A ‘gig economy’, proposta moderna de trabalho, mais escraviza do que liberta, alerta pesquisador

“No Vale do Silício, é possível ver engenheiros de 30 anos de idade com corpos de 50”, observa Jeffrey Pfeffer, considerando hoje um dos grandes pensadores da gestão moderna

Durante passagem por São Paulo, onde realizou uma palestra no Insper, promovida por ex-alunos de Stanford, Jeffrey Pfeffer, considerando hoje um dos grandes pensadores da gestão moderna e atual professor de comportamento organizacional na Graduate School of Business da Universidade de Stanford, alertou para os riscos da chamada “gig economy”.

O termo se refere a uma proposta que tem se popularizado no mundo todo e consiste na contratação de pessoas em regimes temporários, como autônomas e freelancers. O professor é autor e coautor de 15 livros sobre administração, o mais recente chama-se “Morrendo Por um Salário – Como as práticas modernas de gerenciamento prejudicam a saúde dos trabalhadores e o desempenho da empresa – e o que podemos fazer a respeito” (editora Alta Books), onde trata do novo universo do trabalho.

Em entrevista ao jornal Valor, Pfeffer acentuou que a “gig economy”, ao contrário da imagem que tentam apresentar, como uma proposta que deixa o trabalhador livre das amarras da gestão tradicional, na realidade está deixando os profissionais cada vez mais inseguros e frágeis do ponto de vista financeiro, físico e emocional.

“No Vale do Silício, é possível ver engenheiros de 30 anos de idade com corpos de 50”, observou. “Lá, as pessoas acreditam que tudo o que importa é terminar o trabalho e que devem tomar qualquer substância, legal ou ilegal, como esteroides, cocaína e o que for preciso para fazer isso”, disse.

“Se você decide fumar amanhã, o cigarro não afetará sua saúde imediatamente, mas com o tempo você ficará doente. Da mesma forma, se você decidir trabalhar horas irracionais ou tomar drogas, com o tempo, terá que pagar um pedágio enorme”, completou.

Segundo o pesquisador, que nos anos 2000 chamou atenção por criticar os cursos de MBA, o modelo de relação entre trabalhador e empresa, que coloca sobre o primeiro toda a responsabilidade e segurança de sua própria vida, está conduzindo ao aumento expressivo de estresse entre os profissionais.

Ele pontua que, quem trabalha na gig economy, tem mais preocupações com a instabilidade financeira, perda de emprego, falta de seguro saúde e, ainda, nem sabe direito quais serão seus horários em uma semana ou outra, e isso resulta em prejuízos na vida social e familiar.

“Como você pode se planejar quando não sabe qual será a sua agenda de um minuto para outro?”, pergunta. O pesquisador pondera que a estabilidade e segurança não podem ser substituídas por mesas de pingue pongue ou sushi. E, inda, que as organizações deveriam saber que trabalhadores saudáveis produzem mais e faltam menos, logo, deveriam deixá-los dormir o suficiente ao invés de permitir um tempo livre para uma soneca.

Segundo Pfeffer, o que os profissionais querem hoje e terem senso de segurança, oportunidade de equilibrar as várias obrigações na vida e um chefe que os respeitem.

“Em certo momento, éramos companhias que se sentiam responsáveis por todas as partes, pelos clientes, pela comunidade e pelos funcionários. Agora, elas pensam que não são responsáveis por ninguém, talvez pelos acionistas. Mas, certamente nada além dos acionistas”, lembrou Pfeffer defendendo que as empresas deveriam voltar a tratar os funcionários à moda antiga.

“A tendência atual do aumento da depressão e de doenças crônicas não são um problema só do primeiro mundo. Está em todo lugar. Estamos realmente no caminho do que considero insustentável”, observou mostrando que a insegurança no trabalho se estende em várias partes do mundo.

“Precisamos poder decidir em que tipo de futuro vamos viver”, concluiu o pesquisador se referindo à chegada da inteligência artificial, situação que deixará milhões de trabalhadores sem emprego, agravando o quadro de estresse global.

Fonte: GGN

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