Roger Waters explica por que os músicos têm medo de criticar Israel

A estrela da banda Pink Floyd – destacado apoiante da campanha de “Boicote, desinvestimento e sanções” (BDS) contra Israel – afirma que a experiência de ser constantemente etiquetado de nazi e antissemita assustou os músicos e levou-os ao silêncio.

“Não precisamos de controle mental”, Roger Waters escreve no muro Israel-Palestina, 2006“Não precisamos de controle mental”, Roger Waters escreve no muro Israel-Palestina, 2006 Segundo Roger Waters, os músicos norte americanos que apoiam o boicote a Israel na questão dos direitos dos palestinos têm medo de falar porque temem ver as suas carreiras destruídas.

“A única resposta ao BDS é a de que é antissemita”, afirmou Waters ao The Independent, na sua primeira entrevista importante no Reino Unido sobre o seu compromisso com o ativismo israelita. “Sei o porquê tenho sido acusado de ser nazi e antissemita nos últimos 10 anos”.

“A minha indústria tem sido particularmente insistente em levantar uma voz [contra Israel]. Eu, Elvis Costello, Brian Eno, Manic Street Preachers, e mais uma ou duas pessoas, mas não há ninguém nos Estados Unidos, onde vivo. Tenho falado com muitos deles e estão cheios de medo.

“Se dizem algo em público, ficarão sem carreira. Serão destruídos. Tenho esperança de encorajar alguns deles a deixarem de estar assustados, a porem-se de pé, e a somarem-se a esta causa, porque precisamos deles. Precisamos desesperadamente deles neste debate da mesma forma que precisávamos dos músicos nos protestos contra a guerra no Vietnã”.

Waters comparou a forma como Israel trata os palestinianos com a África do Sul do apartheid. “A forma como o apartheid na África do Sul tratou a sua população negra, fingindo que esta tinha algum tipo de autonomia, era uma mentira”, referiu.

“Tal como é mentira agora que existe alguma possibilidade, no atual status quo, de os palestinianos alcançarem a sua autodeterminação e, pelo menos, um Estado de direito no qual possam viver, criar os seus filhos e montar as suas próprias indústrias. Trata-se de uma civilização antiga, brilhante, artística e muito humana que está a ser destruída diante dos nossos olhos”.

Uma viagem a Israel em 2006, durante a qual Waters tinha planejado fazer um concerto em Tel Aviv finalizando a etapa europeia da tour Dark side of the Moon Live, transformou a sua visão do Oriente Médio.

Após falar com artistas palestinianos, bem como com manifestantes contra o governo israelita, que lhe pediram para utilizar o concerto como uma plataforma para falar contra a política exterior de Israel, Waters transferiu o concerto do Hayarkon Park para Neve Shalom, uma povoação pacífica israelo-árabe. Mas, como os bilhetes já tinham sido vendidos, o público continuava a ser inteiramente israelita judeu.

Waters afirmou: “Foi muito estranho atuarmos perante uma plateia completamente segregada, porque não existiam palestinianos ali. Só tinha 60 mil judeus israelitas, que não poderiam ter sido mais acolhedores, agradáveis e leais com os Pink Floyd. No entanto, deixou uma sensação incômoda”.

Viajou pelas cidades de Jenin, Ramallah e Nablus, observando como se segregaram as duas comunidades, e também visitou o muro que separa Israel dos territórios ocupados e fez um grafiti assinado do seu trabalho mais conhecido Another Brick in The Wall, que dizia: “Não precisamos de nenhum controlo do pensamento”.

Waters juntou-se cedo ao movimento BDS, recebendo o opróbrio e a condenação por se ter atrevido a fazer algo que tão poucos músicos estão preparados para fazer. “Estou contente por tê-lo feito”, afirmou, lembrando que as pessoas em Israel “são tratadas de maneira muito desigual em função da sua origem étnica. Os cidadãos israelitas palestinianos e os beduínos são tratados de forma completamente diferente dos cidadãos judeus. Há entre 40 a 50 leis diferentes dependendo se são ou não judeus”.

Waters sabia que seria vaiado pelos críticos, mas é a acusação de ser nazi que considera a mais absurda, sobretudo tendo em conta que o seu pai, o tenente Eric Waters, que pertencia ao 8º Batalhão Real de Fuzileiros, morreu aos 31 anos numa batalha contra os nazis em Anzio, Itália, no início de 1944. O seu corpo nunca foi encontrado, mas o seu nome é assinalado no cemitério Commonwealth War Graves em Monte Cassino.

A dor de não ter conhecido o seu pai, que morreu quando Waters tinha cinco meses, influenciou algumas das canções mais famosas dos Pink Floyd.

“Há veteranos a assistir a todos os meus concertos e eu reúno-me com eles nos intervalos. Num concerto em 2013, um veterano abordou-me, agarrou a minha mão e, sem soltá-la, olhou-me nos olhos… mal consigo dizer isto sem me emocionar. Disse-me: ‘O teu pai teria ficado orgulhoso'”.
“O meu pai morreu a lutar contra os nazis, a minha mãe [uma grande lutadora pelo desarmamento mundial] dedicou a sua vida a fazer todo o possível para criar um mundo mais humano”.

“Estamos a fazer perguntas que nunca tínhamos feito até há um par de anos, que estão a provocar a ira do lobby israelita que cai sobre pessoas como eu e todos os demais que se atrevem a questionar e criticar”.

“[O lobby israelita] está decidido a não permitir o desenvolvimento de um debate que as pessoas possam ouvir e é por isso que nos acusam de nazis. Esta ideia de que o BDS é a pequena antecâmara de uma espécie de deriva genocida nazi que termina em outro Holocausto – bem, não é assim”.

Nick Mason, baterista dos Pink Floyd, escreveu a respeito de Waters na sua autobiografia: “Quando vê uma confrontação como necessária, sente-se totalmente comprometido a ganhar, pelo que aposta tudo – e isso pode tornar-se bastante assustador”.

O novo embaixador de Israel no Reino Unido, Mark Regev, ex-porta-voz de Benjamín Netanyahu, parece ser o próximo homem na mira de Waters “nesta batalha das palavras”.

Waters afirmou: “Posso dizer-vos o que Mark Regev vai afirmar a respeito de qualquer situação. Vai dizer: ‘O que faria se os seus filhos estivessem a ser sacrificados pelos terroristas? Não temos direito a defender-nos?’ E esse é o mantra”.

Waters assinala o crescente ativismo nos campus universitários dos Estados Unidos, frequentemente por parte dos estudantes judeus, como motivo para o otimismo de que o status quo pode mudar durante a sua vida. Muitas vezes escreve cartas àqueles alunos que, segundo diz, irão desempenhar um papel tão importante no futuro de Israel como aquele que os manifestantes contra a guerra do Vietnã desempenharam influenciando a política exterior norte americana nos anos 1960 e 1970.

“O meu coração canta quando vejo estes jovens a organizar-se e aplaudo-os por tomarem uma posição face a tão enorme oposição”, disse.

“São jovens valentes e não podem ser comprados. Acreditam na sua empatia e amor pelos demais seres humanos. Não acreditamos na construção de muros. É muito importante entender a nossa humanidade e cooperar entre nós para criar um lugar melhor para os nossos filhos e netos”.

Fonte: Esquerda.net, por Por Paul Gallagher

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