Luta agora é no Senado

O Plenário da Câmara dos Deputados concluiu, nesta quarta-feira, 7, a votação em segundo turno da proposta de reforma da Previdência (PEC 6/19). Todos os destaques apresentados foram rejeitados. A CTB e demais centrais sindicais, em aliança com os movimentos sociais, atuarão, agora, junto aos senadores para diminuir os danos causados aos trabalhadores. “Visitaremos os gabinetes dos senadores, pressionaremos nos estados e atuaremos nas ruas para denunciar os prejuízos causados aos trabalhadores por essa reforma”, anuncia o presidente da CTB, Adilson Araújo.

A reforma proposta pelo Governo Bolsonaro, com substitutivo do deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), aumenta o tempo para se aposentar, limita o benefício à média de todos os salários, eleva as alíquotas de contribuição para quem ganha acima do teto do INSS e estabelece regras de transição para os atuais assalariados. Servidores e trabalhadores da iniciativa privada que se tornarem segurados após a reforma terão garantida na Constituição somente a idade mínima. O tempo de contribuição exigido e outras condições serão fixados definitivamente em lei. Até lá, vale uma regra transitória.

O texto que vai ao Senado estabelece idade mínima para aposentadoria: 62 anos para mulheres e 65 para os homens. O tempo de contribuição necessário é de 15 anos, mas para receber benefício maior o trabalhador precisará contribuir por mais tempo — com 40 anos de recolhimento, ficará com o total da média de todos os salários de contribuição, sendo que tal valor não pode ultrapassar o teto do Regime Geral — atualmente, em R$ 5.839,45. A proposta também aumenta alíquotas previdenciárias.

Pensão por morte

Um dos temas mais polêmicos foi a possibilidade de pagamento de pensão por morte em valor inferior a um salário mínimo, violando a Constituição. Além da oposição, mesmo parlamentares governistas se pronunciaram contra a medida. Para garantir sua aprovação, o governo publicou portaria da Secretaria de Previdência Social do Ministério da Economia definindo o que é considerado renda formal, o que garantia o pagamento do salário mínimo. Isso levou à rejeição, por 339 votos a 153, do destaque do PCdoB que pretendia retirar a nova regra da PEC. PP, MDB, PTB, PSL, PL, PSD, PRB, DEM, PSDB, Pros, PSC, Solidariedade, Podemos, Cidadania, Novo, Avante e Patriota orientaram os parlamentares a votarem contra o pedido, apoiado pelo PCdoB, PT, PSB, PDT, Psol, PV e Rede.

“O governo anunciou um acordo que, em tese, garantiria esse benefício. Mas se garante, por que não apoia o destaque do PCdoB? Porque garantiríamos a proteção na Constituição, não na portaria de um secretário, não em uma lei complementar. Amanhã, mudando o governo, quem vai garantir esse acordo?”, questionou o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP).

O deputado Afonso Motta (PDT-RS) ressaltou que o piso do mínimo só está garantido para quem tem renda formal. “Em que pese o entusiasmo pela portaria governamental, ela trata da renda formal. Ela não garante a pensão do salário mínimo para a viúva”, disse Motta.

Destaques rejeitados

A oposição ainda tentou suprimir da proposta a contribuição previdenciária mínima, pensão por morte inferior a 1 salário mínimo, renda familiar para acesso ao Benefício de Prestação Continuada (BPC), abono salarial do PIS/Pasep, regra de transição com pedágio de 100%, pedágio de 100% da regra de transição, regra de transição para atividades com exposição a agentes nocivos e regras de cálculo dos benefícios previdenciários.

Esta foi a votação dos destaques:

– destaque do PT, rejeitado por 364 votos a 130, permitia contar o mês de contribuição mesmo que o recolhimento feito pelo segurado fosse sobre valor inferior ao salário mínimo;

– destaque do PCdoB, rejeitado por 339 votos a 153, pretendia excluir dispositivo que permite o pagamento de pensão por morte de valor inferior a um salário mínimo se o beneficiário receber outra renda formal;

– destaque do PT, rejeitado por 346 votos a 146, queria excluir da PEC regra que restringe o recebimento do BPC a pessoa idosa ou com deficiência de família com renda mensal per capita inferior a um ¼ do salário mínimo;

