“Se esse não é um golpe de Estado, é, no mínimo, uma farsa”, diz editorial do Le Monde

O editorial do Le Monde, principal jornal francês (aliás, uma publicação considerada conservadora), denunciou o processo golpista em curso no pais na edição da sexta-feira (26).

O jornal classifica o episódio todo de uma “tragicomédia política” e afirma que os detratores da presidenta tentam dar uma roupagem de legitimidade ao impeachment e vêm se esforçando em construir “o crime perfeito”.

O editorial ironiza, que, “embora ninguém tenha vindo tirar a presidenta do cargo usando baionetas”, os fatos evidenciam que este processo não ficará para a posteridade como um “episódio glorioso da jovem democracia brasileira”.

O texto aponta ainda que a presidenta do Brasil está sendo julgada por um Senado que tem um terço de seus representantes, e cita o site Congresso em Foco, como alvos de processos criminais. E acrescenta: “Ela será substituída por seu vice-presidente, Michel Temer, embora este seja considerado inelegível durante oito anos por ter ultrapassado o limite permitido de doações de campanha”.

Registra também o episódio envolvendo o ex-ministro interino Romero Jucá, que foi destituído após o vazamento de gravações: “O braço direito de Temer, Romero Jucá, ex-ministro do Planejamento do governo interino, foi desmascarado em maio por uma escuta telefônica feita em março na qual ele defendia explicitamente uma ‘mudança de governo’ para barrar a operação ‘Lava Jato’”.

Leia abaixo o artigo na íntegra:

Dilma Rousseff, a primeira presidente mulher do Brasil, está vivendo seus últimos dias no comando do Estado. Praticamente não há mais dúvidas sobre o resultado do julgamento de sua destituição, iniciado na quinta-feira (25) no Senado. A menos que aconteça uma reviravolta, a sucessora do adorado presidente Lula (2003-2010), que foi afastada do cargo em maio, será tirada definitivamente do poder no dia 30 ou 31 de agosto.

Dilma Rousseff cometeu erros políticos, econômicos e estratégicos. Mas sua expulsão, motivada por peripécias contábeis às quais ela recorreu bem como muitos outros presidentes, não ficará para a posteridade como um episódio glorioso da jovem democracia brasileira.

Para descrever o processo em andamento, seus partidários dizem que esse foi um “crime perfeito”. O impeachment, previsto pela Constituição brasileira, tem toda a roupagem da legitimidade. De fato, ninguém veio tirar Dilma Rousseff, reeleita em 2014, usando baionetas. A própria ex-guerrilheira usou de todos os recursos legais para se defender, em vão.

Impopular e desajeitada, Dilma Rousseff acredita estar sendo vítima de um “golpe de Estado” fomentado por seus adversários, pela mídia, e em especial pela rede Globo de televisão, que atende a uma elite econômica preocupada em preservar seus interesses supostamente ameaçados pela sede de igualitarismo de seu partido, o Partido dos Trabalhadores (PT).

Essa guerra de poder aconteceu tendo como pano de fundo uma revolta social. Após os “anos felizes” de prosperidade econômica, de avanços sociais e de recuo da pobreza durante os dois mandatos de Lula, em 2013 veio o tempo das reivindicações da população. O acesso ao consumo, a organização da Copa do Mundo e das Olimpíadas não conseguiam mais satisfazer o “povo”, que queria mais do que “pão e circo”. Ele queria escolas, hospitais e uma polícia confiável.

O escândalo de corrupção em grande escala ligado ao grupo petroleiro Petrobras foi a gota d’água para um país maltratado por uma crise econômica sem precedentes. Profundamente angustiados, parte dos brasileiros fez do juiz Sérgio Moro, encarregado da operação “Lava Jato”, seu herói, e da presidente sua inimiga número um.

A ironia quis que a corrupção fizesse milhões de brasileiros saírem para as ruas nos últimos meses, mas que não fosse ela a causa da queda de Dilma Rousseff. Pior: os próprios arquitetos de sua derrocada não são santos.

O homem que deu início ao processo de impeachment, Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara dos Deputados, é acusado de corrupção e de lavagem de dinheiro. A presidente do Brasil está sendo julgada por um Senado que tem um terço de seus representantes, segundo o site Congresso em Foco, como alvos de processos criminais. Ela será substituída por seu vice-presidente, Michel Temer, embora este seja considerado inelegível durante oito anos por ter ultrapassado o limite permitido de doações de campanha.

O braço direito de Temer, Romero Jucá, ex-ministro do Planejamento do governo interino, foi desmascarado em maio por uma escuta telefônica feita em março na qual ele defendia explicitamente uma “mudança de governo” para barrar a operação “Lava Jato”.

Se esse não é um golpe de Estado, é no mínimo uma farsa. E as verdadeiras vítimas dessa tragicomédia política infelizmente são os brasileiros.

Portal CTB com fotomontagem do Brasil 247

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