Jimmy Carter, 94 anos, ex-presidente dos Estados Unidos, dá aula toda semana na Escola Dominical da Igreja Batista de sua cidade natal. Esta semana ele falou sobre um telefonema que recebeu de Trump, preocupado com o crescimento geopolítico da China. O comentário de Carter é esclarecedor. Abaixo reproduzimos um trecho:
“Você tem medo que a China nos supere, e eu concordo com você. Mas você sabe por que a China nos superará? Eu normalizei relações diplomáticas com Pequim em 1979 [NR: quando foi presidente dos EUA]. Desde essa data você sabe quantas vezes a China entrou em guerra com alguém? Nem uma vez, enquanto nós estamos constantemente em guerra.
“Os Estados Unidos é a nação mais guerreira da história do mundo, pois quer impor aos Estados que respondam ao nosso governo e aos valores americanos em todo o Ocidente, e controlar as empresas que dispõem de recursos energéticos em outros países.
“A China, por seu lado, está investindo seus recursos em projetos de infraestrutura, ferrovias de alta velocidade intercontinentais e transoceânicos, tecnologia 6G, inteligência robótica, universidades, hospitais, portos e edifícios em vez de usá-los em despesas militares.
“Quantos quilômetros de ferrovias de alta velocidade temos em nosso país? Nós desperdiçamos U$ 300 bilhões em despesas militares para submeter países que procuravam sair da nossa hegemonia. A China não desperdiçou nem um centavo em guerra, e é por isso que nos ultrapassa em quase todas as áreas.
E se tivéssemos tomado U$ 300 bilhões para instalar infraestruturas, robôs e saúde pública nos EUA teríamos trens bala transoceânicos de alta velocidade. Teríamos pontes que não colapsem, sistema de saúde grátis para os americanos não infectarem mais milhares de americanos do que qualquer país do mundo pelo COVID-19. Teríamos caminhos que se mantenham adequadamente. Nosso sistema educativo seria tão bom quanto o da Coreia do Sul ou Xangai.”
O ex-presidente tem toda razão, embora a extravagância bélica não seja a única causa do declínio dos EUA, que tem sua raiz mais profunda no processo histórico de desindustrialização. Este, por seu turno, está associado ao déficit comercial crônico e à migração de capitais produtivos.
Donald Trump, porém, apesar da retórica agressiva não tem tanta culpa nisto como seus predecessores, uma vez que não iniciou uma única guerra, deu um fim às investidas na Síria e negociou a saída do Afeganistão, realizada depois de forma desastrada pelo Biden.
Sobre o celebrado democrata Obama pesa a responsabilidade histórica pelas atrocidades cometidas pelo imperialismo na Líbia. Já o republicano Bush deflagrou as dispendiosas guerras no Afeganistão e no Iraque.
O também democrata Joe Biden, que sucedeu Donald Trump, move agora uma guerra por procuração na Ucrânia e intensifica as provocações contra a China em Taiwan e no chamado Mar da China. Tudo isto, e o espírito “guerreiro” das classes dominantes estadunidenses, que teve ingresso lá atrás no genocídio indígena, tende a acelerar o funeral da carcomida ordem imperialista formalizada nos acordos de Breton Woods em 1944, que inauguraram a diplomacia do dólar com base na incontestável supremacia industrial dos EUA. Esta já não existe mais, virou poeira da história, e é a transição para uma nova ordem mundial que está em curso no planeta, um parto da história humana que já se anuncia doloroso e violento.
Umberto Martins