Um dos acontecimentos mais relevantes em curso no mundo hoje é a vertiginosa ascensão da China à condição de grande potência econômica mundial e principal rival, neste terreno, dos Estados Unidos, cujo poderio está em franca decadência. Os efeitos desta ascensão são sensíveis e crescentes na América Latina, envolvem diversos aspectos da economia política, com destaque para o comércio.
"A China é o maior país em desenvolvimento do mundo. A América Latina e o Caribe são regiões em desenvolvimento muito importantes. Ambos encaram a mesma missão de desenvolver e dividir um amplo aspecto de interesses em comum", afirmou recentemente o ministro das Relações Exteriores da mais próspera nação asiática, Yang Jiechi. Naturalmente, as relações com o Brasil merecem destaque.
Deslocando os EUA
O Brasil anunciou há algumas semanas que a China se tornou seu principal parceiro econômico nos primeiros seis meses de 2009, superando os Estados Unidos pela primeira vez. Apesar da crise global, o volume de mercadorias brasileiras importadas pela China cresceu mais de 40%.
Alguns analistas acreditam que a vantagem chinesa se deve sobretudo à crise econômica e que, passada esta, é provável que os EUA reconquistem o primeiro lugar entre os parceiros do Brasil. Outros acham que, em médio e longo prazo, a tendência ao declínio do mercado norte-americano tende a prevalecer, até mesmo em função da necessidade de corrigir os chamados desequilíbrios globais. Seja como for, o fato confirma uma tendência na América Latina: a influência da China na região está em alta.
Negócios e matérias primas
Kerry Brown, especialista em assuntos asiáticos do think tank britânico Chatham House, compara as relações econômicas entre a China e os latino-americanos ao papel do país na África: "O interesse primordial da China na América Latina são negócios e recursos naturais".
O comércio é vital para a China, concorda Hanns Günther Hilpert, também especialista em Ásia no Instituto Alemão de Assuntos Internacionais e Segurança (SWP) em Berlim. Ao conduzir suas relações exteriores, o país tem sempre em mente o benefício de seus interesses comerciais e o próprio desenvolvimento.
Soberania
Como no caso da África, Pequim está especialmente interessada em recursos naturais e energia, tendo se tornado o maior importador de cobre, minério de ferro, ouro e petróleo latino-americanos. Mas não se trata de uma relação de mão única, ressalva Hilpert. "A América Latina é um enorme mercado exportador para a China, a atual líder em manufatura industrial."
De artigos eletrônicos a automóveis, cada vez mais produtos vendidos na América Latina trazem o selo made in China. Ao aumentar suas exportações para a região, Pequim persegue uma estratégia de diversificação. "Eles não querem ficar dependentes demais dos mercados norte-americano e europeu", explica Hilpert. O inverso também é verdadeiro. Apesar das contradições que desperta com a agressiva competitividade de sua indústria, a ascensão da China contribui para reduzir a dependência dos países latino-americanos em relação ao mercado estadunidense e fortalece a luta por modelos de desenvolvimento soberanos e divergentes do Consenso de Washington.
Influência política
Embora o foco comercial esteja bem definido, a economia não é tudo para os chineses. "É claro que também perseguem certos interesses políticos", comenta Brown. "Eles querem que a primazia da China sobre Taiwan seja reconhecida e fazem disso uma condição para investir em outros países."
Os taiwaneses ainda mantêm relações com algumas nações da América Central e com o Paraguai, mas a China tenta isolar Taiwan e os governos que o reconhecem, acrescenta Hilpert. "A China também tenta promover seu princípio de não-interferência em questões internas, incluindo as de direitos humanos. Ela procura aliados e pode encontrar alguns entre os latino-americanos."
Além disso, acrescenta Brown, os chineses também já inauguraram diversas sedes do Instituto Confúcio na América Latina. Teriam os EUA e a União Europeia motivos para se preocupar com a crescente influência chinesa na região? "A questão não é tanto a América Latina, mas sim a corrida por influência na governança global, e nesse aspecto a China está entre os grandes adversários do Ocidente", explica Hilpert.
Porém, é preciso ponderar a ascensão da China e o enfraquecimento do poderio econômico dos EUA, pois, conforme assinalou recentemente o autor argentino Andrés Oppenheimer em sua coluna para o Miami Herald, o investimento direto norte-americano ainda é muito superior ao da China na América Latina e no Caribe. Enquanto as empresas estadunidenses lá injetaram 350 bilhões de dólares em 2007, os chineses não passaram dos 22 bilhões.
(Portal CTB, com informações do sítio dw.world.de)