Nota pública contra a decisão do ministro Gilmar Mendes de suspender ações em tramitação na Justiça do Trabalho que questionam a chamada “pejotização”

A Associação Nacional dos Procuradores e das Procuradoras do Trabalho (ANPT) divulgou nesta terça-feira (15), nota pública contrária à decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, que suspendeu todas as ações em tramitação na Justiça do Trabalho que questionam contratação de trabalhadores autônomos ou por meio de pejotização.

De acordo com a entidade, há muito alguns ministros do STF se debruçam sobre a legislação trabalhista e sobre a Justiça do Trabalho com um viés desrespeitoso e, quiçá preconceituoso, alimentando a sanha reducionista de direitos sociais e lançando à margem da proteção trabalhista os falsos autônomos, parceiros, pejotizados, plataformizados e demais contratados sob qualquer roupagem de direito civil, ajudando a estigmatizar o empregado celetista, hoje sob a alcunha de “colaborador”.

A nota divulgada hoje destaca também que ao difundir em sua fundamentação que a Justiça do Trabalho reiteradamente descumpre decisões do STF, notadamente aquela firmada na ADPF 324, o ministro desafia dogmas clássicos do direito do trabalho e nega vigência aos arts. 2º, 3º e 9º da CLT, legislação que a todo momento é chamada de retrógrada e anacrônica.

Confira abaixo a íntegra da nota:

NOTA PÚBLICA

SUSPENSÃO DE PROCESSOS NA JUSTIÇA DO TRABALHO – TEMA 1389/STF

A Associação Nacional dos Procuradores e das Procuradoras do Trabalho, entidade que congrega os membros e membras da carreira do Ministério Público do Trabalho, vem a público manifestar sua veemente contrariedade à decisão do Ministro Gilmar Mendes que suspendeu todas as ações em tramitação na Justiça do Trabalho que questionam contratação de trabalhadores autônomos ou por meio de pejotização.

No Recurso Extraordinário com Agravo nº 1.532.603-PR, o Plenário do STF reconheceu, neste mês, a repercussão geral da matéria (Tema 1389), que envolve não apenas a validade desses contratos, mas também a competência da Justiça do Trabalho para julgar casos de suposta fraude e a definição sobre quem deve arcar com o ônus da prova: o trabalhador ou o contratante.

A decisão monocrática de ontem (14/4/2025), contudo, desfigurou a própria razão de ser da Justiça do Trabalho ao lhe negar peremptoriamente a competência consignada pelo inciso I do art. 114 da Constituição da República (Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: I – as ações oriundas da relação de trabalho) e com fundamentos ofensivos ao ramo do Poder Judiciário destacado para ser a arena jurídica de apreciação e debate formal sobre os temas, todos eles, diretos e circundantes, da realidade de contratações de trabalhadores neste país.

A Justiça do Trabalho movimentou, em 2024, 459.941 ações que debatiam reconhecimento ou não de relação de emprego. No MPT, por sua vez, há em tramitação 4.708 inquéritos civis investigando fraude na contratação de trabalhadores. E, mais importante, para destacar o desacerto das ilações desairosas à Justiça do Trabalho lançadas na decisão: a ação trabalhista subjacente à tese de repercussão geral foi julgada improcedente pelo TST.

Há muito alguns Ministros do STF se debruçam sobre a legislação trabalhista e sobre a Justiça do Trabalho com um viés desrespeitoso e, quiçá preconceituoso, alimentando a sanha reducionista de direitos sociais e lançando à margem da proteção trabalhista os falsos autônomos, parceiros, pejotizados, plataformizados e demais contratados sob qualquer roupagem de direito civil, ajudando a estigmatizar o empregado celetista, hoje sob a alcunha de “colaborador”.

A construção linguística é um fator de exercício de poder, de mudança de percepções e ressignificados. Ao difundir em sua fundamentação que a Justiça do Trabalho reiteradamente descumpre decisões do STF, notadamente aquela firmada na ADPF 324, o Ministro Gilmar Mendes desafia dogmas clássicos do direito do trabalho e nega vigência aos arts. 2º, 3º e 9º da CLT, legislação que a todo momento é chamada de retrógrada e anacrônica.

A suspensão de processos, como determinada, ainda restringe o acesso à justiça, pois impede, em qualquer instância, a movimentação de ações em que o vínculo de emprego se apresente como matéria central da controvérsia e cuja declaração dependa de análise fática e da produção de provas de pessoalidade e subordinação.

A ANPT se solidariza com a Justiça do Trabalho e se irmana na luta pela defesa dos direitos sociais e das instituições que agem em sua salvaguarda.

Brasília, 15 de abril de 2025.

Adriana Augusta de Moura Souza

Presidenta da ANPT

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