Sob a ótica do Motoboy

© Fernando Frazão/Agência Brasil.

Por: Douglas Benites – Delegado sindical sindimoto-RS

Vou esclarecer para vocês a minha ótica de motoboy, traduzindo uma análise complexa da situação, conforme a realidade da trajetória em busca de direitos e proteção aos trabalhadores e trabalhadoras. Na atualidade, é uma questão de constitucionalidade e não ideológica. Nesse quesito, a base está às margens da informação e ela é condicionada pela marginalização das ideias. Criminalizada, informalizada, na ilegalidade, na condição plataformizada.

Sendo assim, o trabalhador da base enfrentará dificuldades para compreender o que é ideologia como dispositivo ou instrumento de dominação entre uma classe social e outras. Centralizando que a proteção do trabalhador é uma questão constitucional, vale explicar para vocês o vínculo de emprego no mundo do trabalho atual, contemporâneo, plataformizado ou não.

E é claro que a questão de vínculo de emprego antecede a discussão que nós estamos, em relação ao reajuste da taxa de entrega, e essa tática de querer criar uma nova categoria não pode acontecer para nós, ciclistas e motociclistas profissionais. Tem a lei que regulamenta a nossa atividade, que é a Lei 12.009/09, existe sindicato que nos representa, existe federação, existe legislação, existe convenção coletiva. É só enquadrar as empresas na legislação sem medo de ser feliz, porque o governo federal arbitrar em relação ao enquadramento, o reflexo disso será para quem quer ser autônomo, vai fazer o MEI e será autônomo. Quem trabalhar nessas condições a seguir, que configuram o vínculo de emprego, terá a proteção da legislação vigente.

Primeiro, a onerosidade, que é um dos elementos do vínculo de emprego, está configurada no pagamento do cliente ou usuário das empresas por plataformas. A transição do dinheiro vai para a conta da empresa por aplicativo e depois a empresa repassa ao trabalhador e trabalhadora. Segundo é a subordinação. A subordinação é configurada hoje pelos intelectuais, sociólogos e advogados trabalhistas, como subordinação jurídica de forma algorítmica. A notificação e o som do comando da empresa por aplicativo é uma ordem direta para ir ao ponto A coletar, para entregar no ponto B, há uma organização e reprodução da vontade do Patrão/Chefe.

O terceiro elemento, a habitualidade, hoje o trabalhador, conforme a sua necessidade individual e familiar, precisa estar à disposição da empresa por mais de três dias ou noites por semana, justificando que o DIEESE traz para nós que o salário mínimo deveria ser de 7.229,00 em 2025. Então, se o entregador da empresa de plataforma sustenta sua família ou não, terá que trabalhar mais de três vezes por semana, configurando o vínculo de emprego na atualidade. Quarto elemento, a pessoalidade. É a questão de o trabalhador não poder mandar um parente trabalhar no seu lugar, porque é feito um cadastro, do documento com as informações do entregador/motoboy e da ferramenta de trabalho, bicicleta ou motocicleta. Toda vez que logar e ficar na condição online, à disposição da empresa, tem que fazer um reconhecimento facial, configurando assim a pessoalidade.

Toda essa discussão é importante para a nossa categoria e para o futuro da classe trabalhadora. Os laboratórios do capitalismo utilizam a nossa categoria como experimento para saber o que a classe trabalhadora suporta ou não suporta e o que está atenta em relação à exploração da mão de obra, da nossa força de trabalho que é precarizada ou para submeter no grau mais elevado do neoliberalismo. O acordo dos motoboys e entregadores não avançou no Ministério do Trabalho como o tal acordo polêmico dos motoristas avançou. O acordo regulamentava 90 horas semanais para os motoristas de aplicativo, de carro. Como que nós, os trabalhadores e trabalhadoras que lutamos pela redução da jornada de trabalho, uma jornada de 40 horas semanais, não poderíamos aceitar este retrocesso? O acordo que avançou foi dos motoristas e não o nosso.

O governo Lula não desistiu porque teve receio da sua popularidade em relação às informações distorcidas pela sociedade. Os trabalhadores falaram que não queriam ser CLT, e isso ficou evidente. Não foi por causa disso que o governo desistiu de fazer a regulamentação. O governo não quis enquadrar as empresas de aplicativo na legislação trabalhista vigente, não quis considerar as convenções coletivas dos sindicatos de empregados na mesa de negociação. Quando essas empresas vieram para o Brasil, usaram nossos acordos coletivos vigentes como parâmetro para remunerar e garantir a evolução do mundo do trabalho, criando um amplo laboratório do capital x trabalho no Brasil.

Concluindo e direcionando ao manifesto do dia 31 de março de 2025, o SindimotoRS provocou na base local, Vale dos Sinos, Região Metropolitana, Grande Porto Alegre e Capital. Essa discussão de reajuste da taxa mínima de entrega, levando à consciência de classe aos trabalhadores e trabalhadoras, orientando o movimento grevista e dirigindo a primeira motociata de trabalhadoras e trabalhadores. Não adianta simplesmente protestar. A representação institucional tem que formalizar junto aos atores competentes que vão fazer essa regulação da nossa relação de trabalho atual. Buscamos esse diálogo entre empresa e trabalhador, entre capital x trabalho, no modelo das mediações no Tribunal Regional do Trabalho da Quarta Região. As empresas adiaram para o dia 23/04/2025. Estaremos mobilizados e aproveito aqui para a convocação da classe trabalhadora em solidariedade e para estarem atentos juntos em relação aos avanços tecnológicos que geram impactos no mundo do trabalho.

Um comentário

  • Conheço o Douglas e afirmo que se trata de um camarada fora do comum, essa organização e engajamento que ele consegue certamente tratará resultado aos motoboys e por consequencia a toda classe trabalhadora.

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