Motoboys fazem buzinaço em SP por melhor condição de trabalho durante pandemia

Trabalhadores reclamam de falta de segurança e de baixo valor pago por aplicativos

Um grupo de motoboys realizou, na manhã desta segunda-feira (20), um protesto pelas ruas da capital paulista.

A concentração dos manifestantes ocorreu na praça Leonor Kaupa, no Bosque da Saúde (zona sul), e terminou em Osasco (Grande SP), a cidade-sede do aplicativo iFood.

Policiais do 1º Batalhão de Trânsito acompanharam o buzinaço do grupo, que aconteceu de forma pacífica.

As pessoas que estavam nas ruas filmavam e aplaudiam a passagem do ato. Já os manifestantes ficavam, a todo o momento, convidando os colegas que faziam as entregas a participarem da passeata.

Os trabalhadores reclamaram das condições precárias de trabalho às quais estão submetidos nesta quarentena contra o novo coronavírus.

“Se as empresas dão a rota, e a gente não aceita, ficamos bloqueados por semanas, diz o entregador Robson Luís da Silva, 38, que faz entregas pelos aplicativos Rappi, iFood e Uber Eats.

Silva diz que foi bloqueado por um aplicativo por não conseguir concluir uma entrega numa comunidade da periferia de São Paulo. “Eu não consegui achar o endereço, fiquei rodando 40 minutos e, no dia seguinte, fui acusado de fraudar a corrida”, conta.

“Eu me sinto um escravo. Sofri um acidente esses dias, meu dedo ficou com fratura exposta. Reportei o problema ao aplicativo, mas a empresa só queria saber se eu conseguiria concluir a entrega”, completa Silva.

Para o motoboy David Lima, outro problema é o valor que a categoria está recebendo para fazer as entregas num momento em que “os entregadores estão mantendo a cidade minimamente em pé”.

“Quem está botando a cara na rua e entregando comida, medicamento e todo tipo de produto somos nós. Mas a população precisa saber que ganhamos, em média, R$ 10 para percorrer 15 km”, diz Lima.

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Na avenida Paulista, o protesto ganhou volume com a adesão de outro grupo de entregadores que aguardava a chegada dos manifestantes no endereço mais famoso da cidade. Ao todo, o ato atraiu não mais do que 200 manifestantes.

Ao final da carreata, os manifestantes se aglomeraram com um carro de som em frente à sede do iFood, em Osasco. A maioria dos entregadores —sem máscaras e luvas—, discursaram contra as empresas de entrega por aplicativo.

Gérson Silva, vice-presidente do Sindimoto-SP (entidade que representa a categoria), disse ao microfone que não adianta nada “os entregadores serem chamados de heróis na imprensa se, quando chegam em casa, entregam migalhas para as suas famílias.”

“Tem motoboy coronado, e vocês acham que essa empresa aqui está dando alguma assistência”, afirmou o sindicalista.

Os trabalhadores também disseram que não querem, agora, discutir a legalidade do vínculo trabalhista com as empresas de aplicativo, uma questão que já está sob análise da Justiça. “Queremos máscara, luvas e álcool em gel para trabalhar com dignidade”, disse um motoboy na manifestação.

Os motoboys ficaram poucos minutos em frente ao iFood porque perceberam que não havia nenhum representante da empresa no local.

OUTRO LADO

O Rappi informou, por meio de nota, que reconhece o direito à livre manifestação pacífica e busca “diálogo com seus entregadores parceiros”.

A empresa disse ainda que colocou em prática a entrega sem contato, adquiriu álcool em gel e máscaras, que estão sendo entregues aos motoboys; disponibilizou um botão específico na sua plataforma para que o entregador comunique eventuais sintomas da Covid-19 e criou um fundo para apoiar financeiramente por 15 dias quem for diagnosticado com a doença.

O aplicativo informou ainda que pratica os mesmos critérios no valor do frete —que varia de acordo com o clima, dia da semana, horário, zona de entrega, distância percorrida e complexidade do pedido—, e só bloqueia seus entregadores parceiros em caso de descumprimento dos termos da plataforma.

Uber Eats e iFood também foram procurados pela reportagem, mas ainda não se posicionaram.

ACORDO

Reportagem da Folha, publicada em março, mostrou que as condições de trabalho dos entregadores pioraram durante a pandemia pelo risco sanitário e pelo tempo que eles gastam em supermercados para abastecer a população que está em casa.

Em meio à pandemia, Ministério Público do Trabalho emitiu nota técnica com uma série de medidas a serem tomadas pelas empresas de transporte de mercadorias e de passageiros por plataformas digitais.

O documento exige que essas companhias forneçam, gratuitamente, para o entregador álcool em gel (70% ou mais), lavatórios com sabão e papel toalha, espaço e serviço de higienização para os veículos e água potável para o consumo desses profissionais.

No início de abril, os aplicativos informaram que iriam disponibilizar kits com material de proteção e material informativo, além de um fundo financeiro para entregadores que contraírem a doença.

Fonte: FSP, foto de Zanone Fraissat