O 10º Congresso da Federação Nacional dos Farmacêuticos (Fenafar), realizado no último sábado (6) em Salvador (BA), deu posse à nova diretoria eleita para dirigir a entidade no triênio 2022/2025 e aprovou por unanimidade a Carta de Salvador, documento que sintetiza as posições da categoria com relação à conjuntura nacional e apresenta as diretrizes da nova gestão nos marcos do Projeto Social de Desenvolvimento e Soberania Nacional.
Para o farmacêutico Fábio Basílio, novo presidente da Federação, “o momento é de resistência e luta para derrotar o projeto fascista de desmonte do SUS e da ciência e tecnologia”. Quanto às tarefas da entidade para o próximo período, Fábio defende “a necessidade de um projeto de país para a retomada da soberania nacional e para que o Brasil volte a caminhar a passos largos em direção à liberdade e à democracia”.
Ronald Ferreira dos Santos, que deixa a presidência da Fenafar após dois mandatos consecutivos, foi homenageado na plenária final do Congresso ao receber uma placa contendo versos do poeta Bertold Brecht.
Leia a íntegra da Carta de Salvador:
Os participantes do 10º Congresso da Federação Nacional dos Farmacêuticos – Fenafar – Dra. Maria de Lourdes Gomes de Castro Soares, ocorrido nos dias 03 a 06 de agosto de 2022, na cidade de Salvador, vêm a público lançar a Carta de Salvador. Esta carta expressa as discussões ocorridas durante o congresso cujo temário foi “O Trabalho Farmacêutico e a Ciência em Favor da Vida no Brasil do Século XXI”.
Como trabalhadores reafirmamos nosso compromisso de luta pela paz. Somos contrários a todas as guerras e conflitos, sejam de ordem econômica, social, política e religiosa. Acreditamos na democracia, respeitamos a autodeterminação dos povos, e que todos e todas têm o direito a viver em paz e resolver os seus conflitos internos com diálogo, sem violência e sem interferência.
Desde o golpe de 2016, vivenciamos ataques ao Estado Democrático de Direito, tão duramente conquistado pela sociedade brasileira em 1988.
No Brasil, muito além da crise sanitária social, agravada pela pandemia da Covid-19, vivemos em um país com profundas desigualdades sociais, carente em serviços públicos essenciais, como saúde, educação, habitação e segurança pública e principalmente devido a condução fascista do governo federal frente à pandemia e o caráter lesa-pátria das classes dominantes, que nos trouxeram à barbárie.
Chegamos à trágica marca de 680 mil vidas perdidas pela COVID-19; praticamente todos os estados com as UTIs e leitos no limite da capacidade; o desabastecimento de insumos, medicamentos e demais tecnologias, que tende a agravar ainda mais o cenário. As trabalhadoras e os trabalhadores da saúde vivenciam exaustão emocional e física, muitos estão submetidos a contratos de trabalho precários e ainda enfrentam em diversos casos escassez e a baixa qualidade de equipamentos de proteção individual (EPIs).
O projeto de nação soberano, passa pela participação e escuta popular nos centros de decisão, com a implementação de políticas públicas, que alcancem toda a população, sem distinção de gênero, raça, religião ou nível social.
O Sistema Único de Saúde – SUS traz em si o conceito ampliado de saúde, entendendo-a como direito e não uma mercadoria. Que agrega o cuidado integral e que pressupõe um projeto de nação democrático. Modelo de desenvolvimento social e político, e pode ser o propulsor de uma política econômica soberana, se consolidada pelo Complexo Econômico Industrial da Saúde (CEIS).
Consideramos fundamentais: a produção nacional de medicamentos preferencialmente com os laboratórios oficiais; e investimentos públicos como as parcerias para o desenvolvimento produtivo que atendam a integralidade e demandas do SUS, contribuindo para o fortalecimento da estratégia de saúde da família com a participação da profissão farmacêutica nos serviços públicos e ou privados conforme expresso na Lei 13021/2014, que define a Farmácia como estabelecimento de saúde.
