CTB participa de missão internacional de solidariedade ao povo palestino

A 2ª Missão Internacional de Solidariedade ao Povo Palestino chegou na última quinta-feira (18) a Ramallah, na Cisjordânia (Palestina), para reuniões com autoridades nacionais, líderes de organizações sociais e movimentos de resistência palestinos contra a ocupação militar do governo sionista de Israel.

 
Várias entidades da esquerda brasileira (entre elas a CTB) fazem parte da delegação, das quais algumas participaram da 1ª Missão, realizada em 2012 e recebida por representantes nacionais, inclusive pelo presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP) e da Organização para a Libertação da Palestina (OLP), Mahmoud Abbas.

A organização da missão é do Comitê pelo Estado da Palestina (CEP), que tem o objetivo de “prestar solidariedade ao povo palestino, levar representantes da sociedade civil brasileira para conhecer a realidade da ocupação sionista das terras palestinas, e trazer informações sobre a Palestina, repercutindo nos meios de comunicação do Brasil”, de acordo com o projeto.

Ao total, são 70 entidades nacionais, estaduais e regionais integrando o CEP, que foi lançado oficialmente em agosto de 2011, em apoio ao esforço palestino para o reconhecimento do seu Estado pela ONU (apesar de um histórico muito mais longo de solidariedade). O impulso foi dado por membros do PCdoB, do PT, da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), do MST, da CUT, da Federação das Entidades Árabes de SP, do Brasil e das Américas (Fearab), da Federação das Entidades Árabe-Palestinas do Brasil (Fepal), da Força Sindical, do Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Lutas pela Paz (Cebrapaz), entre outras, com reuniões frequentes.

Atravessando fronteiras em solidariedade internacional

Ao atravessar a fronteira Rei Hussein (chamada de Allenby pelos israelenses) entre a Jordânia e a Palestina (embora controlada por Israel), a delegação enfrentou dificuldades diariamente noticiadas sobre a burocracia securitária e militarista israelense e experimentou uma pequena amostra do efeito que a ocupação tem na vida dos palestinos que chegam ao território.

Por outro lado, bem recebida por representantes palestinos já na Cisjordânia, a missão dirigiu-se à sede do governo do distrito de Jericó, onde foi recebida pelo governador de Jericó e Al-Aghwar, Majed Al-Fityani, acompanhado de representantes de outros setores do governo local, integrado à Autoridade Nacional Palestina (ANP).

O sociólogo e arabista Lejeune Mirhan apresentou a delegação e a missão de solidariedade, expondo as motivações das entidades que apoiam a causa palestina, enquanto membros das organizações e partidos presentes detalharam a missão de cada um deles em relação à causa palestina. Entres estes, membros da CTB, do Cebrapaz, do PCdoB, da APP-Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública no Paraná, da Força Sindical, entre outros.

A ligação direta e a identificação geral com esta causa por movimentos de resistência e luta, de emancipação e de esquerda marxista, por exemplo, já foi ressaltada extensiva e oportunamente, inclusive por autores palestinos como Edward Said, que traçam um panorama sobre a “questão palestina”.

Neste sentido, as centrais sindicais que representam milhões de trabalhadores brasileiros, assim como partidos históricos da esquerda e movimentos de luta pela paz e pela solidariedade internacional, formam a base desta identificação com a causa palestina para a missão.

Em resposta, o governador Al-Fityani também deu declarações sobre a situação palestina e sobre o papel do Brasil, que vem recebendo cada vez maior reconhecimento por sua política internacional.

“O que nós queremos é ter uma vida normal, mas não conseguimos. O que desejamos é poder ter paz, não só para nós, mas também para os nossos vizinhos; quando a paz for decretada, poderemos viver, cantar e dançar, porque nós palestinos também gostamos da vida”, disse o governador, em menção ao carnaval brasileiro.

Al-Fityani falou da importância de visitar a Palestina para experimentar e reconhecer os efeitos da ocupação israelense, pois “só mesmo estando aqui para saber”.

Entre os eventos recentes que rememoram a ocupação sionista estão a comemoração local dos 65 anos da “proclamação” do Estado de Israel, ou da Nakba, a Catástrofe palestina (quando em 1948 o Estado israelense foi estabelecido sobre as casas palestinas destruídas e às custas da expulsão de milhares de palestinos de suas terras) e o Dia do Prisioneiro, nesta quarta-feira (17), que relembrou o número de 5.000 palestinos, prisioneiros políticos em cárceres israelenses, com greve de fome e protestos diante da prisão militar de Ofer, na Cisjordânia.

Protestos contra o muro

O grupo participou nesta sexta-feira (19) do tradicional protesto de Bil’in, na Cisjordânia, contra o muro segregador e contra a ocupação israelense dos territórios palestinos. Os membros das entidades integrantes do CEP, que organiza a missão, também se encontraram com autoridades e famílias de prisioneiros políticos palestinos.

