Centenário de Humberto Teixeira: A voz do Nordeste em todos os cantos

Com muita razão, muitos estudiosos e fãs comparam o instrumentista, poeta e compositor cearense Humberto Teixeira ao pernambucano Luiz Gonzaga porque ambos inovaram a MPB com o canto nordestino, divulgando-o pelo país. A dupla emplacou inúmeros sucessos. Com pouco reconhecimento pela mídia, Humberto Teixeira completaria 100 anos na segunda-feira (5). Teixeira nasceu em Iguatu no Ceará e morreu no Rio de Janeiro , em 3 de outubro de 1979, aos 64 anos.

Esquecido pela mídia comercial, Humberto Teixeira enriqueceu o acervo da MPB com centenas de canções, muitas delas eternizadas nas vozes de Luiz Gonzaga, talvez o seu principal parceiro, Dolores Duran, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Carmélia Alves, Emilinha Borba, Cyro Monteiro, Ivon Curi, Gal Costa, Alceu Valença, Zé Ramalho, Ney Matogrosso, Dominguinhos, Lulu Santos, Fagner, Elis Regina, Tom Zé, Chitãozinho e Xororó, Badi Assad, Maria Bethânia, Hermeto Pascoal, Quinteto Violado, Xangai e Raul Seixas, entre outros. Teixeira e Gonzagão criaram o Baião, gênero musical que nasceu no Nordeste e Gonzagão (chamado de o “rei do Baião”) popularizou por todos os cantos do país e o “doutor do Baião” (Teixeira) levou para o exterior quando se elegeu deputado federal e criou uma lei que leva seu nome para que fossem financiadas caravanas de músicos brasileiros em diversas partes.

humberto teixeiraO novo ritmo renovou o cenário da música popular brasileira ao levar as dores e os amores dos nordestinos para todas as partes. Entre as décadas de 1940 a 1970, os clássicos compostos pela dupla levou a voz dos nordestinos em todos os cantos do país e até hoje ninguém fica indiferente ao ouvir “Asa Branca”, composta por eles em 1947 e que viria a se tornar um verdadeiro hino do povo do Nordeste, tão preterido por anos e anos. É fato que a realidade da região tem mudado nos últimos 12 anos, mas a canção não perdeu a atualidade porque canta os anseios do homem do campo, castigado pela seca e pelo latifúndio.

De 1945 a 1950, além de “Asa Branca”, a dupla eternizou sucessos, presentes até hoje nos corações e mentes dos brasileiros como “Assum Preto”, “Juazeiro”, “Respeita Januário” e “No Meu Pé de Serra”, “Mangaratiba”, “Paraíba”, “Qui nem jiló”, “Xanduzinha”, “Baião”, “Lorota boa”, “Estrada de Canindé”, entre outras. Sempre apresentados com o instrumental do trio sanfona, zabumba e triângulo. Naqueles anos não se poderia imaginar que a música regional nordestina pudesse animar festas e bailes do Oiapoque ao Chuí, como ocorre neste século 21.

Em uma entrevista em 1974, os artistas apresentaram a visão que têm do encontro de ambos. “Quando conheci Humberto Teixeira e começamos a conversar, foi rápido, em menos de uma hora Humberto resolveu meu problema. E parece que ele estava gostando também da minha cooperação”, disse Gonzagão. “Naquele mesmo dia, começamos a ‘sanfonizar’ os primeiros acordes e a primeira linha mestra não só de Baião, como de ‘Asa Branca’, essa música que, hoje, é um hino. Uma música que diz muito, a muitos brasileiros”, concordou Teixeira. Ainda nessa entrevista à Rede Globo, Teixeira afirmou que “depois de resolvermos que o ritmo que nós queríamos lidar como saída para a implantação da música nordestina no Sul do País era o Baião, tratamos de urbanizar, de dar características nacionais a esse ritmo eminentemente telúrico e a esse tipo de música tão ligada às coisas do Norte”.

Aos 13 anos, o músico cearense já tocava flauta na orquestra que musicava filmes mudos no Cine Majestic, em Fortaleza. Aos 15 anos mudou-se para o Rio de Janeiro, fugindo de mais uma seca que assolava o Nordeste. “Sintonia Café” (parceria com o maestro Lyrio Panicalli) foi sua primeira canção gravada, em 1944, pelo cantor Déo. Antes de encontrar Luiz Gonzaga compôs clássicos como “Deus me perdoe”, “Vamos balancear”, “Samba na roça” e “Só uma louca não vê”, em parceria com Lauro Maia, como mostra o dicionário de música Cravo Albin. Em 2009, foi lançado o documentário sobre a vida do artista “O homem que engarrafava nuvens”, de Lírio Ferreira. A obra conta com depoimentos de Alceu Valença, Belchior, Caetano Veloso, Bebel Gilberto, Chico Buarque, Gilberto Gil, Lenine e Zeca Pagodinho.

A força da canção brasileira se impõe mais uma vez com o talento de Humberto Teixeira, vencendo preconceitos e a apatia de uma mídia voltada apenas para o lado comercial das coisas, descartando tudo o que não se enquadra nesse esquema comercial. Mesmo assim, o compositor cearense tem seu acervo garantido na história da MPB. Não há quem fique indiferente quando suas obras são executadas e o corpo começa a sacolejar incontinente ao ritmo da inteligência e da candura, mesmo em tempos difíceis.

Por Marcos Aurélio Ruy – Portal CTB

Vídeos de canções:

 Qui nem jiló (Humberto Teixeira e Luiz Gonzaga)

 Assum preto (Humberto Teixeira e Luiz Gonzaga)

 

 Asa Branca (Humberto Teixeira e Luiz Gonzaga)

 Trailer do documentário O homem que engarrafava nuvens (Lírio Ferreira)

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