Aldir Blanc e o povo brasileiro eram um só

Por Railídia Carvalho

Este 4 de maio de 2020 deixou a todos nós muito sentidos com a partida do nosso poeta Aldir Blanc. Filho do Brasil e irmão de todos, nos deixa de luto porque era nosso parente. Tudo índio, tudo parente. Luto sem gurufim, mais um. Neste finalzinho da vida, como muitos brasileiros, o nosso poeta passou pela via-sacra que marca a desigualdade do país que ele tanto mostrou em suas letras. Buscou um leito, buscou dignidade. Quero contar que ele se foi pelas mãos daqueles trabalhadores e trabalhadoras que tem sido heróis destes tempos de pandemia. Os covardes estão no planalto.

Tinha 73 anos e era carioca, o Aldir. Médico, mandingueiro, escritor das histórias do Brasil, contou as sandices, imaginou novos tempos, delirou, eternizou as visões da vida nas canções brasileiras. Não há um brasileiro que não cantarole uma letra escrita por ele. Era de virgem, como eu, e esperava setembro chegar, como eu também espero. Aí a peste vai ter passado e vamos fazer um gurufin pra ti, Aldir. E pra o Tantinho da Mangueira também.

Recomendo ouvir Aldir para suportar a dor sem Aldir. Não só ouvi como cantei Aldir a vida inteira. Rara cantoria em que eu esteja sem a presença do nosso louco e doce intérprete do Brasil: Entre tantos, estão “Vaso ruim não quebra” (Com João Bosco), “Rancho da Goiabada” (com João Bosco)“A Louca” (com Maurício Tapajós), que gravei no Cd Cangalha, “Baião de Lacan” (com Guinga), “Centro do Coração” (Com Moacyr Luz) e “Saudades da Guanabara” (com Moacyr Luz). 

Em 2016, a roda de samba dos Inimigos do Batente homenageou os 70 anos do Aldir cantando só musicas dele por mais de uma hora. Foi no Ó do Borogodó, claro. Onde mais haveria de ser? O Ó, como Aldir, também está na UTI. Se tivesse tempo Aldir faria uma crônica sobre o Ó, “onde tantos iguais se reúnem contando mentiras pra poder suportar”. 

Obrigada, Aldir, queria te levar flores, cantar no gurufim e rezar no teu velório. Vou aqui tomar uma e chorar “como Marias e Clarices no solo do Brasil”. É noite no Brasil, Aldir, mas vai clarear. 

foto: reprodução do Instagram Espaço Aldir Blanc

“Quero continuar a delirar, eu quero eternizar minhas visões”