Por Luis Nassif –
O caso CEITEC (Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada) é a comprovação eloquente das razões para o subdesenvolvimento brasileiro.
É a primeira fábrica de microprocessadores do país. Trata-se de um setor essencial para a competitividade do país. Hoje em dia, quase todos os setores da indústria dependem dessa tecnologia para avançar, entrar na indústria 4.0 ou 5.0. Discute-se a introdução da 5G na telefonia local. Chips servem para desenvolver eletrodomésticos inteligentes, montar sistemas d identificação de veículos, fazer inventário de produtos, criar documentos eletrônicos, fazer rastreio animal.PUBLICIDADE
O CEITEC foi montado em 2008 sob a direção de renomados cientistas. A primeira parte do trabalho consiste na montagem de equipes, geração de conhecimento, desenvolvimento de patentes, até entrar em voo cruzeiro.
Cumpriu a primeira fase do projeto competentemente. Montou um quadro de mestres e doutores. Muitos deles foram contratados pela Apple, Intel e outros fabricantes mundiais de chips.
Quando estava em vôo cruzeiro
Como estatal, o mercado do CEITEC era o setor público. E seu primeiro grande contrato era a confecção de chips de passaportes. A partir de 2016, deveria fornecer os chips para a Casa da Moeda. Já se estava em pleno governo Temer e a Casa da Moeda recusou. A alegação do presidente é que ela adquiria a carteira com o chip já montado razão para fechar contrato com um fornecedor estrangeiro.
O presidente, em questão, é um dos muitos quadros que ascendeu a cargos relevantes com a ajuda do Supremo Tribunal Federal, da mídia e da Lava Jato, visando mudar definitivamente a política no Brasil. Tratava-se de Alexandre Borges Cabral, indicado pelo Centrão do notório Valdemar da Costa Neto.
Em junho passado, foi indicado para o Banco do Nordeste. Aí afloraram as suspeitas sobre seu trabalho à frente da Casa da Moeda.
Segundo o Estadão,
Auditores atribuem a Alexandre Cabral “possível ato de gestão temerária” na presidência da Casa da Moeda e o descrevem como um dos “potenciais responsáveis” por prejuízos em contratos firmados durante sua gestão.
As acusações eram de contratos ruinosos com as empresas Sicpa e Cetim para a operação do Sistema de Controle de Bebidas e Rastreamento da Produção de Cigarros, que exigem uso intensivo de semicondutores. As empresas receberam R$ 11 bilhões em contratos. E, segundo relatório do Tribunal de Contas da União, as empresas “eram réus em notória ação penal por fraudes a licitações”.
Aliás, no mesmo ano, a Casa da Moeda – sob controle do governo Temer – suspendeu a produção de passaportes, porque o fornecedor entregou produtos com defeitos
O caminho encontrado pela CEITEC foi buscar mercado no setor privado.
Nesse período desenvolveu chips para cartuchos de impressora, etiqueta eletrônica para ser embutida em pneus de caminhões, etiquetas para a Vale gerenciar ferrovias, chips para o Sistema Nacional de Identificação Automática de Veículos etc.
Nos últimos anos, o faturamento da CEITEC vem dobrando, de R$ 3 milhões para R$ 6 milhões, depois para R$ 12 milhões, cifras inexpressivas, por enquanto, mas demonstrando o potencial de que dispõe, especialmente se o setor público voltasse a adquirir seus produtos. Muitas empresas novas alavancaram seu faturamento com os chips produzidos.
Mesmo assim, o inigualável Paulo Guedes resolveu liquidar a empresa, alegando não ser rentável.
O modelo apresentado é um primor de manipulação para negócios obscuros.
O CEITEC tem uma área de desenvolvimento de produtos e outra de fabricação de produtos. A fábrica tem equipamentos com o tamanho exato para os novos chips da tecnologia 5G.
A proposta de Guedes é esdrúxula. Vende os equipamentos da fábrica. E transfere a área de projetos, com todos os cientistas envolvidos, para uma fundação sem fins lucrativos. Tudo isso sem chamar a atenção de ninguém, sem chamamento público, sem divulgação ampla.
Mais que isso, o documento que propõe a extinção da CEITEC não tem nenhuma assinatura dos 6 representantes de governo que participam do programa de desestatização..
O resultado é óbvio. Um esperto qualquer adquire a fábrica pelo preço dos equipamentos – não do conhecimento acumulado, e mantem os funcionários. Todo o valor intangível – conhecimento, métodos de produção, patentes – se perde. Depois, vai até a tal fundação e recontrata os engenheiros ali acantonadas. Isso se as grandes multinacionais do setor já não tiverem levado embora.
Fonte: Portal GGN