A Cuba que nós vimos durante o VI Encontro Sindical Nossa América

Acompanhando dois diretores do Sinpro Campinas fui a Cuba no início de maio para participarmos do 1º de Maio, do Ato de Solidariedade aos Cinco Cubanos presos nos EUA desde 1998, e do VI Encuentro Sindical Nuestra America – ESNA.

Foram quatro dias de atividades políticas acompanhadas por 450 delegados de 33 países e que mostraram um exemplo concreto de tudo o que comunistas, socialistas e a classe trabalhadora sonha: plenos direitos respeitados.

Só mesmo vendo para desconstruir toda baboseira propagada pela mídia e pelos Estados Unidos e entender a sociedade ideal sonhada pelos socialistas. Em Havana, capital de Cuba, cidade metropolitana, não há fome, abandono, miséria, repressão ou insegurança.

Mesmo com tantas privações, vontades e carências materiais que possam ter, devido ao implacável bloqueio econômico imposto há 55 anos pelos estadunidenses e outros países a eles submissos, o povo cubano resiste e muito bem.

A saúde de fato é para todos, preventiva e evoluída. A educação e a cultura são parte da vida desde a infância, com pleno acesso e alta qualidade. E há liberdade sim. São muito mais livres do que nós brasileiros, que vivemos num país “democrático” e que os estadunidenses. A liberdade é visível por onde se anda.

Desde a tomada do poder em janeiro de 1959 a revolução socialista se mantém valorizando sua luta, sua história e seus monumentos, que são muitos, alguns bem preservados e outros nem tanto, porque falta dinheiro para preservar tamanho patrimônio.

Cuba se localiza a uma distância muito pequena dos Estados Unidos, cujo capitalismo continua cobiçando aquela ilha cercada pelo mar do Caribe, um filé mignon para a ganância americana, que adoraria poder se apropriar daquele paraíso turístico e ter muito mais lucro, e assim destruir sua cultura como já fez em Cancun, no México.

A base da economia cubana é o turismo, seguido da produção artesanal dos charutos, do rum de altíssima qualidade, da cana e do café, produtos que exportam, apesar dos boicotes e embargos dos EUA e de alguns países da Europa. No aeroporto do México, por exemplo, um dos principais pontos das conexões para Cuba, não se encontram nas lojas do Dutty free, charutos cubanos, rum Havana Club e qualquer outro produto cubano que possa interessar ao turista.

Todo alimento que produzem, arroz, feijão preto, leguminosas, hortaliças, é para consumo próprio. O povo cubano tem sua cesta básica com os itens de primeira necessidade, mas com o pouco espaço para produzir e impossibilidade de importar a preços justos qualquer alimento, falta leite, que é fornecido somente às crianças até os 7 anos, falta carne de vaca e o ovo. Mas comem muito frango e carne de porco.

Outro produto raro e caro é o papel higiênico, aliás, tudo o que diz respeito à higiene pessoal é muito caro.

O transporte público funciona bem. Grande parte da frota de ônibus foi comprada de outros países, de segunda mão. Nos horários de pico andam lotados. Os carros antigos, da década de 50, continuam circulando, uns, bem conservados, outros nem tanto. São usados no turismo e nas lotações, as chamadas “máquinas” que transportam até cinco passageiros em viagens curtas, a 10 pesos cubanos.

Nas ruas de Havana já circulam os chamados carrões Mitsubish, Hunday, Audi e companhia. Mas para que trocar o charme de circular na Havana Colonial num Pontiac autêntico por um destes carros modernos e confortáveis? Quem vai conhecer a Praça da Revolução, o Museu da Revolução, a Praça das Armas, a Catedral, o Capitólio (uma réplica do de Washington agora em fase de restauração) e a Universidade de Havana, deve aproveitar a atmosfera e mergulhar na história daquele povo.

Assédio

Como em qualquer outra cidade de alta circulação de turistas do mundo inteiro existem em Havana os pequenos golpistas e oportunistas. Na Havana antiga e Havana Velha é difícil andar muito tempo sem ser abordado por algum vendedor de charutos “legítimos”, alguém que queira te levar a um restaurante de comida típica cubana. Quando o turista cai no golpe acaba pagando uma conta mais cara do restaurante, do bar ou dos charutos vendidos pelo dobro do que custariam.

O CUC, peso cubano conversível vale mais do que o dólar, e é a moeda que circula somente com turistas e comércio voltado a eles. Um CUC vale 25 pesos cubanos, daí ser tão cobiçado pelos oportunistas de plantão.

Há também o turismo sexual, mas nada que se compare ao escândalo da venda de meninas e meninos nas nossas cidades turísticas, em Recife e Fortaleza, por exemplo.

Educação

A criança já começa a ser assistida a partir do momento que termina a licença maternidade, que é de seis meses para todas as mães. Se a mãe opta por não voltar a trabalhar após os seis meses pode continuar mais seis meses com os filhos, mas sem receber os rendimentos integrais. A criança vai então para o que seria equivalente à creche, mas a preferência é dada para os filhos das mães que trabalham.

