Um ano depois, SP volta a nível hídrico “próximo do colapso” com obras atrasadas e sigilo oficial

A terça-feira (13) desta semana foi um dia atípico para quem acompanha a crise hídrica de São Paulo de perto. Enquanto o governador Geraldo Alckmin era homenageado pela Câmara dos Deputados (em Brasília) com um prêmio por sua atitude autoritária na gestão da seca paulista, manifestantes de diversos movimentos ligados ao meio ambiente se reuniram na Praça do Patriarca (em SP) para fazer a entrega de uma versão alternativa da mesma premiação: o troféu “Falta d’Água”, dedicado a quem mais prestou desserviços ao setor. Alckmin não fez questão de ir na primeira celebração, que transcorreu com muitas vaias, nem na segunda, que apresentou poesias, músicas e diálogos tratando da questão da seca.

“Esse ato [de protesto] simboliza o descontentamento da população com a situação que estamos vivenciando, principalmente na periferia”, explicou o Renê Vicente, presidente do Sintaema (Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de São Paulo). “Nós estamos próximos de um colapso do sistema de abastecimento e as obras emergenciais não conseguem combater essa crise. Agora, o governo começa a tomar medidas que vão contaminar os sistemas que ainda estão limpos”, disse. O nível total dos reservatórios metropolitanos é, hoje, de apenas 22,4% da capacidade total, já considerados os volumes mortos tanto do sistema Alto Tietê quanto do Cantareira. Sem eles, a reserva cai para 7,1%.

O especialista explicou que os investimentos na rede de tratamento e distribuição de água nos últimos 20 anos foram muito abaixo dos requisitados pelo corpo técnico da Sabesp, e que a atitude de operar nos volumes mortos dos reservatórios acarretou poluição elevada da água distribuída na metrópole. Isso, por sua vez, forçou a capacidade das Estações de Tratamento de Água disponíveis, e agora o governo decidiu transferir parte da água poluída da represa Billings para outros sistemas. Considerada uma “caixa-preta da poluição ambiental” por especialistas, a Billings poderia sujar os lençóis freáticos das sistemas interligados. “Essa contaminação já começou a acontecer no Cantareira. Agora vai para o Alto Tietê e se não vir a chuva, como eles estão apostando, amanhã ou depois teremos algo semelhante no sistema Rio Grande. É preocupante”, explicou Renê.

Mentira e sigilo para calar “terroristas”

Ainda na terça-feira, veio a público que o governador Geraldo Alckmin havia dado mais um passo em sua estratégia premiada de gestão hídrica. Impôs, por um período de 15 anos, segredo sobre dados de abastecimento da metrópole paulistana. O argumento foi de que a divulgação dos locais de abastecimento ininterrupto poderia ser usada no “planejamento de ações terroristas”. A decisão já havia sido tomada em maio, durante a fase mais agravada da crise hídrica, e foi exposta por uma reportagem do iG, causando uma reação agravada das organizações sociais paulistanas. O Palácio dos Bandeirantes voltou atrás no mesmo dia.

“O governo mente sobre a falta de água e tenta se esconder atrás do trabalhador. Os funcionários da Sabesp já estão sendo hostilizados pela população, mas ninguém fecha uma rede de água sem uma ordem de serviço. Se você pegar um bairro em que falta água todo dia e olhar a documentação, vai ver que é o contrário do que o governo está divulgando, o governo esta escamoteando as pessoas”, denunciou Renê Vicente. “Isso acontece constantemente, todos os dias da semana. O que ele deveria fazer é tratar isso de forma transparente com a população, mesmo porque nós não temos outra saída agora que não seja de uma economia brutal de água”, respondeu, questionado sobre o sigilo.

Para o presidente da CTB-SP, Onofre Gonçalves, é preciso buscar formas mais contundentes de responsabilizar o governo pelo pouco caso que tem demonstrado diante do problema hídrico. “Ao movimento sindical, cabe tomar várias atitudes numa situação dessas. Além do movimento de rua, nós devemos fazer as denúncias, procurar a Justiça e conseguir algum mandado, porque o governador não toma providência nenhuma. Precisamos encontrar formas de proteger a população que esta sofrendo, principalmente o povo da periferia, que chega a ficar uma semana sem água. A única saída para essa gente é captar água da chuva – isso merece uma denúncia mais séria, junto ao Ministério Público. Nós estamos estudando as medidas que podemos tomar”, explicou.

Por Renato Bazan – Portal CTB

Compartilhar: