No Camboja, 200 mil vão às ruas exigir salários mais dignos

Depois dos operários chineses, na primavera, e de Bangladesh, no início do verão, são os trabalhadores do Camboja que se revoltam contra os baixos salários. Na quinta-feira (16), cerca de 200 mil trabalhadores do setor têxtil – mulheres, em sua maioria – suspenderam seu movimento após três dias de greve, em Phnom Penh e no interior. Causa dessa paralisação em massa: o magro reajuste do salário mínimo para os operários da indústria do vestuário e dos calçados, que em julho passou de US$ 50 para US$ 61 por mês (R$104).

Esse fraco aumento, decidido pelo governo e pelos industriais cambojanos, que temem a concorrência dos países vizinhos – Vietnã, Indonésia, Bangladesh – , indignou os sindicatos, que exigem US$ 93 por mês.

O movimento, que se deu de forma tranquila, deveria terminar no sábado, mas os grevistas ameaçaram prorrogá-lo durante um mês caso suas reivindicações não sejam satisfeitas. “Não estamos pedindo um salário mínimo, mas sim um mínimo para viver”, insistem Ath Thorn e Kong Athit, os dois líderes da Confederação Cambojana do Trabalho.

Suas reivindicações refletem as conclusões de um estudo publicado em fevereiro de 2009, em Phnom Penh, por um renomado economista, Kang Chandararot, diretor do Instituto Cambojano do Desenvolvimento. “São as horas extras que permitem aos operários do setor têxtil sobreviverem. Sem elas, os trabalhadores não poderiam ter um nível de vida básico. Sua sobrevivência está estreitamente associada à situação econômica”, explicou Chandararot. Disso concluiu que, para ser viável, o salário mínimo deveria ser elevado para US$ 90.

O Camboja foi duramente atingido pela crise internacional de 2008. As exportações do setor têxtil para os Estados Unidos e União Europeia, principais clientes do reino, caíram 23% em 2009. Mais de 90 fábricas, muitas vezes nas mãos de proprietários chineses ou taiwaneses, fecharam suas portas, deixando desempregados cerca de 60 mil operários (dos 345 mil desse setor). Apesar de os seis primeiros meses de 2010 terem mostrado sinais de recuperação (+7% nas exportações), ainda estão distantes do nível de três anos atrás. As horas extras, acima de tudo, não foram restabelecidas. Isso explica a participação maciça no movimento de greve dos últimos dias.

Em junho, Bangladesh foi sacudida por uma revolta similar, com os operários do setor têxtil rejeitando os 32 euros de salário mensal que lhe foram concedidos (contra os 19 euros de até então). Um pouco antes, na China, foram os funcionários da Foxconn e da Honda que se revoltaram, desencadeando um movimento que só pararia com aumentos salariais de 30% a 60%.

“Pressão geral”

“Não se pode falar em contágio de um país para outro. No fim de 2007, já havia reivindicações salariais no Camboja. Se elas estão sendo retomadas hoje, após dois anos de calma relativa, é porque o pior da crise já passou, e as exportações foram retomadas”, ressalta Jean-Raphaël Chaponnière, economista da Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD).

Uma opinião partilhada por François-Marie Grau, secretário-geral da Federação do Prêt-à-porter Feminino, em Paris. “O que está acontecendo no Camboja é sintomático de uma pressão geral por um aumento nos preços de fabricação em toda a Ásia. Como essa zona está tendo um forte crescimento, os operários fazem pressão sobre seus empregadores”, observa. Para ele, o consumidor francês ou europeu não sofrerá de falta de estoque. Em compensação, ele deve esperar por um aumento nos preços do vestuário. Ainda mais que o movimento de protestos observado na China, em Bangladesh e agora no Camboja, tem algumas chances de se estender para outros países asiáticos, observa Grau.

Fonte: Le Monde

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