Depois de perseguir politicamente supostos adversários políticos e alcançar o status de ministério por meio da figura ds Sérgio Moro, a Operação Lava Jato agoniza nas mãos do presidente que elegeu.
Por Luna Zarattini*
Vivemos um momento extremamente grave. A destruição impulsionada pela pandemia do coronavírus já ceifou a vida de mais de 116 mil brasileiros e brasileiras. As políticas brutais da gestão Bolsonaro agravam e reafirmam a posição irresponsável dos governantes, que não têm olhos para o próprio povo. Neste momento, devemos lembrar que um dos fatores fundamentais para a eleição de Bolsonaro foi a narrativa de combate à corrupção aliada à defesa da Operação Lava Jato para a retirada do Partido dos Trabalhadores do poder.
A continuidade do projeto político popular posto em prática pelo PT sempre foi um entrave à implementação das políticas neoliberais implementadas pelo atual governo. Fato é que esse projeto neoliberal foi legitimado nas urnas em 2018, e sabemos que Bolsonaro deve parcela significativa de sua vitória à Operação Lava Jato.
O capitão reformado do Exército colocou-se como um político que buscava acabar com a corrupção e “com tudo isso que está aí”, o que sempre soubemos ser uma farsa. Antes mesmo de assumir a presidência, convocou o juiz Sérgio Moro para se tornar ministro da Justiça e da Segurança Pública, prometendo-lhe autonomia e selando a aliança que possibilitou o impedimento da participação de Lula como candidato à presidência e a demonização do PT para parte da sociedade brasileira.
Entre a eleição de 2018 e hoje, muita coisa mudou. Moro saiu do governo pela porta dos fundos e disparando contra o presidente, evidenciando a polarização entre bolsonaristas e lavajatistas, mais alinhados à direita tradicional. Pensando na reeleição, o presidente da República enxerga no ex-juiz de Curitiba uma ameaça à sua hegemonia política dentro do eleitorado da direita, e agora usa as armas a sua disposição para acabar com a operação que o elegeu. Em seguida a saída de Moro, Bolsonaro deu ao Procurador-Geral da República, Augusto Aras, a missão de pôr um fim à Lava Jato.
Já sabemos que o atual presidente nunca foi a favor do combate à corrupção, apesar de ter se utilizado desse discurso para surfar a onda anti-política que existe no Brasil desde 2013. Mas agora não resta nenhuma dúvida.
Bolsonaro colocou-se como um “outsider”, como alguém alheio à política tradicional, mesmo tendo exercido o cargo deputado federal por mais de 25 anos, sempre ligado à partidos do denominado Centrão e sem nenhum feito relevante durante todo o período.
Cada vez mais, provas da parcialidade política sempre presente no seio da Lava Jato são veiculadas pela mídia – abusos que há tempos denunciamos. Vide objetivos políticos escancarados de seus integrantes, em sua absoluta maioria comprometidos com a direita organizada e partidária. Conversas reveladas pelo site The Intercept Brasil demonstraram diálogos ilegais entre juizado e procuradoria, de forma a arranjar o resultado de sentenças condenatórias. Assim, a máscara de Moro, Dallagnol e dos lavajatistas caiu.
Nesta semana, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) precisa julgar o processo contra o coordenador da força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol. Para os de memória curta, ele foi o promotor responsável pela infame apresentação de “Powerpoint” que colocou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como chefe de uma organização criminosa. Em 15 de setembro de 2016, um dia após a referida apresentação, o ex-presidente protocolou uma ação afirmando que o coordenador da Lava Jato em Curitiba foi parcial na condução dos processos contra ele. O ex-presidente argumenta que foi considerado culpado pela suposta corrupção na estatal antes de ser julgado. Até hoje, Dallagnol é o procurador que comanda as investigações da força-tarefa.
Sabemos que Lava Jato e seus seguidores fervorosos não respeitaram o processo legal e a presunção da inocência do réu. Sabemos que foram cometidos abusos, tidos anteriormente como inconcebíveis: grampos ilegais, prisões por tempo indeterminado, delações forjadas, articulações entre procuradoria e juízes. Tudo isso em nome de uma suposta justiça orientada por desejos políticos.
O castelo de cartas lava-jatista está desmoronando com a divulgação das conversas da ‘Vaza-Jato’, Moro caindo das graças de Bolsonaro, o Ministério Público Federal concluindo recentemente que as acusações feitas pelo ex-ministro Antonio Palocci não possuem provas…
Aguardamos o julgamento de Dallagnol. No entanto, cabe comentar que essa ação já entrou na pauta do CNMP mais de 40 vezes. Alguns dizem que o clima no conselho é desfavorável ao chefe da Lava Jato em Curitiba. Em jogo, está se ele deve ou não ser afastado do comando das investigações para atender ao “interesse público”. A nós, resta a pergunta: quando a Lava-Jato atendeu ao interesse público?
Os malabarismos dos processos da Lava Jato revelam a diferença fundamental entre nós, do campo da esquerda, e os que estão ao lado de Jair Bolsonaro no que diz respeito à Operação Lava Jato . Eles utilizaram a operação quando lhes serviu, e agora visam encerrá-la procurando blindagem, estendendo a impunidade aos aliados. Nós, por outro lado, buscamos apenas a justiça e a correção dos abusos cometidos durante os processos.
Sofreu o PT e sofre hoje o Brasil, que se encontra nesta situação terrível. Vale ressaltar que foram os governos do Partido dos Trabalhadores os que mais incentivaram o combate à corrupção ao longo de seus 13 anos em Brasília, dando mais autonomia e fortalecendo os órgãos de fiscalização – fato admitido até por Moro. Não somos contrários ao combate da corrupção, muito pelo contrário. Mas isso deve ser realizado de maneira justa e livre de desejos políticos nacionais ou internacionais para que de fato a justiça seja feita em nosso país.
*Luna é cientista política de formação e feminista com convicção. É educadora popular e coordena a rede de cursinhos populares Elza Soares