O depoimento do ex-ministro Ernesto Araújo à CPI da covid nesta terça-feira (18) vai ao encontro das suspeitas de que o governo Bolsonaro abandonou o general Pazuello ferido na estrada e pretende transformá-lo no bode expiatório do genocídio em curso no país, onde o número de mortos por covid-19 aproxima-se agora de 440 mil. O general depõe nesta quarta-feira.
O senador Renan Calheiros vê nisto uma razão a mais para Pazuello colaborar com a CPI e enfatizou que a comissão não quer incriminar o general. “Queremos que Pazuello possa nos informar os fatos e ajudar na elucidação da verdade. governo está transferindo a responsabilidade para ele”. Ernesto Araújo sistematicamente enfatizou que todas as iniciativas do Ministério das Relações Exteriores foram tomadas por orientação do Ministério da Saúde, isentando Bolsonaro.
Reproduzimos abaixo texto da jornalista Ana Carolina Diniz sobre o desempenho do lunático Araújo na CPI.
Na boca do leão
Por várias vezes no depoimento na CPI, o ex-chanceler Ernesto Araújo disse que as orientações para o Itamaraty vieram do Ministério da Saúde. Para Carlos Melo, cientista político e professor do Inper, Araújo entregou na “boca do leão” o ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, que depõe na quarta-feira na comissão.
– Em várias questões, ele disse: ‘não fomos nós. Foi o Ministério da Saúde, só acompanhamos. Só fiz o que foi pedido pelo Ministério da Saúde’. Ou seja, coloca uma série de questões para Pazuello responder amanhã. Todos os depoentes estão jogando tudo nas costas do ex-ministro, que está achando que vai virar um bode expiatório”.
Um exemplo foi a adesão do consórcio Covax Facility, da Organização Mundial da Saúde (OMS). Ao ser questionado por que o Brasil optou pelo quantitativo mínimo, suficiente para atender 10% da população, em vez de 50%, ele respondeu que a decisão foi do Ministério da Saúde.
Mesmo fora do governo Araújo e o ex-secretário de comunicação, Fabio Wajngarten, continuam aliados do presidente e seguidores do bolsonarismo, considera o professor. Para ele, há uma lealdade grande a Bolsonaro e pouco compromisso para mostrar a dinâmica real dos fatos.
-Parece que são burocratas e não agentes políticos que conversavam e aconselhavam ao presidente e tomavam decisões. Imagina que o ministro das Relações Exteriores não tem nada a ver com a posição do presidente da arena internacional? Isto só pode ser brincadeira.
E mesmo com uma posição muito defensiva e tentando sair pela tangente nas perguntas dos senadores, ambos deixaram escapar algo contra o governo. No caso de Wajngarten foi a revelação do envio da carta da Pfizer em agosto.
-Já Araújo confirmou que o presidente deu a missão para que fosse comprar insumos para a cloroquina no começo da pandemia.
Mentiras sobre a China
O ministro irritou os senadores ao mentir sobre a China afirmando que nunca ofendeu a grande nação asiática, o que está em desacordo com fatos e textos que produziu. Ele caiu em desgraça e foi defenestrado do Itamaraty inclusive porque não tinha mais qualquer interlocução com a embaixada e o governo chinês, a quem caluniou com devaneios anticomunistas.
Atacar gratuitamente a China é um TOC do Clã Bolsonaro. Há poucos dias Jair Bolsonaro insinuou que a covid-19 foi produzida em laboratório na China com o objetivo de promover uma guerra biológica para dominar o mundo.
A teoria é obscura e absurda. Não tem correspondência com a realidade e é desautorizada pela ciência. A Organização Mundial de Saúde (OMS), afirmou em março, após estudos, que o vírus provavelmente teve origem a partir do contágio direto de animal para humano.
Mas nesta terça, durante a CPI do Genocídio, o 01 Flavio Bolsonaro renovou as provocações contra a milenar nação asiática, declarando que a origem do vírus é desconhecida, sendo objeto de investigação internacional e é possível que tenha sido produzido em laboratório com objetivos geopolíticos.
Turismo em Israel enquanto Manaus sufocava
Araújo foi duramente criticado pela custoso turismo em Israel a pretexto de conhecer um milagroso spray anti-covid. O passeio, em que o ex-chanceler foi acompanhado por outros apaniguados do presidente que nada têm a ver com ciência ou saúde, sangrou os cofres públicos em meio milhão de reais e ocorreu em janeiro no momento em que estava em curso a tragédia de Manaus, com vítimas da covid morrendo por falta de ar.
“Por que foi tão fácil mandar um avião para atravessar o Atlântico para ir a Israel e não se mobilizou aeronaves para transportar oxigênio para Manaus?”, indagou o senador Randolfe Rodrigues, vice-presidente da CPI, que considerou o passeio a Israel um “desperdício de recursos públicos”
A Venezuela doou cilindros de oxigênio para o Amazonas que foram transportados por caminhões. Orientado por um ódio ideológico doentio, o governo de Jair Bolsonaro não teve a dignidade sequer de agradecer o gesto solidário do governo Maduro, empenhando-se, pelo contrário, em divulgar Fake News atribuindo a doação feita pelo governo chavista a uma empresa privada e formulando calúnias contra o país vizinho.
Araújo admite que não se mobilizou para agilizar o transporte do oxigênio doado pela Venezuela. Também disse que não recebeu nenhuma ordem do presidente Bolsonaro para providenciar a aquisição de vacinas, o que de resto evidencia o negacionismo do governo e o desprezo pela saúde e a vida do povo brasileiro.
Na opinião de senadores da oposição, apesar das mentiras e tergiversações, o depoimento do ex-ministro contribui para confirmar a existência de um Ministério Paralelo no comando da crise sanitária, que foi apelidado de Ministério da Doença, através do qual se tentou modificar bula de remédio por decreto enquanto o Ministério da Saúde nem vacina podia comprar.
Quando Pazuello anunciou um protocolo de compra de 40 milhões de doses da CoronaVac ofertadas pelo Instituto Butatan o presidente Jair Bolsonaro fez questão de desautorizá-lo, fazendo com que se comportasse como lacaio. “É simples assim: um manda e outro obedece“, consolou-se à época o ex-ministro, após ser humilhado publicamente pelo chefe.
A quarta (19) promete ser mais um dia quente, crítico e nervoso no Senado,