Sergio Massa foi o grande vencedor do primeiro turno das eleições argentinas, neste domingo (22). Com 97,4% das urnas apuradas, o candidato do União Pela Pátria conquistou 36,61% dos votos à presidente.
Por Guilherme Ribeiro/Diálogos do Sul
Atrás dele, Javier Milei, do A Liberdade Avança, terminou com aproximadamente 30%, e Patricia Bullrich, à frente do Juntos pela Mudança, com quase 24% das cédulas. O segundo turno acontece em 19 de novembro entre Massa e Milei.
“Hoje nossa democracia sai mais forte e robusta”, bradou Massa em seu primeiro discurso de vitória, logo após um amplo agradecimento a eleitores e profissionais eleitorais. Especialmente às forças políticas que foram parte da jornada democrática, afirmou: “Não tenham dúvida, a força, a vontade e o compromisso que encontrei em cada um de vocês deu a energia que nos fez crescer”.
Atual ministro da Economia de Alberto Fernández, ele reconheceu a situação complexa vivida pelo país, hoje cheia de desafios para enfrentar. Mas garantiu: “Temos a melhor ferramenta para construir uma nova etapa para a história política da Argentina”.
Interrompido algumas vezes pela euforia do público, o candidato se comprometeu a dispensar acordos partidários e escolher os melhores e mais preparados para iniciar uma nova etapa institucional: “É importante estabelecer os pilares da política de Estado. Vamos convocar um governo de unidade nacional para construir uma indústria argentina forte”, destacou, advogando ainda pela valorização dos recursos naturais da nação.
Mais e melhor educação pública, gratuita e de qualidade também foram pontos defendidos por Massa, assim como a construção de um regime trabalhista moderno, que abrace a tecnologia, a capacitação, mas sem renunciar aos direitos conquistados pelos trabalhadores argentinos.
“Vou ser o presidente do trabalho e da segurança, acima de todas as coisas. […] A Argentina precisa de alguém que compartilhe com os argentinos o sonho de construir uma pátria grande, com um regime de melhor distribuição de renda e um regime simplificado e progressivo de impostos”, garantiu.
Democracia e diplomacia
Em meio à onda de intolerância que ameaça a democracia argentina, Massa afirmou que opta por não insultar seus adversários, e que acredita no diálogo e nos consensos: “Que tenhamos a capacidade de colocar um ponto final à ideia de destruição do outro”, convocou. “Esse não é um ‘país de merda’, é um grande país”, acrescentou, em referência a Milei.
Ele revelou ter recebido ligações de presidentes e líderes de outros países ao longo deste domingo, sobretudo após os resultados da eleição: “Sabem que queremos uma Argentina integrada, que acreditamos no multilateralismo, que garantimos estabilidade e segurança nas relações com o mundo”, assinalou.
Em diferentes pontos do discurso, Massa lembrou que a disputa não está ganha, e que ao longo das próximas semanas, até 19 de novembro, vai se dedicar a dialogar com cada eleitora e eleitor em potencial: “Temos que definir se construímos um país que abrace a todos ou do ‘salva-se quem puder’. Vou abraçar a cada argentino e argentina, não importa como pense, sua religião ou condição social”, asseverou.
Resultado surpreende
O resultado deste domingo é surpreendente e fruto da forte mobilização do campo progressista na Argentina, que apesar do susto das PASO, as eleições primárias do país, se reergueu para conquistar voto a voto e fazer Massa crescer.
No pleito de então, realizado em agosto, a chapa A Liberdade Avança, de Javier Milei, saiu vitoriosa com quase 30%, seguida do Juntos pela Mudança, de Bullrich, com aproximadamente 28%, e pelo União Pela Pátria, de Massa, com cerca de 27,3% das cédulas.
Em entrevista à TV Fórum nesta quinta-feira (19), a jornalista Vanessa Martina-Silva avaliou que o êxito do progressismo neste domingo era difícil, mas possível, e daria um impulso muito importante à esquerda para o segundo turno.
A questão, agora, é entender como os votos dos candidatos fora da disputa vão se distribuir. “Se tirarmos toda a excentricidade do Milei, todos os absurdos e falas de extrema-direita, o discurso é quase o mesmo”, aponta Martina-Silva sobre Bullrich. “O eleitor não vai ver muita diferença”, acrescenta.
Milei x história argentina
Javier Milei ascendeu na Argentina aos moldes de Jair Bolsonaro no Brasil, um perfil outsider, que se oferece como opção contrária à classe política de sempre, preparado para erguer a economia – com propostas ultraliberais, de Estado zero – e combater a corrupção.
Outra estratégia foi minimizar – e até mesmo exaltar – a ditadura que atingiu o país de 1976 a 1983, mesmo na Argentina, cuja história é marcada pela defesa dos direitos humanos e punição de militares que cometeram crimes no regime.
Os discursos de Milei agradaram uma significativa parcela de jovens que não viram de perto a era da repressão e não reconhecem o processo de luta pelos direitos existentes hoje no país.
Já a grande mídia argentina, assim como no Brasil, também aderiu ao candidato neofascista como forma de barrar o progressismo e instalar no poder um representante do neoliberalismo, observou o jornalista Felipe Bianchi na quinta-feira (19), em entrevista ao Canal DCM.
Ele lembra que em 2018, os veículos hegemônicos, apesar de se mostrarem críticos aos discursos fascistas de Bolsonaro, apoiavam o agenda econômica de Paulo Guedes: “A gente vê o que viu no Brasil, que é a naturalização desse tipo de político”, diz Bianchi.
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