Na manhã desta sexta, a missão dirigiu-se à vila de Bil’in, a menor vila palestina, próxima de Ramallah, para participar nos protestos realizados todas as sextas-feiras contra o “muro da vergonha”, que corta a Cisjordânia com cerca 800 quilômetros de concreto, separando famílias das suas terras de cultivo e dificultando a vida dos palestinos em trânsito, alegadamente por “motivos de segurança”.
No protesto, a missão acompanhou o grupo palestino rumo ao muro, onde já estavam posicionados soldados israelenses e judeus ortodoxos, habitantes da colônia vizinha, protegida pelo exército israelense, dentro do território palestino. Os protestantes manifestaram-se contra o governo sionista de ocupação e contra a usurpação dos recursos palestinos por Israel.

Em resposta, os soldados israelenses atiraram bombas de gás lacrimogêneo, bombas de som e gás de pimenta, pelos quais os membros da missão, que levavam bandeiras palestinas, brasileiras e das entidades que integram também foram afetados, enquanto parte do protesto.

Segundo organizadores, esta é a programação habitual das sextas-feiras, quanto jovens que lançam pedras e exigem dignidade, em revolta contra o governo militar israelense que os controla, são covardemente correspondidos pelos soldados com esses recursos. 

palestina ctb2

Também compareceram ativistas internacionais de várias nacionalidades e israelenses que apoiam a causa palestina, opondo-se à ocupação e a opressão do seu governo sobre o território e o povo palestino.

Para preparar-se para o protesto, a missão encontrou-se com Abdallah Abu Rahma, coordenador do Comitê de Luta Popular, que organiza os protestos desde 2005. A construção do muro israelense na Cisjordânia completa já 10 anos, e os comitês de resistência popular, que se organizam em diversas vilas, embora com uma luta unificada, continuam protestando e pensando em novas estratégias.

Uma delas, como exposto por Abu Rahma, é a escolha pelo método de luta e resistência não-violenta, que vem angariando adeptos em diversos movimentos de resistência popular pelo mundo. Abu Rahma esteve na liderança da Primeira Intifada Palestina, iniciada em 1987, e conta que a resistência não-violenta vem ganhando cada vez mais força desde então.

Apesar disso, ele já foi preso pelas autoridades israelenses quatro vezes, e chegou a ficar encarcerado por um ano e meio, através de frágeis testemunhos sobre o seu envolvimento nos protestos. Muitos desses testemunhos foram conseguidos pelas forças israelenses com crianças que detiveram por até dois dias, e como indicado e até exigido pelos interrogadores, o papel de Abu Rahma na organização dos protestos e no fornecimento de materiais foi relatado.

O muro segregador unifica os comitês populares

Abu Rahma explica a tática usada pelo comitê como uma forma abrangente e bem estruturada de luta, oferecendo cursos de direito internacional e de resistência não-violenta, por exemplo, e trabalhando com advogados pela causa contra o muro e contra a ocupação israelense.

Na busca por uma postura mais ativa, por exemplo, o coordenador exibiu vídeos à missão sobre a construção instantânea de uma vila, Bab Al-Shams (Porta do Sol), em um território na Cisjordânia que já estava nos planos da ocupação sionista. Em três horas, como um vídeo que ficou internacionalmente conhecido mostra, um grande grupo de palestinos montou uma vila de tendas, com o apoio de ativistas internacionais. Segundo Abu Rahma, a atenção midiática trabalhou significativamente a favor da iniciativa.

Um exemplo da importância da atenção midiática, segundo ele, foi dado quando estava em cativeiro e recebeu a notícia de que, devido à atenção que havia ganhado internacionalmente, atores famosos e a própria secretária de Relações Exteriores da União Europeia (UE), Christine Ashton, declarou-o defensor dos direitos humanos. Com isso, representantes da organização acabaram por comparecer ao julgamento de Abu Rahma, o que resultou numa pressão positiva sobre o caso.

Ainda assim, em 2007 o muro foi considerado uma construção ilegal por uma decisão judicial israelense, mas passaram-se quatro anos até que a sua construção fosse desviada dos planos originais, para evitar a área. Através desta decisão, contudo, ao invés de perderem 58% das suas terras com a construção do muro que os separaria delas, conforme os planos originais, os residentes da região de Bil’in ainda perderam 25% delas para a ocupação israelense.

“O que fazemos agora é trabalhar a terra, depois de destruída pelo exército israelense, que arrancou árvores e destruiu tudo”, disse Abu Rahma, que lembra que os protestos têm sido bem-sucedidos mesmo que “ os soldados tenham feito muito para tentar parar os comitês, ‘experimentando’ armas, usando os nossos corpos”. Ele menciona o uso de novas balas de borracha, novos tipos de gás de efeito moral, bombas de som, de produtos químicos altamente nocivos, entre outros.