As Políticas Públicas de Ciência e Tecnologia e Inovação em Saúde, Assistência Farmacêutica, Medicamentos e Vigilância em Saúde, são norteadoras do trabalho farmacêutico. Representam, também, uma oportunidade concreta de valorizar o trabalho farmacêutico, envolvido em todos os fluxos e etapas de execução das políticas, e em todos os ciclos de vida das pessoas. Mas é preciso ainda ampliar esse escopo e agregar uma política pública que norteie os serviços de diagnósticos e análises, sendo estes de interesse público e demandados pelo SUS.
Defendemos a revogação da Emenda Constitucional nº 95 (EC-95), com a garantia do aumento do orçamento público, possibilitando o acesso a serviços públicos essenciais de qualidade.
A profissão farmacêutica, mais uma vez, tem lado: o lado do povo brasileiro. E neste processo os sindicatos são os instrumentos fundamentais para responder às mudanças e para enfrentar os desrespeitos e as flexibilizações dos direitos trabalhistas. Para isso, são necessárias inovações, estratégias de luta, de mobilização e de financiamento das organizações sindicais.
Dizemos um basta, às jornadas extenuantes, às situações de precarização do trabalho, e aos salários que não correspondem à nossa formação profissional. Nossas forças estão concentradas na defesa de uma remuneração justa e adequada às funções profissionais, para o qual o nosso trabalho nos exige. Conquistar uma justa reparação salarial bem como uma jornada de trabalho de 30 horas, adequada às nossas responsabilidades frente à saúde da população, seja no setor público e ou privado, serão nossas bandeiras de luta.
Chegamos em 2022, ano eleitoral, de oportunidade, de mudanças, e um brilho ilumina a esperança, e temos fé em um futuro melhor, onde a reconstrução do país é urgente. Orientados por Paulo Freire, nossas divergências nos unem e estamos lado a lado para enfrentarmos os nossos antagônicos, em defesa da ordem democrática, com respeito ao pacto constitucional de 1988. Neste sentido, defender programas de geração de empregos e distribuição de renda para vencer a pobreza com justiça social, sustentabilidade, liberdade e democracia significa valorizar o trabalho das farmacêuticas e dos farmacêuticos.
Dizemos NÃO aos retrocessos autoritários. Renunciamos ao ódio, à intolerância e ao conservadorismo moral. Apoiamos as instituições democráticas, temos confiança no sistema de votação eletrônica, e respeitamos os resultados das eleições.
No contexto que se aproxima, eleger Lula é um passo imprescindível para a defesa do SUS, da saúde pública e do trabalho farmacêutico. Também precisamos eleger mulheres e homens para o Congresso Nacional e para a Assembleias Legislativas, que sejam comprometidos com a democracia, com a soberania nacional, com a ciência e tecnologia em saúde e a assistência farmacêutica como direito humano, com a segurança e soberania alimentar, com a vida, com o trabalho decente e com um país para todos e todas. Que combatam o racismo, a intolerância religiosa, o patriarcado, a LGBTQIAP+fobia, o capacitismo, a aporofobia, a violência aos povos indígenas e todas as formas de violência e aniquilação do/a outro/a; e à desinformação (fake news).
