A luta de classes na sociedade capitalista

Reproduzimos abaixo o texto do segundo vídeo do programa Consciência de Classe veiculado quinzenalmente no canal da CTB no Youtube. É importante que você dê um like no vídeo

Por Umberto Martins

Vimos no texto e vídeo anterior que a sociedade humana é dividida em classes sociais. Estas se definem conforma a posição que indivíduos e grupos ocupam no processo de produção e distribuição da riqueza social.

Filhas das desigualdades sociais, essas classes têm interesses divergentes, que se chocam e convivem em perene contradição no processo histórico. O conceito de luta de classes remete a esse confronto, que alguns economistas também designam de conflito distributivo. É uma luta pela distribuição da riqueza entre as diferentes classes e camadas das sociedades. Conflito distributivo é um eufemismo que inventaram para luta de classes.

As classes se dividem em classes dominantes, que ocupam uma posição privilegiada na pirâmide social, e classes dominadas ou subalternas. As primeiras controlam o poder econômico e político e, por este meio, exploram e oprimem as segundas.

Tivemos, por exemplo, no regime escravista os donos de escravos e os escravos, que foram por eles dominados e explorados impiedosamente. No feudalismo os senhores feudais, donos de grandes latifúndios, viviam às expensas dos servos. No capitalismo, o burguês lucra explorando o proletário, apropriando-se de parte significativa do valor por ele produzido durante sua jornada de trabalho. Extrai aquilo que o pensador alemão Karl Marx batizou de mais-valia, que é o segredo do lucro capitalista.

O conceito de luta de classes tem uma relevância central na teoria socialista desenvolvida por Karl Marx e Friedrich Engels, outro grande pensador alemão. No Manifesto Comunista, publicado na Europa em 1848, ano de grandes agitações sociais, esses dois filósofos revolucionários observaram que a história de todas as sociedades é a história da luta de classes. A luta de classes é a força motriz das revoluções, dos conflitos e das transformações políticas, econômicas e sociais.

Homem livre e escravo, patrício e plebeu, barão e servo, membro das corporações e aprendiz, patrão e empregado. Opressores e oprimidos sempre estiveram em contraposição uns aos outros e envolvidos em uma luta ininterrupta, ora disfarçada, ora aberta, que terminou sempre com a transformação revolucionária da sociedade inteira ou com o declínio conjunto das classes em conflito.  

No capitalismo, cujo desenvolvimento é marcado pela dialética conflituosa entre capital e trabalho, uma das formas mais óbvias e conhecidas da luta de classes ocorre durante as negociações coletivas entre empregados e patrões.

Nessas ocasiões, que no Brasil acontecem ordinariamente uma vez por ano nas datas-base das categorias profissionais, os trabalhadores e trabalhadoras geralmente reivindicam melhores condições de vida e trabalho. Salários maiores, redução de jornada e aumento no valor de benefícios como Plano de Saúde, Participação nos Lucros e Resutados, vale refeição e outros.

Os patrões, por seu turno, revelam interesses opostos e costumam apresentar contra-propostas sugerindo o congelamento ou mesmo corte de salários, aumento de jornada e redução de garantias e benefícios trabalhistas.

Quando as negociações não chegam a um bom termo o conflito de interesses deságua na greve, um recurso extremo usado pela classe trabalhadora na luta em defesa de seus direitos.

A greve é uma das manifestações mais conhecidas e recorrentes da luta de classes no capitalismo. Reflete a contradição entre lucros e salários, com o patrão querendo aumentar os seus lucros reduzindo a renda dos trabalhadores, que por seu turno querem o aumento dos salários em detrimento dos lucros. O conflito reflete e explicita a divergência de interesses.

Greve é uma arma dos pobres, dos explorados. Observem que os ricos, os burgueses, os exploradores, não fazem greve, como assinalou o grande filósofo brasileiro Álvaro Vieira Pinto. É a principal forma da luta de classes no plano econômico. Mas é preciso compreender que não é a única expressão da luta de classes entre capital e trabalho. 

Na verdade, o conceito de luta de classes é mais complexo do que pode parecer à primeira vista. O senso comum, orientado pelo pensamento dominante, tem uma compreensão limitada do fenômeno. Em geral, reduz as lutas de classes aos choques diretos entre ricos e pobres que se verificam nas greves, na rotina das campanhas salariais, no cotidiano fabril. Enxerga a luta de classes no plano econômico, mas geralmente não percebe suas outras dimensões.

A luta de classes não ocorre apenas entre patrões e empregados ou entre capital e trabalho, embora este seja um aspecto central e prioritário. Ocorre também no interior da burguesia, entre industriais e comerciantes, entre os ricaços do campo e cidade. Observam-se divergências igualmente no seio da própria classe trabalhadora, assim como nas chamadas classes médias. 

Além disto, é importante entender que a luta de classes acontece em três diferentes dimensões ou planos sociais. Temos a luta de classes no plano econômico, da qual já demos exemplos com as campanhas salariais e as greves. Mas temos também esta mesma luta nos planos político e ideológico.

Engels considerava a luta de classes como a grande lei do movimento da história. Afirmou que todas as lutas históricas, quer se desenvolvam no terreno político, no religioso, no filosófico ou noutro terreno ideológico qualquer são a expressão mais ou menos clara de lutas de classes sociais. A existência destas classes, e portanto também as colisões entre elas, são condicionadas, por sua vez, pelo grau de desenvolvimento da sua situação económica, pelo caráter e pelo modo da sua produção e da sua troca, condicionada por estes.

Conflitos sociais no âmbito jurídico, parlamentar, religioso, em geral são formas muitas vezes camufladas da luta de classes. Mao Tse Tung, comandante da revolução socialista chinesa de 1949, também analisou o tema. Assinalou a identidade entre luta de classes e luta nacional contra o imperialismo e concluiu que, nas condições da China à época, a luta de classes era a luta pela libertação nacional.

“Na luta contra um inimigo nacional, a luta das classes assume forma de luta nacional, nisso se manifestando a identidade dessas duas lutas”, afirmou o líder chinês.

A luta contra o imperialismo é a luta contra o domínio da aristocracia financeira internacional. É luta nacional e é também luta de classes em uma de suas mais relevantes formas.

O influente filósofo italiano Domenico Losurdo (foto com datas) entende que a teoria da luta de classes se configura como uma teoria geral do conflito social. Compreende, em sua opinião, a luta nacional pela autodeterminação dos povos, a luta entre ricos e pobres, a luta pela emancipação das mulheres, a luta contra a discriminação racial. Losurdo é um filósofo muito estimado e citado por Caetano Veloso, um dos maiores compositores e poetas da nossa MPB.

Abordaremos em outros vídeos (e textos) os conceitos de luta ideológica e luta política.

Uma breve indicação de textos para aprofundar a compreensão do tema:

Domenico Losurdo – A luta de clases, uma história política e filosófica

Por que os ricos não fazem greve? Álvaro Vieira Pinto

Prefácio de Engens aqui

Manifesto Comunista

Mao, A identidade entre luta de classes e luta nacional

Veja o vídeo aqui