A tragédia de Brumadinho parece não ter mais fim. Além das mortes (de centenas de seres humanos) e vasta destruição da Natureza verificadas até o momento, a ruptura da barragem da Vale no município mineiro deve acarretar um surto de doenças infecciosas, com aumento da incidência de dengue, febre amarela, esquistossomose e leptospirose — além do agravamento de doenças respiratórias, problemas de hipertensão e transtornos mentais como depressão e ansiedade. Esses efeitos devem ser constatados já nas próximas semanas, de acordo com estudo publicado nesta terça-feira (5) pela Fiocruz, dia em que já tinham sido constatadas 134 mortos e quase duas centenas de desaparecidos.
O pesquisador Carlos Machado de Freitas, um dos responsáveis pelo levantamento, destacou o risco de aumento das doenças transmitidas por mosquitos vetores, como a dengue e febre amarela, e lembrou a experiência da ruptura de outra barragem da Vale pouco mais de três anos atrás, em Mariana.
“No caso de Barra Longa (MG) [cidade vizinha ao local do rompimento da barragem da Samarco, em 5 de novembro de 2015], depois de Mariana houve um aumento expressivo de mais de 3.000% de casos de dengue. A área de Brumadinho foi uma área de transmissão de febre amarela”, pontuou.
Curto e longo prazo
Também há risco de problemas respiratórios e de pele, principalmente a partir do momento em que a lama começar a secar — porque ela se transforma em poeira e a população passa a ter contato com ela.
Esses efeitos podem começar a ser sentidos já nas próximas semanas, mas alguns serão vistos apenas a longo prazo — como, por exemplo, a contaminação por chumbo, cádmio e mercúrio, que já foram identificados na lama. As consequências do rompimento podem, também, “se estender por centenas de quilômetros do local de origem”, de acordo com os autores.
A população pode, ainda, ser afetada por problemas ligados à contaminação da água do rio Paraopeba, afirmou Freitas.
“A gente ainda não sabe os níveis de contaminação nem toda a composição da lama — mas essa contaminação certamente vai comprometer o abastecimento. Ao comprometer o abastecimento, ele tem um impacto também no armazenamento de água, e em doenças como a dengue. Além disso, o uso dessa água ou a coleta de peixes dessa água pode significar a ingestão de água ou alimentos contaminados”, avaliou.
Outras doenças transmitidas pelo contato com água contaminada, como esquistossomose e leptospirose, também podem ter aumento no número de casos, segundo o estudo da Fiocruz.
Crime sem castigo
“Baseado na experiência do desastre da Samarco em Mariana e outros desastres que nós temos investigado, a gente sabe que provavelmente vai ter um agravamento das doenças crônicas — como hipertensão e diabetes — até por conta do impacto na saúde mental. Você tem uma desorganização dos meios e condições de vida de forma geral”, avaliou Carlos Machado de Freitas.
Na pesquisa, os cientistas também apontam o isolamento e a “perda de condições de acesso a serviços de saúde” como um fator que pode agravar as doenças já existentes na população afetada. Freitas apontou a necessidade de estruturar os serviços de saúde para atender a população, principalmente a longo prazo, à medida que os atendimentos emergenciais deixem de ser feitos.
“Após esse primeiro mês, eu vou ter, certamente, uma diminuição dos recursos humanos, técnicos e financeiros em Brumadinho, e, principalmente, para os próximos dois anos. Nosso esforço hoje, aqui, é nos antecipar para evitar que essas doenças ocorram novamente e sejam tratadas como se fossem naturais”, afirmou.
Ninguém pagou pelo crime em Mariana e certamente este foi um dos motivos para que a tragédia se repetisse em escala ampliada na infeliz cidade de Brumadinho. E o povo já pergunta indignado se os donos da Vale vão continuar na impunidade.
Da Redação, com informações do G1
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