A reeleição do presidente Hugo Chávez em 7 de outubro é um acontecimento cujo significado histórico transcende em muito as fronteiras da Venezuela. Conforme disse o líder da revolução cubana, Fidel Castro, ali se refletiu nitidamente a “luta de ideias entre o capitalismo e o socialismo”. Na quarta, 10, depois de proclamado presidente eleito pelo Conselho Nacional Eleitoral, Chávez reafirmou o propósito de promover novos avanços no rumo do que denomina “socialismo do século 21”.
A luta ideológica em torno do pleito ganhou notoriedade na grande mídia em todo o mundo. Esta em geral se comportou como um partido único a soldo dos Estados Unidos e outras potências imperialistas, destilando ódio contra o comandante da revolução bolivariana, taxado de ditador e caudilho, e manipulando fatos e pesquisas com o propósito de beneficiar o candidato da oposição, Henrique Capriles, representante da burguesia, dos latifundiários e das multinacionais.
Esta mídia mentiu descaradamente para o mundo até a véspera da eleição, quando ainda conferia credibilidade a pesquisas fajutas que apresentavam Capriles “tecnicamente empatado” com Chávez, pesquisas desmentidas e desmoralizadas pelo resultado do pleito. O líder socialista teve uma vitória folgada e incontestável, com uma diferença maior que 10% (acima de qualquer margem de erro) em relação ao concorrente (55,14% dos votos contra 44,24%), que reconheceu a derrota.
A direita neoliberal mobilizou seu exército midiático em todo o mundo, e também por aqui, contra Chávez, que por seu turno contou com a solidariedade internacional da classe trabalhadora, dos movimentos sociais, governos e forças progressistas, especialmente na América Latina. O presidente venezuelano tem razão quando diz que venceu “uma coalizão internacional”. A contrapartida de sua vitória é obviamente a derrota do imperialismo, do capitalismo em sua versão neoliberal e da mídia venal.
E esta é a principal razão pela qual o resultado do pleito na terra natal de Simon Bolívar, amargo para a Casa Branca e seus lacaios na América Latina, traz alegria ao coração dos representantes dos trabalhadores e das forças progressistas, ao mesmo tempo em que renova a esperança revolucionária daqueles que nunca renunciaram à longa e dura luta contra o capitalismo e o imperialismo.
Não é sem razão que a primeira vitória de Hugo Chávez na Venezuela, nas eleições presidenciais de 1998, é considerada como um marco da mudança do cenário político da América Latina. Os ventos da mudança atravessaram a Amazônia e chegaram ao Brasil (com Lula), soprando também na Argentina (Nestor Kirchner), Bolívia (Evo Morales), Equador (Rafael Correa), Uruguai (Tabaré Vazquez) e contaminando toda a América Latina. Na sequência desses acontecimentos ocorreram a derrota e o solene enterro da Alca (em 2005), a criação da Unasul, da Alba, da Celac, o fortalecimento do Mercosul, o avanço da integração.
O projeto socialista do líder bolivariano, abertamente anticapitalista e antiimperialista, é o mais ousado da região. As medidas adotadas para efetivá-lo possuem um inegável caráter revolucionário. O governo Chávez não ficou só na retórica anticapitalista. Realizou a reforma agrária, promoveu uma legislação trabalhista avançada que garante jornada de 40 horas semanais e impede as demissões imotivadas, organizou milhares de comunas populares, erradicou o analfabetismo, nacionalizou setores estratégicos da economia, estimulou novas formas de organização da produção, fortaleceu o papel do Estado na condução do desenvolvimento e investiu os lucros do petróleo, antes apropriados pelas multinacionais e setores internos da burguesia, no bem-estar social. A nova administração fez com que a Venezuela fosse apontada em recente relatório da ONU como o país com a melhor distribuição de renda da América Latina e Caribe.
Não restam dúvidas de que está em curso uma revolução democrática e popular na Venezuela, que embora deflagrada pelo voto popular não pode ser considerada de todo pacífica. Chávez foi vítima de uma desesperada tentativa de golpe em 2002 e de um ruidoso locaute (greve patronal) em 2002 e 2003, iniciativas reacionárias apoiadas e estimuladas pelos EUA. Depois de derrotar os golpistas, ele acelerou as reformas, mudou o caráter de classes do Estado, colocando-o a serviço do povo, e anunciou o objetivo socialista da revolução que lidera.
Finalmente, cabe ressaltar a participação maciça do eleitorado no pleito. Por lá o voto não é obrigatório, porém mais de 80% dos inscritos foram às urnas, revelando um elevado grau de consciência cívica do povo, profundamente atento ao que estava em jogo. A maioria dos países capitalistas onde o voto é facultativo registra menos de 50% de votantes, o que demonstra a crescente desilusão popular com a corrompida democracia burguesa. Mesmo no Brasil, onde o voto é obrigatório, a justiça eleitoral constatou apenas 75% de votos válidos (excluindo abstenções, nulos e brancos) em 7 de outubro.
A reeleição e os avanços sociais na Venezuela, num contexto histórico em que o sistema capitalista mundial vive quem sabe a maior crise de toda sua história, são fatos alvissareiros que inspiram e alimentam a luta dos povos na América Latina e em todo o mundo pela soberania, democracia e justiça social.
Wagner Gomes é presidente nacional da CTB.