Por José Reinaldo Carvalho, do Jornalistas pela Democracia
Em 11 de setembro de 2001, 19 terroristas sequestraram quatro aviões comerciais nos Estados Unidos e realizaram um atentado de inauditas dimensões. Duas aeronaves foram jogadas sobre as torres gêmeas do World Trade Center, em Nova Iorque, símbolos do poder financeiro da maior potência capitalista. Um terceiro avião foi arremessado sobre o Pentágono, a sede do Departamento de Defesa dos Estados Unidos, em Washington, e destruiu parte do prédio, centro onde são planejadas guerras de agressão, símbolo do poderio militar da superpotência. O quarto avião caiu em um campo perto de Pittsburgh. Mais de 3 mil pessoas foram mortas e os prejuízos econômicos foram contabilizados em 90 bilhões de dólares.
O episódio deu pretexto a que se procedesse a uma inflexão ainda mais para a direita e para o predomínio de posições de força na política externa estadunidense – que já se encontrava em gestação desde que o grupo conhecido como “neocons” chegou à Casa Branca, a partir da eleição de George W. Bush à Presidência dos Estados Unidos.
Indubitavelmente, os atentados de 11 de setembro de 2001 e os abalos na situação internacional que se lhe sucederam tornaram o mundo pior, mais inseguro, perigoso e instável. Progressivamente assistiu-se a uma deterioração do quadro mundial, ao agravamento de suas contradições e conflitos.
Osama Bin Laden, ex-aliado dos Estados Unidos na guerra antissoviética do Afeganistão, foi acusado de ser o mandante dos atentados.
Sob o pretexto de caçá-lo, em 7 de outubro de 2001 tem início a operação “Liberdade Duradoura”, a guerra americana no Afeganistão. Por liberdade duradoura, entenda-se horror infinito.
A aviação estadunidense e a do seu principal aliado, o Reino Unido, fizeram uma verdadeira razia no país da Ásia Central. Os agressores instituíram um governo fantoche.
Desde o atentado às Torres Gêmeas, a chamada “guerra ao terrorismo”, inaugurada por George W. Bush, passou a ser o mantra da política externa e de “defesa” do imperialismo estadunidense. Combinado com outro mantra: a primazia dos interesses dessa superpotência, a imposição de sua hegemonia. A rigor, não foi abandonada nem por Barack Obama – a retórica de multilateralismo, paz e democracia não encontra respaldo nos fatos durante os governos democratas -, nem pelo atual, Trump, com seu discurso de que nada tem a ver com as guerras de seus antecessores.
O sucesso alcançado pelos Estados Unidos no Afeganistão foi apenas efêmero. Depois de duas décadas, a superpotência é desmoralizada por uma derrota e é obrigada a fazer um acordo com os Talibãs.
Por conveniências várias, e devido à comoção provocada pelos atentados, os Estados Unidos contaram imediatamente após o atentado de 11 de setembro de 2001 com a solidariedade das demais potências e diversos outros países. Formou-se uma ampla coalizão internacional. Aparentemente, estavam dadas as condições para o enfrentamento conjunto do “terrorismo internacional”, mas o fato é que tal combate foi feito mediante o terrorismo de Estado. E a estratégia de fazer esse combate por meio da guerra e da invasão de países fracassou.
Se o 11 de setembro de 2001 será sempre lembrado pelo atentado, outra data, o 20 de setembro do mesmo ano, ficou marcada como o dia em que a superpotência imperialista norte-americana anunciou ao mundo a inflexão em sua política externa, que viria a ser posteriormente sistematizada no corpo de ideias e conceitos denominados de “doutrina Bush”.
Naquele dia, o presidente George W. Bush exortou o mundo a criar a “coalizão antiterrorista”, dividiu as forças mundiais em termos maniqueístas – “quem não está conosco está contra nós” – , ameaçou punir “nações hostis”, num prelúdio do que viria a chamar poucos meses depois de “Estados bandidos”, integrantes do “eixo do mal”, contabilizou a existência de 60 países onde se albergam terroristas e ameaçou usar as armas de que dispõe em seu poderoso e sofisticado arsenal.