– destaque do Psol, rejeitado por 345 votos a 139, queria manter a regra atual de pagamento do abono do PIS/Pasep para quem recebe até dois salários mínimos. A PEC prevê o direito somente para os trabalhadores de baixa renda, definidos como quem recebe até R$ 1.364,43 ao mês;

– destaque do PDT, rejeitado por 352 votos a 136, que pretendia excluir a exigência do “pedágio” de 100% do tempo de contribuição que faltar para atingir o requisito de 30 anos de recolhimento para mulher e de 35 anos para homem no âmbito de uma das transições para segurados do INSS e servidores públicos;

– destaque do PSB, rejeitado por 347 votos a 137, propunha excluir o aumento de pontos exigidos do trabalhador sujeito a agentes nocivos (químicos, biológicos e físicos) na regra de transição. Esses pontos são a soma de idade e tempo de contribuição;

– destaque do PT, rejeitado por 352 votos a 135, que pretendia manter o cálculo atual das aposentadorias pela média dos 80% maiores salários de contribuição, em vez da proposta, que determina a média de todos os salários de contribuição.

– destaque do Novo, rejeitado por 394 votos a 9, queria excluir a transição para servidores públicos e segurados do INSS na qual se exige “pedágio” de 100% do tempo de contribuição que faltar para cumprir esse requisito. Com isso, foram mantidas as idades especiais de aposentadoria para professores. Os trabalhadores da categoria se aposentarão aos 60 anos (homens) e 57 anos (mulheres), desde que cumpram o pedágio especial de 100% do tempo que falta para a aposentadoria pelas regras atuais. O Novo queria retirar esse ponto do texto, assim como toda a regra de transição que instituiu o pedágio de 100%. Caso o destaque fosse aprovado, os professores se aposentariam aos 65 anos (homens) e 62 anos (mulheres). Além de suprimir a regra que menciona uma redução da idade de aposentadoria para os professores, o destaque retiraria a garantia de que os benefícios previdenciários seriam reajustados pela inflação para garantir seu valor real.

Pressão no Senado

O coordenador geral da Confederação dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee), Gilson Reis, considera a reforma “o maior retrocesso da história da Previdência e do trabalho no Brasil”. Para ele, o argumento de que a reforma vai recuperar a economia, “é um engodo. Na prática, quer transferir R$ 1 trilhão da população mais pobre, dos trabalhadores do Brasil, para os bancos, o sistema financeiro”. A mobilização da sociedade “será fundamental para alterar o projeto no Senado de forma mais profunda, evitando os enormes prejuízos que a reforma de Bolsonaro impõe”, afirmou.

Lamentando o resultado da votação na Câmara, o presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Adilson Araújo, destaca, porém, “que a resistência e a luta das centrais sindicais e movimentos sociais não têm sido em vão. Resultaram desta luta, que compreendeu manifestações massivas e a greve geral de 14 de junho, a retirada da PEC do modelo de capitalização pretendido pelo ministro Paulo Guedes, que significaria o fim das aposentadorias públicas, bem como o aumento da idade requerida para aposentadoria rural das mulheres e redução do valor do BPC, entre outras conquistas”.

Para o secretário de Assuntos Jurídicos da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Valeir Ertle, os deputados governistas “não tiveram o mínimo de sensibilidade social, apesar de nós termos discutido, conversado com todos os partidos para colocar essas questões todas. Vamos fazer um trabalho agora no Senado para tentar reverter esse processo”.

No Senado, a reforma também terá que passar por duas votações, com o apoio de, ao menos, 49 dos 81 senadores. O presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), afirmou que assim que receber a proposta, ela será encaminhada à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Segundo o presidente, a ideia é que a presidente da CCJ, senadora Simone Tebet (MDB-MS), e o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) — que deve ser o relator da matéria —, acertem um cronograma mínimo de debates. Os líderes de todos os partidos terão direito a sugerir audiências e debates e opinar sobre o calendário da tramitação da reforma, sempre respeitando o Regimento Interno. “Não é bom estabelecer um prazo, mas dentro desse cronograma teremos entre 45 e 65 dias para debater a matéria — declarou Davi.

Alguns senadores anunciaram que vão apresentar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para estender a reforma aos servidores públicos de estados e municípios, atentando a pedidos de governadores e prefeitos.

Carlos Pompe e Umberto Martins