com suas escolas e comunidades.

Cada grevista precisa estar atento ao quadro político, tanto no particular quanto no plano mais geral da luta.

A compreensão mais ampla torna a liderança mais eficaz e mais responsável. Possibilita que tomemos as informações colhidas e as usemos para reflexão, elaboração e consecução do movimento.

Ao final, a construção de um movimento mais consciente e vitorioso passa não exatamente pelas lideranças estaduais, dos diretores do sindicato. Mas principalmente pelas lideranças da base, que estão em cada escola, dialogando com os colegas, com os estudantes, com os pais.

E portanto, é preciso que esta liderança da base do movimento tenha esse poder de condução do movimento. Um movimento que veja não somente a questão salarial, mas principalmente a questão política, social e econômica que é o que realmente define.

A questão salarial, a precarização do prédio, a falta de material, o fazer pedagógico, tudo isso é consequência do projeto de desmonte da Educação, que deve ser nosso alvo hoje e sempre.

Cleber Custódio Duarte é educador em Igrejinha/RS, rede pública escolar gaúcha.

 Os artigos publicados na seção “Opinião Classista” não refletem necessariamente a opinião da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) e são de responsabilidade de cada autor.

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