FMI sugere mais arrocho salarial na América Latina

Em uma entrevista em Washington nesta segunda-feira (23-6), antes de viajar para o México, Strauss-Kahn indicou a contenção dos salários como a chave para garantir a estabilidade monetária e a credibilidade das autoridades econômicas. É um discurso batido, que a classe trabalhadora brasileira conhece bem.

Cinismo

Para Strauss-Kahn é preciso evitar "aumentos de salários que se seguem aos aumentos de preços". O FMI teme que o nível atual de inflação se incorpore na negociação dos contratos, começando com pelo funcionário público. 
Seguir a recomendação do FMI significa impor novas perdas ao poder aquisitivo dos salários ou aos valores reais dos salários. A entidade acredita que este é o preço amargo que a sociedade deve pagar para garantir a estabilidade dos preços. A sugestão revela-se cínica quando se verifica que não se aplica ao salário do senhor Strauss-Kahn, que, além de ser livre de impostos, está vinculado à inflação da região de Washington. Isto nos lembra um velho ditado popular: “pimenta em olho alheio é refresco”.

Interesses capitalistas

Essas declarações demonstram que, apesar da retórica em contrário, o FMI não mudou nem vai mudar. Desfila pela mídia como uma instituição multilateral, mas na realidade não passa de um instrumento servil das multinacionais e do capital financeiro internacional. Por acaso são os salários que estão provocando inflação no mundo?
A resposta a tal pergunta é obviamente negativa. Há mais de uma causa para a elevação dos preços, destacando-se os desequilíbrios internacionais provocados pela crise da hegemonia econômica dos EUA e a decomposição do padrão dólar. Os salários não estão entre essas causas e a não ser por má fé nenhum economista sério ousará dizer o contrário. Resta saber por que o FMI quer que a classe trabalhadora pague a conta de uma instabilidade irradiada do centro do sistema imperialista.

Falsos argumentos
 
A alegação de que reajustes salariais provocam inflação é tão velha quanto o próprio capitalismo. Em pleno século XIX, o filósofo alemão Karl Marx, defensor e teórico da classe operária, já refutava as falsas idéias que sustentavam a pregação neste sentido (no ensaio intitulado “Salários, preços e lucros”), provando que elas não tinham bases científicas e no fundo refletem os interesses dos capitalistas.
No Brasil, durante o período de inflação alta (anos 1980 a 1994) também cansamos de ouvir tal ladainha. É preciso colocar as barbas de molho, pois apesar de estar com o prestígio em queda, o FMI e suas idéias neoliberais ainda têm forte influência sobre as autoridades econômicas em vários países latino-americanos, inclusive nesses tristes trópicos. 
 
Inflação na AL

A aceleração da inflação é um problema mundial. Na América Latina nenhum país está a salvo do problema. No Peru a inflação ronda cerca de 5% por ano, frente à meta oficial de 2%, já no Chile supera 8%, em comparação com a meta de 2% a 4%. No Uruguai se aproxima de 10%, frente ao objetivo de 4% a 6%. Na Venezuela, pode chegar a 25,7% este ano, segundo previsões do FMI.

Cumpre ressaltar a contribuição da evolução do preço do petróleo neste processo. Em junho do ano passado o barril do Petróleo Intermediário do Texas (WTI, leve), de referência nos Estados Unidos, rondava os US$ 70, um valor considerado muito alto então, mas que empalidece frente à cotação de quase US$ 135 de hoje.

Outro motor da inflação são os alimentos. O milho, por exemplo, aumentou 140% nos últimos quatro anos, até alcançar US$ 281 por tonelada no Mercado de Chicago. Além disso, subiram outros tipos de produtos, desde o refresco até a carne.

Outro caminho

A classe trabalhadora e o movimento sindical repudiam a sugestão do FMI. Não há dúvidas de que a inflação é um flagelo social, sobretudo para os pobres. Todavia, é preciso combatê-la com mais desenvolvimento e valorização do trabalho, não com estagnação, arrocho salarial e desemprego. Tudo que tivemos com a imposição das receitas do FMI no Brasil foi desnacionalização, recessão e forte redução da participação dos salários no PIB.

Nas campanhas salariais as categorias não devem abrir mão da recomposição do poder de compra e de aumentos reais. O movimento sindical brasileiro está unificado na luta por um novo projeto de desenvolvimento, fundado na soberania e na valorização do trabalho. Os salários não podem ser sacrificados em nome da estabilidade monetária. Basta de FMI!

Umberto Martins é jornalista e assessor da CTB

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