A atualidade do anticomunismo

Manifestações recentes atacam o comunismo e tentam desqualificar os comunistas. A Santa Aliança estabelecida entre o papa, chefes de estado, teóricos e militares a serviço da burguesia demonstra o temor desta classe diante da alternativa proletária ao capitalismo e aponta para a necessidade – e por isso atualidade – do anticomunismo. De quebra, joga por terra as ilusões dos que acham que as classes dominantes serão persuadidas da necessidade de superação do sistema baseado na exploração do trabalho pelo capital.

Mesmo após o fim do socialismo na Europa, mesmo sem a existência de organizações comunistas fortes nos países capitalistas centrais, mesmo com as esquerdas à procura do melhor caminho revolucionário (revolução! a própria palavra anda confinada aos dicionários), mesmo com as concepções direitistas e religiosas avançando sobre as mentes de novas e velhas gerações… Mesmo com tudo isso e mais, o espectro do comunismo continua rondando o mundo capitalista. As classes dominantes e seus ideólogos e agentes em todos os continentes, e no nosso país inclusive, necessitam do anticomunismo para se manter no poder, pois a atual sociedade precisa ser substituída, e a sua substituta mais avançada é a sociedade comunista.

Os ataques são os mais diversificados – de elaboração sofisticada, como no caso de uma encíclica papal; de aparente ingenuidade, como a do presidente que pede “liberdade” em Cuba; de grosseira estupidez, como a do general que saiu da ativa saudoso da ditadura Médici.

Nos momentos em que as contradições se agudizam e, mesmo sem a necessária unidade de ação e de propósitos, a presença dos proletários e demais trabalhadores se faz mais marcante no cenário político e social, a burguesia tenta isolar os socialistas e os representantes da esquerda no parlamento e no conjunto da ação social.

No embate político, são tratados com descrédito ou rebaixados à condição de personagens cômicos – mas perigosos – os que, no poder, comprometem-se com o socialismo. É o que ocorre nas investidas em “defesa da liberdade” contra o governo chinês (contrapondo a ele – mirem só! – o medievalismo anacrônico e místico do damaiilismo; nas calúnias contra Cuba ou na ridicularização dos discursos e posicionamentos do bolivariano Hugo Chávez.

No embate ideológico, recorre-se à única arma encontrada para refutar o marxismo: desvirtuá-lo, desfigurá-lo, aproveitar do desconhecimento que mesmo estudiosos têm de seu conteúdo e método materialista-dialético. Com isso, a obra e os pressupostos teóricos de Marx e Engels já teriam sido ultrapassados e ido para a lixeira da história. Mas nada de citar os autores! Nada de transcrever trechos de suas obras! Jamais!

Na sua encíclica Spe Salvi (Salvos pela Esperança), de 30 de novembro de 2007, o papa Bento XVI vitupera contra “o erro fundamental de Marx”, que não soube dizer como construir uma sociedade justa, sem Deus. Segundo o chefe da Igreja Católica, Marx “supunha simplesmente que, com a expropriação da classe dominante, a queda do poder político e a socialização dos meios de produção, ter-se-ia realizado a Nova Jerusalém. Com efeito, então ficariam anuladas todas as contradições; o homem e o mundo haveriam finalmente de ver claro em si próprios.

Então tudo poderia proceder espontaneamente pelo reto caminho, porque tudo pertenceria a todos e todos haviam de querer o melhor um para o outro. Assim, depois de cumprida a revolução, Lenin deu-se conta de que, nos escritos do mestre, não se achava qualquer indicação sobre o modo como proceder. É verdade que ele tinha falado da fase intermédia da ditadura do proletariado como de uma necessidade que, porém, num segundo momento ela mesma se demonstraria caduca. Esta ‘fase intermédia’ conhecemo-la muito bem e sabemos também como depois evoluiu, não dando à luz o mundo sadio, mas deixando atrás de si uma destruição desoladora. Marx não falhou só ao deixar de idealizar os ordenamentos necessários para o mundo novo; com efeito, já não deveria haver mais necessidade deles. O fato de não dizer nada sobre isso é lógica consequência da sua perspectiva. O seu erro situa-se numa profundidade maior. Ele esqueceu que o homem permanece sempre homem. Esqueceu o homem e a sua liberdade. Esqueceu que a liberdade permanece sempre liberdade, inclusive para o mal. Pensava que, uma vez colocada em ordem a economia, tudo se arranjaria. O seu verdadeiro erro é o materialismo: de fato, o homem não é só o produto de condições econômicas nem se pode curá-lo apenas do exterior criando condições econômicas favoráveis”.

