O isolamento social, principal ferramenta de combate à disseminação do novo coronavírus afetou a vida de trabalhadores e trabalhadoras, mudando radicalmente a rotina de famílias inteiras e nos obrigando a lidar com uma nova realidade, que inclui hábitos mais rígidos de higiene, trabalho remoto, dentre outras mudanças. Nesse processo, as trabalhadoras acabam sendo as que mais arcam com as duras consequências da pandemia que enfrentamos. Múltiplas jornadas de trabalho, maior exposição ao vírus e aumento dos índices de violência estão entre os pontos que colocam as mulheres como as mais afetadas pela pandemia.
Violência doméstica se eleva durante isolamento social
De acordo com dados divulgados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), a violência contra a mulher aumentou em seis estados — São Paulo, Acre, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Mato Grosso e Pará. Somente em São Paulo se registrou aumento de 44,9% a mulheres vítimas de violência. No Rio de Janeiro, esse índice chegou a 50% nos primeiros dias de quarentena.
Em isolamento social e convivendo mais com seus companheiros, as mulheres podem estar sujeitas à agressão física e moral, afetando sua saúde mental e limitando sua autonomia. O convívio integral com o agressor pode dificultar a denúncia e isso levou diversas entidades a lançarem a campanha Maio Pela Vida das Mulheres. Uma campanha no mês em que se comemora, em seu 28º dia, o Dia Internacional de Luta pela Saúde das Mulheres.
Além de defender a saúde de todas as mulheres, a campanha também incentivou a denúncia de agressões e ajuda à mulheres em situação de risco. De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), a situação de vulnerabilidade feminina se elevou, em tempos de pandemia, não apena pelo confinamento de vítimas e agressores. O distanciamento feminino das redes de apoio e proteção, elevadas taxas de consumo de álcool e outras drogas e o aumento do estresse derivado da insegurança econômica, aumentam a situação de risco para as mulheres.
No plano econômico, mulheres também são as que mais sofrem com efeitos da pandemia
O Portal do Senado Federal define “Economia de Cuidado” como um conceito de economia como expressão utilizada para caracterizar as atividades que são desenvolvidas no âmbito da economia dos cuidados. Esse “setor” englobaria “atividades desempenhadas, gratuitamente ou não, por pessoas que se dediquem a prestar serviços orientados à satisfação de necessidades físicas ou psicológicas de terceiros bem como à promoção da criação e desenvolvimento de crianças e jovens”. Um conceito extremamente complicado e que evidencia ainda mais a desigualdade em que vivem as mulheres durante a pandemia.
As mulheres ocupam um papel central na chamada “economia do cuidado”. São elas que acumulam as tarefas do lar e da maternidade à suas jornadas de trabalho. Segundo dados do Conselho Federal de Enfermagem, cerca de 84,7% dos auxiliares e técnicos de enfermagem pertencem ao sexo feminino. Segundo a ONU, 70% dos trabalhadores de saúde em todo o mundo são mulheres. Isso sem contar as trabalhadoras que atuam na área de limpeza, recepção e outras áreas afins que também possuem maioria feminina. Além do maior risco de contágio, estas profissionais enfrentam maior chance de adoecimento psíquico por depressão, crise de ansiedade ou síndrome de burnout.
Maioria na ponta da luta contar o vírus, as mulheres, no entanto, não estão na esfera de poder de decisão para o combate a pandemia: dados das Nações Unidas revelam que elas são apenas 25% dos parlamentares em todo o mundo e menos de 10% dos chefes de Estado ou de Governo.
A ONU Mulheres estima que, dentre a população feminina mundial, as trabalhadoras do setor de saúde, as domésticas e as trabalhadoras do setor informal serão as mais afetadas pelos efeitos da pandemia de coronavírus. E, nesse caso específico, as negras são as mais afetadas pelas mazelas da pandemia. Segundo o IBGE, 47,8% das mulheres negras exercem trabalho informal no Brasil. Sem perspectiva futura e com diminuição da oferta de trabalho, eleva-se o risco destas trabalhadoras caírem na extrema pobreza. Para piorar, no setor têxtil, um dos mais afetados da indústria em todo mundo e paralisado por causa do trabalho temporário de lojas, as mulheres são três quartos dos trabalhadores no mundo, o que as coloca ainda mais vulneráveis ao aumento do desemprego após a pandemia.
A interrupção das aulas em creches e escolas também é um fator agravante. Ela aumenta a já elevada “dupla jornada de trabalho”, afetando assim também a trabalhadora que está em regime de home office, que passa a ter suas duas jornadas interpostas ao longo de todo o dia.
Os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres também foram afetados durante a pandemia. A atual sobrecarga dos serviços sanitários e de saúde acabam por imprimir limitações ao exercício continuado do pré-natal e ao acesso a métodos contraceptivos. Casos em que o direito à autonomia da mulher e ao acompanhante no parto e pós-parto foram vilipendiados pelas restrições dos serviços de saúde foram pauta de diversos matérias jornalísticas nas últimas semanas.
Compreender a situação das mulheres em tempos de pandemia é fundamental para a elaboração de políticas públicas de proteção às mulheres. A Secretária da Mulher Trabalhadora da CTB-RJ, ressalta que essa é uma das lutas da CTB:
*José Roberto Medeiros é jornalista da CTB Rio de Janeiro