“Nossa guerra contra o terror começa com a Al Qaeda mas não termina aí”, vociferou Bush. “Não terminará até que todos os grupos terroristas de alcance global tenham sido encontrados, detidos e vencidos (…) Como lutaremos e ganharemos essa guerra? Dedicaremos todos os recursos sob nosso poder – todos os meios da diplomacia, todas as ferramentas da inteligência, todos os instrumentos para velar pelo cumprimento da lei, toda a influência financeira e todas as armas necessárias de guerra (…) Os estadunidenses não devem esperar uma batalha, mas uma campanha longa, distinta de qualquer outra que temos visto. Possivelmente, incluirá ataques dramáticos, que podem ser vistos na televisão, e operações encobertas, que permanecerão secretas mesmo depois do êxito (…) Perseguiremos as nações que ajudem ou abriguem o terrorismo. Toda nação, em toda região do mundo, agora tem que tomar uma decisão. Ou estão do nosso lado, ou do lado dos terroristas. A partir de hoje, qualquer nação que continue albergando ou apoiando o terrorismo será considerada regime hostil pelos Estados Unidos”, ameaçou.
O pronunciamento de George W. Bush em 20 de setembro de 2001 foi o documento fundador da “nova ordem”, a proclamação dos meios e dos modos como percorrer o pretendido “novo século americano”. Marcou uma mudança de fase nas relações dos Estados Unidos com o resto do mundo e no exercício da hegemonia norte-americana. Abriu-se novo período, que as forças anti-imperialistas no mundo chamariam de tirania global, uma expressão usada pelo então presidente cubano Fidel Castro, um período de uso indiscriminado da força bruta, desprezo pela legalidade internacional e pelas instituições multilaterais. Abriu-se uma fase de intensa militarização das relações internacionais e de decisões de força.
Outro resultado direto do 11 de setembro foi a guerra de agressão ao Iraque. Em 20 de março de 2003, os Estados Unidos e o Reino Unido bombardearam e invadiram o país árabe, alegando que o regime de Saddam Hussein estaria produzindo armas de destruição em massa. Foi uma ação unilateral sem autorização da ONU, cujos inspetores não encontraram provas da acusação. Em 2004, atuando no terreno como autoridades de ocupação, os governos dos Estados Unidos e do Reino Unido reconheceram que não havia armas de destruição em massa no Iraque. A desfaçatez fica patente, quando se constata que crimes foram cometidos em nome da suposta destruição das mencionadas armas.
A rigor, nenhum dos argumentos para atacar o Iraque se sustentava. Não há um problema sequer envolvido em tal argumentação que não pudesse ser resolvido pacificamente e por meios diplomáticos, nos termos de uma política estabilizadora de relações internacionais, além dos meios jurídicos, nos termos da Carta das Nações Unidas e de outros documentos legais que constituem o direito internacional.
Na verdade, a motivação para a guerra era outra. Tinha a ver com a inflexão operada na política externa estadunidense pela Doutrina Bush. Esta guerra tinha a ver com petróleo e a conquista de posições geopolíticas na luta que os Estados Unidos levam a efeito para exercer hegemonia no mundo. Nada a ver com direitos humanos, democracia, armas de destruição em massa ou missão civilizadora, muito embora os neocons considerem que os Estados Unidos são portadores desses valores e que é seu desiderato fazê-los triunfar no mundo, mesmo que de forma cruenta, ao atropelo do direito internacional, da democracia praticada segundo outros critérios e dos próprios direitos humanos. Na verdade são pretextos para salvaguardar interesses imperiais travestidos de valores.
Até hoje se debate sobre as implicações geopolíticas do 11 de setembro de 2011. A política dos neocons, que encontrou no episódio do 11 de setembro o momento propício para ser executada, corresponde ao objetivo da superpotência de estabelecer uma hegemonia ampla, ligada aos interesses da economia norte-americana, em franco declínio. Os seus teóricos estavam (estão ainda) convencidos de que os Estados Unidos devem proclamar seu domínio, afirmar a sua hegemonia, bastante questionada e em crise, recorrendo a todos os meios a seu dispor, entre eles a guerra de agressão, a militarização do mundo e a ameaça nuclear.
No quadro da “guerra ao terrorismo”, o governo dos Estados Unidos atacou também os direitos civis dentro do país, com a lei chamada Patriotic Act, e promoveu a prática da tortura e das prisões ilegais de prisioneiros estrangeiros nos cárceres de Abu Graib e Guantânamo.
A política de força e agressividade que os Estados Unidos promoveram na sua atuação internacional suscita não apenas debates, mas muita inquietação e insegurança nos demais atores da política internacional, sobre os rumos que irá tomar e sobre o mundo que espera a humanidade no transcurso do século 21.
O atentado às Torres Gêmeas e as guerras que lhe sucederam abriram uma fase ainda não terminada de imenso retrocesso na vida internacional, um desafio às forças amantes da paz.
fonte: Brasil 247
Foto: Sputnik