Certa vez em Cuba apresentaram Chico Buarque dizendo que ele não é da Itália, é de Hollanda, mas é do Brasil. Erraram por pouco porque o cantor, compositor, dramaturgo, poeta e escritor além de ser um dos principais representantes da cultura brasileira, Chico Buarque são também do mundo.
Neste ano, Chico completa 50 anos de carreira e em 19 de junho 70 de idade. Desde a sua estreia nos palcos em 1964 no show Primeira Audição, no Colégio Rio Branco em São Paulo, o tímido rapaz ganhou os corações e mentes dos brasileiros com suas canções que misturam questões sociais e individuais de modo tão peculiar que tudo se transforma numa coisa só.
Acrescentou conhecimento à arte. Recentemente, o ex-estudante de arquitetura disse que fica feliz quando escreve ou compõe algo com a beleza dos traços de Oscar Niemeyer e música sofisticada como o maestro soberano Tom Jobim.
Muito atacado pela crítica conservadora por ter posições políticas muito bem definidas e por trilhar caminho próprio sem se ater a modismos, Chico Nos anos 1960 ele escreveu um artigo no jornal Última Hora intitulado “Nem toda loucura é genial, nem toda lucidez é velha” para mostrar a sua vertente dentro da MPB. Aliás, o termo MPB já se transformou em gênero musical justamente por causa de Chico, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Milton Nascimento, entre outros. Por falta de como definir o trabalho de artistas desse naipe passaram a chamá-los de compositores de MPB.
Apoiado em grandes nomes como Noel Rosa, Vinicius de Moraes, Dorival Caymmi, Ismael Silva, João Gilberto, Tom Jobim, Pixinguinha, entre muitos outros, Chico foi um dos principais compositores a politizar a MPB com temas de resistência à ditadura e de denúncia das mazelas do capitalismo dependente. Muito perseguido pela censura, teve um momento em que somente o aparecimento de seu nome já censurava a obra. Foi quando ele criou o pseudônimo Julinho da Adelaide e Leonel Paiva gravou música de outros e os apelidos no meio deles, em 1974 no disco Sinal Fechado.
O próprio contou em uma entrevista que numa “conversa” com um censor para mudar o verso Vence na Vida Quem Diz Sim da música de mesmo nome, ele sugeriu que ficasse Vence na Vida Quem Diz Não e o resultado foi a censura completa da obra. Outro episódio relevante aconteceu em show com Gilberto Gil que começaram a tocar a proibida Cálice e a dizer palavras soltas da letra. Os censores desligaram aos microfones e aí a censura estava denunciada.
Em 50 anos de carreira, tornou-se referência obrigatória em qualquer trabalho sobre a música popular brasileira e da literatura dos últimos anos. Talvez o nosso artista e escritor mais completo. Não se rendeu às facilidades do mercado e nem cedeu à ditadura – decidiu resistir.
Campeão em diversos festivais dos anos 1960 virou sucesso com A Banda ao vencer o Festival da Record, em 1966, empatado com Disparada, de Geraldo Vandré e Theo de Barros. Chico tem a obra permeada pela moça da favela que desce o morro de blusa amarela, batendo a panela e vem para o asfalto proclamar seus direitos, como na canção Pelas Tabelas, onde o social e o individual caminham lado a lado para construir uma nova sociedade, com justiça social, liberdade, onde todos sejam iguais em direitos e a vida seja respeitada. Canta o pivete que “vende chiclete e se chama Mané” e a expressão da mãe do guri, que “trouxe uma penca de documentos para finalmente” ela se identificar, como cantou a mãe que lutava para ter o corpo de seu filho assassinado nos porões da ditadura na canção Angélica dedicada a Zuzu Angel.
Sempre enfrentou os algozes da democracia e ficou muitos anos se aparecer na tela da Globo porque a “vênus platinada” havia proibido que sua imagem fosse veiculada na emissora. Levava inúmeros artistas pra participar de festivais em Cuba quando viajar para a ilha caribenha não era permitido. Em entrevista recente afirmou que não está “para agradar poderosos” e essa temática está presente em toda sua obra.
No seu último livro Leite Derramado (2009) faz uma crítica ácida à elite nacional que menospreza o país, a classe trabalhadora e todo o povo brasileiro. Seu apoio ao PT, ao Lula e à Dilma levou a direita a odiá-lo. Em defesa do governo Lula afirmou: “o Brasil é um país que é ouvido em toda parte porque fala de igual pra igual com todos. Não fala fino com Washington, nem fala grosso com a Bolívia e o Paraguai.”
Publicou em 1974, a novela Fazenda Modelo, uma metáfora do Brasil. Escreveu o infantil Chapeuzinho Amarelo (1979), a menina que tinha tanto medo, mas que foi superando até que a palavra lobo virou bolo, o bolo da vida e da superação. A dedicação à literatura ficou marcante a partir de Estorvo, publicado em 1991, aí vieram Benjamim (1995), Budapeste (2003) e Leite Derramado. Uma vasta obra que o coloca na história da cultura brasileira e seus trabalhos serão apreciados para todo o sempre.
A CTB presta sua homenagem aos 50 aos de carreira e antecipa as felicitações de aniversário ao Chico Buarque das ruas, do carnaval, do samba, da valsa, do choro, do forró da vida, do povo brasileiro e porque não do mundo inteiro.
Marcos Aurélio Ruy – Portal CTB
Cálice (Chico Buarque e Gilberto Gil)
O Meu Guri (Chico Buarque)
Futuros Amantes (Chico Buarque)