Dirigida aos farmacêuticos e farmacêuticas e ao povo brasileiro, esta CARTA manifesta suas diretrizes de gestão para o triênio 2022/2025, que estão em consonância com o que esperamos para o Projeto Social de Desenvolvimento e Soberania Nacional:
- Derrotar o projeto fascista e o grupo político que ocupa atualmente os espaços de poder da República, através do envolvimento das entidades farmacêuticas em um novo projeto nacional de desenvolvimento socialmente referenciado com a eleição de candidatos que melhor defendam esse projeto;
- Defender a ciência e a autonomia universitária garantindo o incentivo às pesquisas e extensão nas universidades, custeando equipamentos e estudos para que a pesquisa volte a crescer, com o fortalecimento das políticas de assistência estudantil com o objetivo de ampliação do número de profissionais farmacêuticos no SUS, além de melhores condições de trabalho;
- Incentivar e fortalecer as estruturas de assistência farmacêutica nos estados e municípios; possibilitando o acesso às informações confiáveis sobre o trabalho farmacêutico, a ciência, as tecnologias e inovações em saúde;
- Lutar por legislações que ampliem e garantam a presença do profissional farmacêutico em locais estratégicos para o desenvolvimento da ciência, tecnologia, inovação em saúde e assistência farmacêutica;
- Lutar contra a mercantilização do medicamento, estes devem ser considerados bens públicos, de interesse social, utilizados com racionalidade, e apropriados às condições clínicas dos pacientes;
- Qualificar o processo de negociação, com mesas permanentes junto ao setor patronal, identificando e valorizando empresas que melhor cumpram as legislações, acordos e convenções, em conjunto com sindicatos de outras categorias;
- Lutar pela realização de concursos públicos para inserção de farmacêuticos com vínculos estatutários no SUS, valorizando as residências multiprofissionais, com pisos, jornadas e carreira que valorizem os trabalhadores;
- Desenvolver novas estratégias de participação, com o objetivo de mobilizar e sensibilizar a categoria em torno das pautas sindicais;
- Criar, implementar e monitorar a aplicação de mecanismos para diminuição e extinção dos diversos tipos de assédio e discriminação (gênero, orientação sexual, estética, deficiência, local de origem, político e ideológico, dentre outros) como forma de promover a igualdade de oportunidade e tratamento dos empregos no âmbito de atuação da categoria e sociedade civil;
- Fortalecer a frente parlamentar mista em defesa da assistência farmacêutica a fim de garantir a aplicação e regulamentação da lei 13021/14 e de todas as demais pautas afins;
- Defender a saúde como propulsora da reconstrução econômica nacional;
- Fomentar o debate sobre a revisão da lei de patentes;
- Reafirmar a Política Nacional de Assistência Farmacêutica (PNAF) como política norteadora de políticas setoriais;
- Garantir o fortalecimento do sistema de informação da assistência farmacêutica e vigilância em saúde;
- Lutar contra a mercantilização da educação farmacêutica, incluindo o emprego da modalidade EaD, de forma a prevenir a deterioração da qualidade da formação;
- Lutar pela revisão dos critérios para abertura e do sistema de avaliação dos cursos de graduação em Farmácia, envolvendo o controle social do SUS, entidades estudantis e as entidades profissionais, de forma a assegurar que a formação reflita as necessidades sociais e fortaleça a identidade profissional;
- Lutar pela inserção do controle social, entidades estudantis e profissionais, em especial os sindicatos, na discussão da formação em nível graduação e de pós-graduação (Stricto sensu e residências);
- Atuar no aprimoramento das políticas públicas para melhorar as condições da formação dos farmacêuticos (ex. fomento de bolsas; saúde mental discente; carga horária discente);
- Lutar pela efetivação da formação cultural dos farmacêuticos (ex: a atenção à saúde das pessoas trans ou outras políticas afirmativas) e da formação política dos farmacêuticos (ex: para compreensão do papel e importância dos sindicatos), com o propósito de fortalecer a luta da categoria e valorizar o trabalho e os trabalhadores farmacêuticos;
- Articular o desenvolvimento das políticas públicas de educação e da saúde, no sentido de valorização da profissão farmacêutica, promovendo a integração entre a formação e as políticas públicas de saúde, incluindo o desenvolvimento da assistência farmacêutica, dos serviços farmacêuticos, complexo industrial da saúde, a pesquisa e desenvolvimento, as análises clínicas, para desenvolvimento da política farmacêutica em nosso país, e fortalecimento do SUS e da soberania nacional.
Fonte: Com informações da Fenafar