Excitados pela instalação da chamada CPI do MST na Câmara Federal, os latifundiários brasileiros estão intensificando a ofensiva contra o Movimento dos Sem Terra, cujo objetivo é criminalizar a luta pela reforma agrária. Incitam à violência contra os trabalhadores e trabalhadoras rurais e recorrem às Fake News e à histeria, como fica evidente nesta reportagem da jornalista Gabriela Moncau, para o Brasil de Fato, sobre as faixas penduradas na 51ª Exposição Agropecuária organizada pelo Sindicato Rural de Itapetinga, na Bahia. Leia a íntegra abaixo:
O Sindicato dos Produtores Rurais de Itapetinga, organizador da 51ª Exposição Agropecuária do município baiano, que aconteceu entre os últimos dias 12 e 21 de maio, pendurou faixas contra o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em todo o evento. “O MST espalha terror, o produtor espalha sementes”; “O MST cultiva destruição”, “Você pode até não saber, mas mais cedo ou mais tarde, as invasões de terra também vão atingir você”, estampavam alguns dos banners.
Em resposta, a direção nacional do MST soltou uma nota em que repudia o que considera conteúdo “discriminatório” que “incita a violência contra trabalhadores do campo, na tentativa vil de deslegitimar a luta do Movimento Sem Terra”.
Em todas as faixas estavam o logo do Sindicato Rural de Itapetinga e outro com o nome “Invasão zero”, um grupo criado por fazendeiros da Bahia contra as ações do MST durante o mês de abril, período em que acontece a já tradicional jornada de lutas dos sem-terra em memória ao Massacre de Eldorado do Carajás.
Sob esse mote, ruralistas vêm se organizando para buscar impedir, com carreatas de caminhonetes e as próprias mãos, que movimentos populares ocupem áreas para reivindicar a reforma agrária. A principal figura pública do “Invasão Zero” é o fazendeiro e político de Ilhéus, Luiz Uaquim (MDB).
Itapetinga e o grupo “Invasão Zero”
Segundo uma planilha divulgada pela CNN, 800 fazendeiros distribuídos em 130 cidades baianas integram o grupo, que teria sete células principais, em sete municípios. Ao lado de Itabuna, Ipaú, Eunápolis, Santo Antônio de Jesus e Vale do Jiquiriçá, estaria Itapetinga.
“O que está acontecendo é uma reorganização dos latifundiários numa perspectiva de defender a propriedade em detrimento da lei e da vida”, definiu Lucineia Durães, da direção do MST, em entrevista recente ao Brasil de Fato.
A 51ª Exposição Agropecuária, além de ser organizada pelo Sindicato Rural de Itapetinga, presidido pelo empresário Eder Ferreira Rezende, teve apoio da prefeitura, dos governos estadual e federal, da Federação da Agricultura e Pecuária da Bahia (FAEB), entre outros órgãos.
Rodrigo Hagge (MDB), prefeito de Itapetinga que se tornou réu em um processo que o acusa de irregularidades em licitações para o serviço de coleta de lixo, participou da abertura do evento. Com rodeios, shows e estandes de comércio, o evento recebeu cerca de 60 mil pessoas, segundo os organizadores.
O MST, em nota, diz repudiar e denunciar “a utilização de recursos públicos em eventos cujo objetivo e práticas são a incitação à violência, utilização dos artifícios de fake news e discriminação”.
O Brasil de Fato tentou contato com a prefeitura de Itapetinga por meio do telefone divulgado no site – que não existe -, assim como pelo e-mail institucional, que só poderia ser acessado em uma página que não abre. Caso a administração municipal queira se manifestar, o espaço segue aberto.
Latifúndio e trabalho escravo no sudoeste baiano
“O agronegócio e os latifundiários buscam como estratégia deslegitimar as organizações sociais do campo que lutam pela reforma agrária, atacam para fazer uma cortina de fumaça e assim omitir as reais mazelas da região”, argumenta o MST a respeito da atuação da categoria no sudoeste baiano, elencando “o crescente desmatamento causado pelos latifúndios para criação de gados, grilagem de terra, violência no campo, uso de mão de obra análoga à escravidão, destruição e contaminação dos bens naturais pelo uso de agrotóxicos utilizados nas lavouras e na agropecuária”.
Em abril de 2022, em Vitória da Conquista (BA), uma mulher de 52 anos foi resgatada depois de 40 anos trabalhando em condições análogas à escravidão na casa de uma família. Quatro meses depois, uma operação do Ministério Público do Trabalho da Bahia resgatou outras 20 pessoas nas mesmas condições em uma fazenda de café do ruralista Alberto Juramar Andrade, em Barra de Choça, outra cidade da região.
Também no ano passado em um município próximo, Ribeirão do Largo (BA), o fazendeiro Gilvandro Fróes Marques Lobo foi condenado a pagar R$ 420 mil de indenização para 18 trabalhadores. Eles foram submetidos à escravidão contemporânea na limpeza de área de pasto para criação de gado.
Itapetinga e a região no seu entorno, destaca Isaías Nascimento, da coordenação do MST, “é das que mais têm conflito por terra e onde são encontradas pessoas em trabalho escravo na Bahia. E nenhuma dessas fazendas pertence ao MST. Pertencem ao setor da agropecuária.”