Para a pós-doutora em Ciência Política Denise Mantovani (UnB), crescimento das candidaturas femininas na capital gaúcha é resposta ao discurso misógino bolsonarista. Sentimento antiesquerda também está refluindo
A candidata Manuela D’Ávila (PCdoB) vem liderando a disputa pela prefeitura de Porto Alegre. Em levantamento do Instituto Methodus divulgado na última sexta-feira (23), ela aparece com 24,9% das intenções de votos, à frente do ex-prefeito José Fortunati (PTB), que tem 14,2%, e do ex-vice-prefeito Sebastião Melo (MDB), com 10,5%. O atual ocupante do Palácio Piratini, Nelson Marchezan Jr (PSDB), aparece em quarto lugar, com 9,5%.
Para a pós-doutora em Ciência Política pela Universidade de Brasília (UnB) Denise Mantovani, a liderança de Manuela é uma reação às políticas privatistas adotadas pela atual gestão, que vem precarizando a prestação de serviços públicos nas áreas de Saúde e Educação, por exemplo.
Além disso, as consequências do desmonte do Estado são mais fortemente sentidas por conta da pandemia. “Temos uma cidade impactada pela covid-19 e também pelo desemprego. E por políticas públicas que foram desmontadas nas últimas gestões, muito mais voltadas para uma perspectiva liberal ou neoliberal, de enxugamento dos serviços públicos. Manuela vem conseguindo destacar e discutir questões que realmente são relevantes para a cidade. Como na perspectiva de gênero, já que o fim dessas políticas públicas impacta as mulheres, principalmente as mulheres negras da periferia”, afirmou Denise em entrevista a Glauco Faria, no Jornal Brasil Atual desta quarta-feira (28).
Força das mulheres
Nessa mesma pesquisa, Juliana Brizola (PDT) aparece com 4,8%, na quinta colocação, seguida por Fernanda Melchionna (PSol), com 2,1%. Denise destaca que, juntas, as candidaturas femininas do campo progressista ultrapassam os 30% das intenções de votos. O que é uma resposta, segundo ela, ao discurso bolsonarista misógino que avançou nos últimos anos. Da mesma forma, o sentimento antipetista e antiesquerda, que teve seu “ponto culminante” na eleição de Bolsonaro em 2018, parece refluir.
“Acho que estamos vivendo também uma certa reação a um modelo violento, racista e homofóbico, além de misógino, que o discurso bolsonarista vem empregando nos últimos anos. Em Porto Alegre, embora seja uma cidade conservadora, me parece que esses elementos vêm se incorporando numa avaliação mais crítica, o que leva a Manuela a ter essa preferência”, afirmou a analista.
Além da forte presença das mulheres nas candidaturas à prefeitura, a cientista política destaca a maior presença delas na disputa pelo Legislativo municipal, inclusive com candidaturas coletivas. Assim como no restante do país, as candidaturas negras também são recorde, o que é interpretado como reação ao crescimento do racismo nos últimos anos.
Marchezan em baixa
Denise lembra que, ao longo de 16 anos – Olívio Dutra (1989-1992), Tarso Genro (1993-1996 e 2001-2004), Raul Pont (1997-2000) – , a capital gaúcha foi governada pela aliança democrática-popular, liderada pelo PT. A “memória” desses tempos contrasta com o desmonte promovido pela atual gestão.
“Porto Alegre foi o berço do orçamento participativo, onde muitas políticas públicas foram implementadas nas periferias e no centro. Com serviços públicos em educação, rede básica de saúde, ampliação do SUS. Nesse momento, no entanto, o que Marchezan produziu foi um desmonte desse segmentos.”
Ela cita, por exemplo, as tentativas de privatização dos serviços de água e iluminação pública da capital. Além da recente tentativa de vender o Mercado Público. Na Saúde, a extinção do Instituto de Saúde da Família de Porto Alegre, com a demissão de 1.600 funcionários. E, ainda, a relação “permanentemente conflituosa” do atual prefeito com o magistério público do município.
“A classe média e os mais abastados nunca sentiram, mas a população na sua maioria, vem sentido o que significa uma orientação pelo desmonte do serviço público. Diria que esses elementos hoje fazem parte de uma avaliação crítica e negativa do atual prefeito”, aponta. “A educação está sendo muito impactada pela pandemia. Os pais percebem que se o poder público não agir, o que vai acontecer? Me parece que o Marchezan não tem essa preocupação, e hoje paga esse preço.”
Fonte: RBA
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