Além disso, como muitos outros palestinos, Abu Rahma denuncia o hábito de os soldados israelenses invadirem as casas palestinas durante a noite, “assustando as nossas famílias, destruindo coisas, assustando as crianças, que acordam com soldados usando máscaras pretas dentro de casa”.

Nos protestos, de acordo com o coordenador, 1.500 pessoas ficaram feridas e duas pessoas foram mortas: em 2007, Bassem Abu Rahma, que foi atingido no peito com uma bomba de gás lacrimogêneo e morreu instantaneamente, e dois anos depois, a sua irmã Jawaher também morreu nos protestos, por intoxicação.

Entre os protestos de ação não-violenta, para além da construção de vilas como Bab Al-Shams, os treinamentos em direito internacional e resistência e a parceria internacional, Abdallah Abu Rahma também menciona a obstrução de estradas segregadoras, construídas pelos e para os israelenses que ocupam os territórios palestinos, mas que não podem ser usadas pelos próprios palestinos.

Famílias em resistência

Em Nabih Saleh, vila que fica na “Área C” da Cisjordânia, segundo os Acordos de Oslo da década de 1990 (em que os israelenses têm o controle militar efetivo), Basim Tamimi, também detido pela ocupação israelense, recebeu a missão brasileira para contar sobre os protestos realizados na região.

Neijar Tamimi, Basim Tamimi e Manal Tamimi exibem a camiseta da 2ª Missão de Solidariedade Internacional ao Povo Palestino, em encontro em Nabih Saleh, Cisjordânia

Sua casa está na lista israelense para a demolição, o que pode acontecer a qualquer momento, apesar de lá viverem várias pessoas de sua família. Mesmo assim, Tamimi fala da importância de “deslocalizar” a luta, “que é contra a ocupação; lutamos juntos entre as vilas”.
 
O ativista também exibiu vídeos de protestos realizados recentemente, de incursões ilegais e ataques das forças policiais israelenses contra casas palestinas. A casa de Tamimi chegou a ser alvo de ofensivas criminosas quando soldados lançaram bombas de gás para dentro, mesmo quando lá estavam crianças e mulheres.

Manal Tamimi, esposa de Basim, também comenta um vídeo em que teve de remover as crianças, junto com outras mães na casa, através das janelas, para fugir dos efeitos do gás. Além disso, conta do episódio da prisão de um garoto de 10 anos que foi interrogado e torturado, detido por 72 horas, para dar informações sobre os líderes ativistas da região.

Manal mostrou procedimentos da polícia israelense nas prisões violentas que fazem diante das famílias, traumatizando crianças e humilhando indivíduos e comunidades. Além disso, também falou dos constantes avanços tecnológicos usados pelo exército israelense contra os protestantes, mencionando o uso de produtos químicos e lança-granadas altamente eficientes, que disparam bombas de gás lacrimogêneo muitas vezes aleatoriamente.

“Uma vez tentamos contar quantas bombas de gás tinham sido lançadas, e chegamos a cerca de 1.500 em apenas uma sexta-feira”, disse Manal.

No mesmo dia, a missão também esteve na vila Kober, de onde é um dos prisioneiros palestinos mais influentes da atualidade, Marwan Barghouti, e um membro da Federação Árabe-Palestina do Brasil, integrante do CEP, Ualid Rabah, cuja família recebeu a missão com um jantar e uma reunião sobre os prisioneiros políticos palestinos.

A esposa de Barghouti, Fadwa Barghouti, também compareceu para falar da campanha que organiza pela libertação de Marwan, que está detido há já 11 anos. A Campanha pela Libertação de Marwan Barghouti já é internacional, mas recebeu e declaração de compromisso das entidades brasileiras integrantes da missão, que debaterá sobre a criação de uma campanha de peso no Brasil.

Também presentes estavam os prisioneiros retratados no Guiness, o livro dos recordes: as pessoas que passaram mais tempo detidas e que ainda estão vivas, pois cumpriram 34 anos de prisão. Ambos contaram as suas histórias e o impacto que o encarceramento tem não só na vida dos presos, mas também de suas famílias e comunidades. Membros da missão intervieram para declarar solidariedade e apoio à luta palestina pela liberdade, e para explicar a forte ligação das suas entidades com a causa palestina.

O compromisso de continuidade das missões de solidariedade e com as campanhas palestinas pela liberdade dos presos políticos, contra a ocupação israelense e pela criação de um Estado palestino independente e soberano foram uma das marcas dos encontros que o grupo teve nesta sexta-feira.

Por Moara Crivelente, de Ramallah para o Portal CTB

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