Ricardo Garcia, autor do livro “Mais Fina Das Artes”, oferece uma visão profunda sobre as complexidades e desafios enfrentados pelo movimento sindical brasileiro. A narrativa gira em torno de Itamar, um jovem sindicalista, cuja vida é virada de cabeça para baixo quando é acusado injustamente de um crime durante uma greve que liderava. Enquanto ele enfrenta a prisão, o sindicato patronal tenta forçar um acordo coletivo diferente, aproveitando-se de sua ausência.
Entrevistamos Ricardo Garcia para entender melhor suas motivações e o desenvolvimento dos personagens centrais, Itamar e Joel, bem como para explorar as dinâmicas e desafios do sindicalismo apresentados em seu livro. Confira!
1. Qual foi a sua inspiração para escrever este livro sobre o sindicalismo? Você teve alguma experiência pessoal ou profissional que o motivou a abordar esse tema?
Sou filho, sobrinho e neto de operários da indústria têxtil e metalúrgica, e tenho contato, desde a infância, sob diversas formas, com sindicatos e sindicalistas, inclusive nos papéis de ativista, dirigente e empregado ou assessor jurídico de sindicatos de algumas categorias profissionais.
Assim, aprendi a realidade da vida da classe operária e de sua organização e lutas sindicais e políticas. Escrever sobre a esse tema é natural para mim, não me vejo escrevendo sobre outras coisas.
2. Como você desenvolveu os personagens de Itamar e Joel? Eles foram baseados em lideranças sindicais que você conheceu ou observou? Quais foram os principais desafios em retratar esse conflito entre eles?
São personagens fictícios, não foram baseados em ninguém especificamente, mas é evidente que as histórias que vivi ou presenciei me deram a matéria prima para construí-los. E eles são simbólicos, já que representam posturas antagonicas no movimento sindical. Enquanto um deles tem como referencial a sua própria classe o outro ambiciona o poder, disso derivando as alianças que estabelecem no movimento sindical. Foram trabalhados com essa visão e a maior dificuldade é sempre construir um personagem completo, com todas as contradições, emoções, inseguranças e visões de mundo diferentes.
3. Quais aspectos você considera mais importantes para os leitores entenderem sobre a luta dos trabalhadores e a dinâmica dos sindicatos?
Em primeiro lugar, meu objetivo é retratar o sindicato em luta, pois para isso ele foi criado. Também mostrar que a categoria é a dirigente do sindicato, está acima das diretorias e, por isso, o interesse a ser defendido pelo sindicato tem que ser sempre o da categoria. Há uma relação orgânica e indissociável entre a categoria e seu sindicato, porque o sindicato é a categoria politicamente organizada. Por isso, não há nem pode haver interesse individual legítimo que se sobreponha às decisões da categoria, expressas pela assembleia e executadas pela diretoria. Nem a diretoria pode fugir à decisão coletiva, concorde com ela ou não, porque o momento de discutir as ideias e divergências se encerra com a decisão, democraticamente votada. A partir daí, todos e cada um têm a obrigação de cumprir essa decisão.
5. Como você avalia o papel da oposição sindical, representada pelo personagem Joel, neste conflito? Você acredita que esse tipo de disputa interna enfraquece ou fortalece o movimento sindical de uma maneira geral?
A divergência de visões políticas é da natureza humana, pois cada indivíduo tem uma história de vida, uma cultura, uma formação política e ideológica que constróem visões diferentes de mundo. Essa é a base para o surgimento de oposições sindicais, que veiculam o conflito político, a própria luta de classes se desenrolando no seio da categoria.
A disputa entre essas posições é inevitável, portanto, é não há como suprimi-las a não ser com atitudes e medidas autoritárias. Suprimir as diferenças, aliás, é uma proposta clássica do fascismo, que não admite a existência de nenhuma outra ideia fora de seu ideário. Essas divergências tem que ser tratada com democracia, com disputa política leal, baseada no confronto livre de ideias. Quanto mais livre e mais transparente esse debate ocorrer, melhor para a categoria e, portanto, para o sindicato.
Na história, Joel simboliza um determinado tipo de oposição, diferente do que Itamar, Genésio e Aurélio simbolizaram quando se opuseram a Cláudio e acabaram vencendo o antigo dirigente. Joel joga um papel muito caro a Heinz, e a relação que entre se estabelece, de mútua manipulação, revela a natureza política de seu movimento.
6. Qual mensagem você deixa para a CTB e para os trabalhadores?
Vejo a CTB como um instrumento de luta que não se fossilizou nem se atrelou a governos, o que aconteceu com muitas entidades e dirigentes, a maioria bem intencionados. Mas nada garante que será sempre assim. Somente se os trabalhadores estiverem dentro da entidade e das entidades que a compõem a dinâmica de suas vidas e anseios poderá estar ali representada, e a CTB continuará legítima. O enraizamento dela nas lutas diárias do chão de fábrica, na disputa política e ideológica do dia a dia, é a única forma de manter viva essa unidade e capacidade de organização e de mobilização.
O livro pode ser encontrando nas seguintes livrarias:
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