No Dia da Consciência Negra homens e mulheres rechaçam discriminação e renovam esperança por um futuro melhor

Nem o sol forte, muito menos a chuva torrencial que caiu sobre São Paulo, dispersou aqueles que foram ao centro da cidade festejar o Dia da Consciência Negra e mais uma vez reforçar o combate a qualquer tipo de discriminação e opressão.

Eles chegaram cedo, por volta das 10h, vindos de diversas regiões metropolitanas, para mais uma vez comemorar o dia daquele que foi o herói do povo brasileiro, Zumbi dos Palmares, e reforçar a luta por seus direitos.

Entre os manifestantes que assistiram aos atos político e cultural aglomeravam-se diversos rostos de homens, mulheres, jovens e crianças. Olhares atentos e no rosto, sorriso de quem tem esperança de que as “coisas” vão melhorar.

Trabalhador aguarda início do ato político

Conscientização através da cultura

Assim afirmou Luciana de Oliveira, coordenadora do Projeto Fábricas de Cultura, que orienta e ajuda crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade a encontrar a esperança de um futuro melhor através da cultura.

Para Luciana, que trabalha com a juventude do bairro do Capão Redondo, periferia da Zona Sul, o projeto serve para conscientizar os jovens de seus valores e afastá-los da criminalidade, assim como as meninas da gravidez precoce. “Durante as atividades nós tentamos despertar a consciência sempre levantando os pontos positivos da comunidade. O que se tem bom na região, o que temos que valorizar no bairro assim como neles próprios. As meninas a gostarem de suas feições, de seu cabelo, a se gostarem. E isso tudo fazemos através da cultura, de peças de teatro, da dança, do circo, da música. Se esse adolescente quer tocar um violino mostramos que ele pode. Por que tem que querer tocar apenas pandeiro? Mostramos que se ele quiser vai poder tocar violino, pandeiro ou piano”, enfatizou.

Luciana lembra que já sentiu muitas vezes o preconceito em sua própria pele. “Na escola era a única aluna negra, no serviço era uma das poucas negras que tinha. Sofremos muito preconceitos por sermos mulheres e negras. Isso me levou a trabalhar nesse projeto. “Hoje as meninas me olham e se identificam. Os pais também. E é muito bom eles verem uma mulher negra em um lugar onde estavam acostumados a ver apenas brancos”, frisou de forma emocionada.

Os dois lados

Hoje José Carlos Barbosa Nobre, o Capotão, é diretor da Secretária de Discriminação Racial do Sindicato dos Metroviários de São Paulo e luta contra qualquer tipo de preconceito e discriminação no ambiente de trabalho, mas num passado não muito distante já sentiu o que é ser discriminado. “Conseguimos muito, mas ainda temos muita a conquistar. Quando analisamos o mercado de trabalho, podemos perceber que os negros estão em situação de desigualdade, são minoria. O Metrô é um exemplo disso. Temos poucos negros no quadro de funcionários”, alega.

Para José Carlos, faltam oportunidades para os negros

“O povo negro não tem tido igualdade de oportunidades. Um bom exemplo é o tratamento dispensado pela mídia, onde pobre e preto é visto como marginal ou empregado. A situação está melhorando, graças a nossos esforços, mas está longe de ser o ideal.”, conclui Capotão.

Oportunidade

Essa também é a opinião de Richardison Resende de Almeida, coordenador da Educafro (Educação e Cidadania de Afro-descendentes e Carentes), organização que oferece a jovens negros de comunidades carentes a oportunidade de entrar em uma universidade pública através da oferta de cursinhos pré-vestibulares gratuitos.

Cursando sua segunda faculdade, a primeira foi pública (Unicamp) e a segunda particular, Richardison reafirmou a importância das políticas de cotas para negros e pobres. “Uma atividade como a de hoje mostra que temos que lutar pelos nossos direitos, como por exemplo, a cota, é um direito nosso. A política de cotas é uma ação afirmativa, para que negros e pobres tenham um resultado crescimento na vida. Se você não der apoio ao morador que vive na periferia, ele não vai ter oportunidade de cursar uma faculdade, porque tem que entrar mais cedo no mercado de trabalho, sem conseguir assim se dedicar aos estudos e tentar uma vaga em uma universidade. Ou ele trabalha ou ele estuda”, salientou o coordenador da Educafro.

Diego Almeida, estudante da Educafro, acompanha o ato político debaixo de chuva

Informação confirmada por Diego Pires de Almeida (foto). O jovem, com 18 anos de idade, é morador do bairro do Capão Redondo e levava 2 horas para fazer percurso de casa até o local de trabalho, de onde foi recentemente demitido da função de jovem aprendiz. Hoje cursa o pré-vestibular da Educafro para tentar uma vaga em uma universidade. “Sem essa oportunidade eu não conseguiria entrar em uma faculdade, pois ganhava pouco. Em torno de 400 reais. E pela entidade conseguimos bolsas de até 100%”.

Os exemplos mostram que ainda são muitas as desigualdades, porém a cada dia os movimentos sociais aliados às centrais sindicais vêm conquistando os direitos subtraídos das minorias ao longo das décadas marcadas pela opressão e discriminação contra negros e mulheres.

Um estudo publicado pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos), confirma essa afirmação. De acordo com pesquisa realizada este ano a taxa de desemprego total dos negros continuou a ser superior à de brancos. Além disso, os negros tendem a ingressar mais cedo e a permanecer por mais tempo no mercado de trabalho. No ano passado os negros representavam 38,4% da população paulistana, mais do que em 2004, quando somavam 35%.

A CTB, que defende os direitos dos trabalhadores e trabalhadoras brasileiras, mais uma vez reforça sua luta pela superação do racismo e suas consequências socioeconômicas e renova o compromisso com o país e com a população negra através da defesa pela igualdade de direitos, do combate à falta de oportunidade e discriminação no mercado de trabalho.

Cinthia Ribas – Portal CTB

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