Bolívia: Evo prepara revolução para garantir soberania alimentar

A Bolívia prepara-se para promulgar a Lei da Revolução Produtiva, Comunitária e Agropecuária, numa tentativa de controlar os preços dos bens alimentares no país e acabar com a dependência externa, ao mesmo tempo em que garante a proteção da sua biodiversidade. A legislação já foi aprovada no Senado, na última sexta-feira (17), e aguarda agora apenas uma assinatura do presidente Evo Morales para entrar em vigor.

A sua promulgação ditará a produção nacional de sementes como fator-chave da subsistência dos dez milhões de habitantes do país. “Em anos recentes, assistimos a um aumento dos preços em todo o mundo, devido à subida do preço do petróleo e ao monopólio das sementes exercido por algumas multinacionais. É por isso que queremos criar empresas do Estado que produzam sementes”, explicou Carlos Romero, ministro responsável pelo projeto-lei.

A reforma, que envolve um investimento de US$ 500 milhões, tem sido acolhida com agrado no país. Ciro Kopp, engenheiro agrônomo do Conselho Nacional de Comida e Nutrição da Bolívia, explicou ao “The Guardian” que o país poderá tornar-se auto-suficiente se avançar pelo caminho certo.

“Há 20 ou 25 anos, 70% a 80% do que comíamos era produzido localmente na Bolívia, mas entretanto embarcamos no modelo agro-industrial e agora 70% a 80% do que comemos vem desse modelo, o que nos torna dependentes das tecnologias e do controlo dos preços no estrangeiro. assim, da mesma forma que o sector industrial recebeu apoios do governo no passado, são agora os pequenos agricultores que precisam de ajuda”, sublinha Kopp.

“É essencial reforçar os sistemas de produção, de seleção natural e de troca de sementes que os agricultores têm usado ao longo de séculos. A nossa atenção deve estar centrada, antes de mais, em alimentar o país. Se a nossa prioridade for a exportação, como é que as pessoas vão comer?”, completou.

Prioridade

“Água no campo, comida na cidade”. É esse o slogan que Evo Morales utiliza para defender a nova legislação. Segundo o presidente, a segurança alimentar é uma prioridade do executivo boliviano, sobretudo considerando a crise mundial que se tem vivido nesta área.

Como a maioria dos países, a Bolívia não tem resistido à volatilidade dos preços mundiais. No início deste ano, por exemplo, os preços do açúcar duplicaram no país, conduzindo a protestos dos consumidores e à importação do granulado doce. “Dependemos demasiado da Argentina e do Brasil. Assim, que melhor forma [de contrariar isso] do que produzir as nossas próprias sementes? Se usarmos tecnologia de ponta e tivermos boas colheitas, os preços podem descer e podemos converter a Bolívia num país exportador”, defende Demetrio Peréz, presidente da Anapo, associação de mais de 14 mil produtores de milho, soja e trigo no país.

Contudo, o governo diz não pretender recorrer às tecnologias que as grandes empresas aplicam, como o uso de sementes geneticamente modificadas, para além de garantir a soberania alimentar do país proteger a biodiversidade.

Elisa Panadés, representante da Bolívia na agência da ONU para Agricultura e Alimentação, já sublinhou que o país está no bom caminho. “A Bolívia está a criar condições para fortalecer os pequenos produtores, que estão mais vulneráveis e que são mais afetados pelo isolamento dos locais onde vivem e pelas alterações climáticas”, sublinhou. Com a aplicação desta lei, os agricultores poderão passar a ter mais “acesso a sementes e a fertilizantes” e “a competir de forma justa com os mercados locais, regionais e globais”.

Fonte: I Online

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