Elites brasileiras apostam na recolonização do Brasil, diz Umberto Martins; leia entrevista

Publicado 24/10/2017
Na última quinta-feira, o livro “O golpe do capital contra o trabalho” (Editora Anita Garibaldi), escrito pelo jornalista e assessor da CTB, Umberto Martins, foi lançado no Espaço Cultural Latino Americano (Ecla), na cidade de São Paulo. Na obra, Martins retrata a guinada conservadora vivida pelo Brasil sob a perspectiva da política institucional, quando Michel Temer consolidou seu golpe de Estado contra Dilma Rousseff.
Em virtude das articulações de Michel Temer para salvar sua agenda contra o crescente preço de sua permanência no poder, o Portal CTB conversou com o jornalista sobre a importância da leitura da obra neste momento.
Abaixo, você pode também assistir ao discurso do jornalista durante a cerimônia de autógrafos.
Portal CTB: Boa tarde, Umberto. Como o seu livro interpreta esse momento da política institucional?
Umberto Martins: O posicionamento do livro está de certo modo sintetizado no título: “O Golpe do capital contra o trabalho”… O golpe de Estado de 2016, travestido de impeachment, tinha basica e fundamentamente este objetivo.
Entre suas formas sinuosas, esta verdade transparece nitidamente no seu conteúdo concreto, ou seja, nas propostas, medidas e iniciativas efetivas adotadas pelo grupo político que, sem o respaldo do voto popular, se assenhoreou do Palácio do Planalto.
A quem recai a maior ameaça colocada pelas ações do governo Temer?
A classe trabalhadora brasileira é certamente a principal vítima das medidas que vêm sendo adotadas a toque de caixa.
Vai pagar o ônus da flexibilização da legislação trabalhista, da expansão da terceirização para a chamada atividade-fim das empresas, do congelamento dos gastos públicos, das privatizações, da abertura do pré-sal e de outras medidas que também ofendem mortalmente os interesses nacionais. Ao lado dos trabalhadores e trabalhadoras urbanas perdem também os camponeses, as classes médias e pequenos produtores do campo e da cidade.
Um programa de radical restauração neoliberal está em curso, e quando analisamos os acontecimentos políticos não apenas pelas aventuras e desventuras dos seus personagens políticos, mas procurando enxergar a participação das forças sociais que protagonizam os dramas reais da sociedade, não é difícil enxergar que se trata de um golpe.
E quem tem mais a ganhar com elas?
O principal beneficiário da política de restauração neoliberal que vem sendo imposta pelos golpistas é o capital, é incontestável. Ele é encarnado nos grandes capitalistas, com destaque para o capital estrangeiro e sua Guarda Imperial, os EUA, que não foram meros coadjuvantes no drama, conforme argumenta o autor no capítulo “O universal e o singular”.
A espionagem da presidenta Dilma e de empresas como a Petrobras e a Odebrecht pela Agência Nacional de Segurança dos EUA (a NSA), descobertas e vazadas pelo Wikileaks em 2013, não foi uma molecagem destituída de sentido. A relação perigosa com a Lava Jato é tema de um outro capítulo.
Em que momento o senhor enxerga o início desse período caótico?
O projeto golpista foi esboçado no documento aprovado e divulgado pelo PMDB em dezembro de 2015 intitulado “Ponte para o futuro”, no momento em que Michel Temer presidia a legenda, cujas propostas foram reforçadas pelos “15 pontos” do PSDB, escritos durante a presidência de Aécio Neves. Aí já se acenava com as reformas trabalhista e previdenciária, uma nova política de austeridade fiscal, a abertura do pré-sal ao capital estrangeiro, uma nova política externa alinhada com os propósitos de Washington e uma agressiva política de privatizações.
O programa prometido pelos protagonistas políticos do golpe, francamente hostil aos interesses do povo trabalhador e da nação, unificou as forças do capital (os grandes capitalistas, os latifundiários, as multinacionais e os EUA) numa frente ampla em apoio à conspiração contra o governo Dilma, que envolveu os poderes Legislativo e Judiciário, Polícia Federal, Ministério Público Federal e Tribunal de Contas da União.
Como se sabe, a presidenta, que não cometeu crime de responsabilidade nem sequer é suspeita de enriquecimento ilícito, foi afastada e o governo federal passou a ser presidido pelo “chefe da quadrilha mais perigosa do Brasil”, nas palavras do empresário Joesley Batista.
Quais as lições que podemos retirar do livro?
O impeachment de Dilma abriu caminho para um golpe profundo contra o povo brasileiro, que em sua maioria é classe trabalhadora, e a nação. Em nosso caso povo e nação são conceitos entrelaçados. O povo é a nação, a nação é o povo. Embriagadas de neoliberalismo, as elites econômicas interligaram o seu destino ao do imperialismo e apoiaram maciçamente o golpe antinacional, antipopular e antidemocrático.
A classe trabalhadora é quem hoje tem interesses na efetiva defesa da pátria e de um novo projeto nacional de desenvolvimento com soberania, democracia e bem-estar social. Os interesses da burguesia já não estão em harmonia com os interesses maiores da nação. É este um dos ensinamentos que as forças progressistas devem extrair do golpe.
Portal CTB