Depois dessa fase começa a escola de ciclos que vai terminar no nosso equivalente 9º ano do Ensino Fundamental. No nível secundário, Ensino Médio do Brasil, os alunos já podem se direcionar para cursos técnicos ou se preparar para a universidade.

Atualmente, depois de investirem muito para que todos pudessem ingressar no ensino superior e constatarem que havia muita desistência por falta de vocação e de vontade, só vai para a universidade quem realmente quer. Mas não basta querer, é preciso passar por três provas, uma peneira que vai mostrar se realmente estão preparados e se tem vocação para a área pretendida.

Dividendos

Cuba hoje exporta seu modelo de saúde e também seus médicos. Ao perguntar sobre o interesse dos cubanos para participarem dos programas de envio de médicos a diferentes países e continentes a maioria prefere vir para o Brasil. Podem escolher, não são obrigados a vir, e podem mandar dinheiro para suas famílias adquirirem alguns luxos como pintar a casa, comprar computador, carro ou viajar.

Todo mundo pode viajar para onde quiser, só não há dinheiro suficiente. Mesmo assim, conhecemos uma operária e uma professora universitária que fazem milagres com o orçamento doméstico, e conseguem passar alguns dias em, Varadero, praia paradisíaca, localizada há 140 quilômetros de Havana, na província de Matanzas. O lugar é muito caro, inclusive para nós brasileiros, mas o sonho de consumo dos havaneros.

Desafio

Com o incremento do turismo nos últimos anos vem aumentando a distorção dos valores ganhos pelos trabalhadores das outras áreas, incluindo médicos, engenheiros e professores universitários. Quem está diretamente em contato com os turistas em hotéis, casas particulares, que alugam quartos, restaurantes, táxis e fretados, recebe gorjetas em CUC, que podem representar quase um terço ou mais do salário de um cubano regular.

Esse grupo começa a formar uma classe média, que tem mais do que a grande maioria. Uma situação difícil de contornar, mas que tem sido amplamente discutida e que deve ser controlada para não acabar com o equilíbrio e qualidade social conquistados nestes 55 anos de revolução socialista.

Ativismo

O 1º de Maio é uma mobilização de fazer inveja a qualquer país. Havana para. Às cinco horas da manhã já se vê a população andando pelas ruas e nos ônibus em direção a Praça da Revolução. Lá acontece o desfile que reúne dezenas de milhares de pessoas do mundo todo, com faixas e cartazes construídos artesanalmente e também muito material institucional defendendo a revolução, a libertação dos Cinco Cubanos, o fim das tentativas de golpe na Venezuela e o quê mais quiserem. O desfile dura cerca de três horas animado pelo som de uma batida que lembra o batuque dos negros da senzala, mas também pela Salsa, ritmo que domina as noites de sexta a domingo em Havana.

Não há palanques nem falas. O estilo Fidel Castro de fazer discursos com mais de duas horas de duração não é seguido pelo irmão Raul Castro, novo comandante da Cuba. Termina o desfile todos vão fazer sua festa pelo Dia do Trabalhador.

O Ato de Solidariedade

Organizado pela CTC – Central dos Trabalhadores de Cuba, o ato teve como objetivo conseguir maior apoio da comunidade internacional e aumentar a pressão sobre os Estados Unidos para que libertem os três prisioneiros cubanos que ainda são mantidos presos, sob a falsa acusação de terrorismo. Estes homens foram para os EUA na década de 90 para se infiltrar nas comunidades cubanas que viviam na Flórida junto à organizações contra o regime de Fidel Castro e que promoveram os mais variados ataques contra Cuba, financiadas pelo governo estadunidense. Estes chamados Cinco Heróis cubanos foram descobertos depois que esquemas das organizações anticastritas vazaram impedindo algumas ações criminosas que por anos tentaram desestabilizar o poder em Havana.

Dois dos presos condenados a penas mais brandas foram libertados, mas três ainda deverão cumprir as penas arbitrárias definidas pelos EUA. Um deles, considerado o líder, foi condenado a duas prisões perpétuas e mais 15 anos de cadeia, coisa que só a Justiça americana consegue produzir sem ser rechaçada.

Encontro Sindical

O Encuentro Sindical Nuestra America – ESNA – reuniu 450 pessoas, sindicalistas, centrais e trabalhadores de 33 países e buscou organizar ações coordenadas de enfrentamento à retirada de direitos da classe trabalhadora, luta por justiça social e ações efetivas de apoio a países ameaçados pelo imperialismo e pelas tentativas de golpe, como a Venezuela, Argentina, Haiti e tantos outros. Outra bandeira foi a de manter a defesa intransigente de Cuba socialista e cada vez mais livre, inclusive de bloqueios comerciais, estratégia do imperialismo considerada pelo povo cubano como o Maior Genocídio da História da Humanidade.

Valéria Salek é jornalista e assessora de comunicação do Sinpro Campinas

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