Quem chora pelos mortos no Mediterrâneo?

Numa das maiores tragédias humanitárias dos últimos tempos, centenas de pessoas faleceram neste sábado (18) num naufrágio no Mediterrâneo. Há quem estime em mais de 700 mortos – entre mulheres, crianças e bebês de colo. O desastre ocorreu na travessia da costa da Líbia para a ilha italiana de Lampedusa. A frágil embarcação não aguentou a superlotação e o pânico tomou conta dos imigrantes. Segundo relato chocante de um dos sobreviventes, “eles morreram como ratos num porão”. Natural de Bangladesh, o jovem de 32 anos foi resgatado entre os 28 sobreviventes até agora confirmados e contou que havia, pelo menos, 200 mulheres e 50 crianças no barco do terror.

Esta não foi a primeira tragédia na região e nem será a última. Autoridades italianas estimam que mais de 2 mil pessoas já faleceram no Mediterrâneo nos primeiros três meses deste ano. Durante todo o ano passado, foram quase 4 mil. Entidades humanitárias garantem que os números desta barbárie estão subestimadas. Inúmeros naufrágios não são “contabilizados” devido à política antimigratória da União Europeia, que reduziu em 70% os “gastos” na fiscalização das embarcações. Os governos europeus, embalados pela onda fascista contrária aos imigrantes, têm priorizado os “investimentos” na repressão e na desumana segregação dos refugiados.

Como aponta Flávio Aguiar, correspondente do site Carta Maior em Berlim, a tragédia deste fim de semana acirrará a polêmica sobre a política migratória. Na semana anterior, outro naufrágio já havia vitimado cerca de 400 pessoas. “No ano passado, quando o número de vítimas foi bem menor, a marinha italiana executava um programa chamado de Mare Nostrum, ao custo de 9 milhões de euros ao mês. Cansado de pedir ajuda, sem recebê-la, aos demais países europeus, o governo cancelou a operação e substituiu por outra, a Triton, ao custo reduzido de 3 milhões de euros. Agora cresce a pressão para que a União Europeia tome para si o assunto. Até o Papa fez um apelo neste sentido”.

Enquanto os governos europeus decidem o que fazer, milhares de imigrantes que fogem da miséria e das guerras – impostas pelas próprias potências capitalistas – continuarão morrendo “como ratos no porão”. Já a mídia privada, que adora fazer sensacionalismo com outras tragédias, seguirá tratando o tema com pouco destaque e fortes doses de preconceito. O caso do jornal britânico “The Sun” é exemplar deste tratamento asqueroso. Uma das principais colunistas do diário, Katie Hopkins, escreveu recentemente que os governos europeus deviam “usar navios armados para mandá-los (os imigrantes) para longe”. Para ela, os imigrantes são “seres humanos selvagens que se espalham como vírus”. Esta visão preconceituosa e racista é muito comum na mídia hegemônica internacional – ela inclusive tem os seus adeptos no Brasil.


Altamiro Borges é jornalista, presidente do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé. Artigo originalmente publicado em seu blog.  

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