Organização regional será prioridade do novo secretário-geral da UIS Metal

Após cinco anos de bons trabalhos à frente da Secretaria de Organização da União Internacional dos Sindicatos de Metalurgia e Mineração (UIS Metal), o brasileiro Francisco Souza ocupará, a partir desta sexta-feira (25), a Secretaria Geral da entidade. Para ele, o contexto atual exige que a UIS Metal aprimore sua organização regional em cada continente, para em seguida alcançar um novo patamar em nível mundial.

Nesta entrevista, Francisco Souza fala também da geopolítica mundial, do modo como o mundo tem olhado para o sindicalismo latino-americano nos últimos anos, da responsabilidade de seu novo cargo e defende a necessidade de a classe trabalhadora colocar o socialismo como uma real perspectiva para a humanidade. Mais do que isso: a única capaz de superar a crise do capitalismo.

Confira abaixo: 

Portal CTB: Qual será sua principal tarefa nessa nova função de secretário-geral?
Francisco Souza: É importante dizer que a iremos dar continuidade à construção de um processo que se iniciou há cinco anos, em 2008, com muito foco na organização regional e continental. Nos primeiros cinco talvez tenhamos vislumbrado uma experiência muito maior e percebemos a dificuldade de trabalhar com uma organização que precisa ser mundial, mas vimos que sem a devida organização regional se torna muito mais difícil. Então talvez a primeira tarefa seja organizar os sindicatos e as entidades mais próximas em cada continente, para a partir daí dar vazão a discussões em contexto mundial. 

Portal CTB: Como enfrentar certa burocracia que perdura no sindicalismo?
Francisco Souza: É preciso entender que o próprio Brasil, por ser um país continental, tem uma constituição do movimento sindical que pode dar uma contribuição para esse processo, com a construção de uma alternativa em relação ao que temos atualmente no resto do mundo. Em alguns países você tem um conjunto de organizações que se agrupam em uma instituição maior, algo bem diferente do modelo sindical brasileiro. Em outras nações a situação é mais próxima, pois podemos encontrar duas ou três centrais sindicais, mas com ramos de atividades similares dentro da mesma central. No Brasil temos mais a questão ideológica. Isso exigirá de nós um esforço para encontrar o melhor caminho. Para fazermos essa desburocratização precisaremos ter esse estudo. Por mais que procuremos alternativas para fugir dessa burocracia, não temos como atuar à parte da linha de objetivos da Federação Sindical Mundial. 

Da mesma forma que cumprimos os objetivos da UIS e da FSM, temos também a dificuldade de desburocratizar a entidade e aproximá-la dos sindicatos, para alcançarmos os nossos objetivos.

Portal CTB: Dentro da nova geopolítica mundial, vemos que a América Latina nos últimos tempos obteve grande destaque no mundo sindical. Na UIS Metal ocorre o mesmo? Temos o que mostrar ao restante do mundo?
Francisco Souza: Temos interessantes perspectivas aqui. Está sendo mostrado agora que o avanço projetado pelo movimento sindical europeu há algumas décadas não se concretizou – a receita não foi essa. Se assim fosse, nesta crise o movimento sindical não passaria pelo atual momento de dificuldade. Nós aqui, por outro lado, também precisamos aguardar mais um tempo para vermos o que irá ocorrer, temos que ver o que irá resultar dos avanços que temos obtido.

O problema das privatizações, por exemplo, merece ser observado, assim como o controle das grandes multinacionais aqui na região. Em alguns países, certos grupos, em determinados ramos de atividade, podem mascarar uma realidade que não fica tão clara nesta fase atual. Se tem sido interessante para os trabalhadores o avanço e o desenvolvimento aqui no Brasil, o mesmo tem ocorrido com as grandes empresas. Isso mostra que elas estão investindo aqui, mas muitas vezes deixando de investir nos trabalhadores de outros países. E isso não é fácil de discutir, pois estamos tratando aqui de um movimento amplo de trabalhadores. 

A aposta no movimento sindical em nossa região é o resultado disso. Apesar dos avanços, sabemos que vivemos no sistema capitalista e a qualquer momento esse sistema pode trazer alterações. E será numa situação como essa é que teremos de demonstrar nossa força. Talvez a visão do sindicalismo europeu seja essa. É possível que eles estejam enxergando além de nós e por isso é importante estudarmos o que eles estão passando.

Portal CTB: É simbólica, portanto, a escolha de um brasileiro para ocupar a Secretaria Geral da UIS Metal? Dialoga com sua resposta anterior?
Francisco Souza: Eu diria que a constituição de governos progressistas da América Latina, nos últimos anos, permitiu que formássemos um importante bloco político para o mundo – e talvez essa seja a chave buscada pela UIS Metal quando fez essa indicação. Ao pensarmos no Brasil, temos que pensar no que houve desde a eleição de Lula e a referência de seu governo, que repercutiu em todo o mundo. Isso acaba tendo um grande peso, sem dúvida. 

Temos que levar em consideração também a dificuldade do movimento sindical na Europa por conta da crise, desde 2008, mesmo ano do nosso Congresso anterior. Hoje sabemos que eles têm muito mais dificuldade para dar essa resposta. Então se há outra referência, que nesses cinco anos foi capaz de ir ao encontro do que está acontecendo na Europa, ao menos fica sinalizado como uma alternativa para a construção da UIS Metal.

Portal CTB: Quais dificuldades na relação entre capital e trabalho atingem mais diretamente os trabalhadores da UIS Metal?
Francisco Souza: Sem dúvida eu pontuaria a questão da terceirização como o principal problema. Não vejo dentro do sistema capitalista um mal maior para a classe trabalhadora do que esse fenômeno. A partir do momento em que o Estado abriu espaço para o neoliberalismo, deixando de lado o bem-estar social, muitas empresas do nosso ramo perderam uma série de conquistas vindas desde os primórdios do capitalismo.

Ao sair dessa disputa, o Estado permitiu que o capital dominasse esse cenário e impusesse aquilo que tanto prejudica a classe trabalhadora, como a precarização, o banco de horas, a desvalorização do trabalho, o desleixo com a saúde. Se pegarmos o conjunto de maldades sofridas por nós, a maior parte disso está dentro de um contexto que para eles é simples: a terceirização. Sem o Estado e a regulamentação necessária, tornou-se algo fácil para o capitalismo administrar. 

No Brasil, infelizmente isso esbarra numa falta de compreensão desse processo. Não temos que ser contra apenas pelo discurso ideológico. Temos que pensar nas conquistas sociais importantes que foram perdidas em todo o mundo. 

Portal CTB: Nesse contexto mais amplo, qual o papel da FSM para o sindicalismo classista no mundo e sua influência para o fortalecimento da UIS Metal?
Francisco Souza: Durante muito tempo a FSM teve que ficar recolhida, procurando refletir sobre o processo de queda do Leste Europeu, possibilitando que esse espaço fosse ocupado por outra entidade, que hoje vemos não ser capaz de dar a resposta necessária para a classe trabalhadora. 

Hoje a responsabilidade é grande: temos que sair desse recuo e tentar mostrar mais uma vez para o mundo a possibilidade de colocar o socialismo como uma alternativa. É uma responsabilidade muito grande. Se é para a gente observar os avanços do sindicalismo classista, cabe a nós mostrarmos que nosso movimento sindical já passou pelas reflexões necessárias e deve ser uma alternativa verdadeira para dar conta da desigualdade, da injustiça de todos os problemas do sistema capitalista. Precisamos de um socialismo que traga para a classe trabalhadora esse sentido que, de fato, outro mundo é possível.

Fernando Damasceno – Portal CTB

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