PEC da Morte: o que estamos fazendo pelos nossos filhos?

A morte do menino Guilherme (Silva Neto), 20 anos, assassinado pelo pai, neste 15 de novembro, me traz além da dor, a seguinte indagação: O que estamos fazendo pelos nossos filhos no processo educativo? Onde estamos, que não ocupamos os corações desta juventude? O que é a educação e para que serve? Porque um pai decide matar seu próprio filho e atirar sobre sua cabeça logo em seguida?

Sabemos que as ocupações de escolas neste momento, é a forma de resistência, de protesto que a juventude encontrou para lutar contra os governos, contra a PEC da Morte, a PEC 55. Mas, ela é bem mais que isso. Ocupar significa tomar posse, apoderar, trabalhar, viver!

Somente quem vai a uma escola ocupada pode ter noção do trabalho realizado por cada um e cada uma das pessoas e do coletivo que ali se faz. Durante 2015, tive a oportunidade de visitar 16 escolas ocupadas em Goiás, e era surpreendente a recepção, inicialmente desconfiada, por parte dos atores ali inseridos e que não me conheciam.

Mas, ao adquirir confiança, se entusiasmavam em nos relatar os procedimentos para buscar e manter a unidade, a permanência e a organização. Muitos sofreram, foram presos, perseguidos, maltratados pelos pais e até por professores. Mas, bravamente resistiram e vários, foram para a universidade e continuam em luta contra a privatização do ensino.

André Tokarski, líder nacional da juventude, nos contava ano passado, sobre um dos relatos das ocupações em São Paulo. Dizia que, no segundo dia de ocupação de uma escola, a mãe apreensiva e bastante irritada chegou ao portão aos gritos para buscar o filho, Pedro (nome fictício).

Gritava:

– Chama o Pedro! Eu não vou deixar meu filho nessa ocupação!! Eu não admito filho meu nessa bagunça!

E a jovem, que cuidava do portão, perguntou a mãe:

– Qual o sobrenome do seu filho? Qual Pedro?

E a mãe respondeu:

– É Pedro Guilherme!

A menina gentilmente olhou na planilha e disse:

– Olha, hoje, é dia do Pedro Guilherme lavar os banheiros. Ele tá cumprindo esta tarefa agora.

A mãe chocada, esbravejou:

– O Pedro Guilherme! O Pedro, está lavando banheiros? Meu filho lavando banheiro?

E a menina com a prancheta na mão, respondeu:

– Sim. Ele tá no terceiro banheiro.

A mãe:

– Meu filho nunca lavou banheiro. Você tem certeza que é o Pedro Guilherme?

– Sim, respondeu a menina.

– Então deixa meu filho aí!! Deixa que isso é muito importante pra ele, disse a mãe.

Esse relato parece não significar nada. Mas, só quem vive a ocupação, quem trabalha na ocupação e das famílias que participam da luta coletiva, é que sabem, e veem os resultados no processo de formação dessa moçada. Há pais que se inserem e dão grandes contribuições para a escola, passando a formar melhor seus filhos em uma educação humana e de exercício de cidadania.

As ocupações fazem a luta da resistência contra o golpe, contra o fascismo, contra o autoritarismo, contra os que se apropriam da liberdade da juventude de lutar, de resistir, de sonhar e, de reinventar um outro modelo de sociedade.

Eu vi o Guilherme em diversos atos em defesa da Educação, em defesa do transporte coletivo, contra as OSs. Eu acompanhei as postagens dele. E, uma das postagens, para mim, bastante significativa, não era contra o governo, ou sobre a luta específica. Guilherme postou uma foto de quando era criança brincando, e compartilhou uma nota. Era sobre o direito dos meninos.

O direito às diferenças, o direito de dançar, de chorar, o direito de amar. O direito de se humanizar. O pai do Guilherme deveria ter ido às ocupações. Deveria conhecer os amigos, as intenções, deveria ter vivido, e, deveria principalmente tê-lo deixado viver.

Ailma Maria de Oliveira é professora e presidenta da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil em Goiás.

Os artigos publicados na seção “Opinião Classista” não refletem necessariamente a opinião da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) e são de responsabilidade de cada autor

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