Deixando de lado os disparates da interpretação papista do marxismo – Marx nunca disse que o homem é só produto de condições econômicas e nem pretendia uma Nova Jerusalém (deus nos livre!) no mundo e Lenin sempre recorreu aos textos e à metodologia marxista para desvendar os caminhos para a construção do socialismo –, o que chama a atenção é a necessidade de, mais de 150 anos depois, o papa continuar a conjurar o comunismo, como registraram Marx e Engels do Manifesto do Partido Comunista, em 1847.

Em 23 de maio de 2008, quando ainda disputava o comando do imperialismo estadunidense, o candidato do Partido Democrata, Barack Obama, discursou na Fundação Nacional Cubano-Americana, criada pelo ex-presidente, Ronald Reagan, do Partido Republicano, e se comprometeu: “Juntos vamos buscar a liberdade para Cuba; essa é minha palavra; esse é meu compromisso… É hora de que o dinheiro estadunidense faça com que o povo cubano seja menos dependente do regime de Castro. Vou manter o embargo.”

À época, o líder da revolução cubana, Fidel Castro, escreveu: “Alguém teria que dar uma resposta serena e sossegada, que deve navegar hoje contra a poderosa maré de ilusões que na opinião pública internacional despertou Obama” (os negritos são dele, Fidel). Obama venceu e vem pondo fim à administração terrorista e de trevas de seu antecessor, George W. Bush, à frente dos EUA. Mas no seu discurso de posse, em 20 de janeiro de 2009, num trecho pouco citado pelos analistas que insistem em não ver o caráter de classe de seus posicionamentos, lembrou que “gerações que nos antecederam enfrentaram o fascismo e o comunismo, não apenas com mísseis e tanques, mas com alianças robustas e convicções duradouras. Eles compreendiam que o poder sozinho não pode nos proteger e nem nos dá o direito de fazer o que quisermos. Em vez disso, eles sabiam que nosso poder cresce por meio de sua utilização prudente; nossa segurança emana da justiça de nossa causa, da força do nosso exemplo, das qualidades temperantes da humildade e do autocontrole. Somos os guardiões desse legado”.

Vale-se do surrado, mas não desacreditado, recurso de comparar o fascismo com o comunismo (quando os comunistas foram os primeiros e dos mais acirrados combatentes pela liberdade, contra os fascistas). E ainda nos impinge que os imperialistas norte-americanos, que tantos crimes cometeram e cometem no continente americano e em todos os cantos do mundo, movem-se animados pela “justiça de nossa causa” e que ainda são exemplares, humildes e autocontrolados. Quanta desfaçatez!

No Brasil, o general Paulo César de Castro, até então o principal responsável pelo ensino no Exército e membro do Alto Comando do Exército, disse no início do mês, irado, na sua despedida da tropa para vergar o pijama, que os “arautos da sarna marxista”, a quem considera inimigo “astuto e insidioso”, continuam em ação. Não deixa de ter razão ao considerar os marxistas seus inimigos, saudoso que é da ditadura militar que enlutou e entristeceu o país de 1964 a 1985; não há que negar também que os comunistas tiveram que ser astutos, caso contrário teriam sucumbido ao terrorismo dos militares no poder. Mas, insidiosos?

Insidiosos são enganadores, traiçoeiros, pérfidos. E o Manifesto do Partido Comunista – se é que este general que andou deformando corações e mentes de novas gerações de militares já o leu ou permitiu que seus pupilos o lessem – encerra com esta declaração de propósitos nada insidiosa:

“Os comunistas consideram indigno dissimular as sua idéias e propósitos. Proclamam abertamente que os seus objetivos só podem ser alcançados derrubando pela violência toda a ordem social existente. Que as classes dominantes tremam ante a idéia de uma Revolução Comunista! Os proletários não têm nada a perder com ela, além das suas cadeias. Têm, em troca, um mundo a ganhar.

Proletários de todos os países, uni-vos!”

Penso, logo insisto
Encerro com uma homenagem a Mario Benedetti (1950 – 2009), imortal poeta e lutador uruguaio. Melhor, encerro com um poema de Mario Benedetti que homenageia a nós, mortais e lutadores.

“Oda a la mordaza

… pienso
luego insisto

a tu custodia queda  mis labios apretados
quedan mis incisivos
colmillos
y molares

queda mi lengua
queda mi discurso
pero no queda en cambio mi garganta

en mi garganta empiezo
por lo pronto
a ser libre
a veces trago la saliva amarga
pero no trago mi rencor sagrado

mordaza bárbara
mordaza ingenua
crees que no voy a hablar
pero si hablo
solamente con ser
y con estar…”
 

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