Por Marcos Aurélio Ruy (Foto: Mario Vilela/Funai)
“Minha luta hoje é defender a vida, a floresta, e também meu povo indígena para que não haja ameaças e violências, porque meu povo precisa crescer. Muitos povos desapareceram como indígenas. Então, os que estão aqui hoje, eu defenderei até meu último momento. Assim que é minha luta”, disse o cacique Raoni, de 93 anos, ao Ecoa UOL.
Assim, ele resume a vida dos 305 povos indígenas existentes no Brasil, que falam 274 idiomas diferentes, como mostra a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Por isso é fundamental destacar a importância do 19 de abril, como Dia dos Povos Indígenas.
Desde junho do ano passado, o que era Dia do Índio virou Dia dos Povos Indígenas, com a aprovação da Lei 14.402, em 8 de julho de 2022, no Senado, vetada pelo ex-presidente e com a derrubada do veto, transformada em lei.
Isso porque o termo “índio” remete aos colonizadores portugueses e soa pejorativo, como se esses povos fossem inferiores. A mudança ocorre justamente para tirar essa carga pejorativa aos povos indígenas que habitam o Brasil.
A situação dos povos indígenas se agravou muito nos últimos quatro anos com a omissão da Funai sobre suas vidas. Como mostra o relatório Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil 2021, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi). De acordo com esse relatório ocorreram 305 “invasões possessórias, exploração ilegal de recursos e danos ao patrimônio”, em 2021 em ao menos 226 terras indígenas, em 22 estados, num total de 1.294 violências contra o patrimônio desses povos. Em 2020 foram 263 invasões em 201 terras em 19 estados. E em 2018, 109 invasões desse tipo.
Além de atacarem o patrimônio desses povos, também foram assassinados 176 indígenas, mais 12 tentativas de assassinatos, 14 casos de violência sexual, 21 de racismos e discriminação étnico cultural, num total de 355 casos de violência contra pessoas indígenas em 2021.
Por isso, os povos originários lutam incessantemente pela demarcação de suas terras. Aliás, permanece no Supremo Tribunal Federal (STF), o tema sobre o marco regulatório, que tente impor esse direito somente às terras ocupadas fisicamente por eles antes da promulgação da Constituição, ocorrida em 5 de outubro de 1988.
Acontece que muitos desses povos foram expulsos de suas terras e agora a reivindicam. Segundo o Cimi, o Brasil conta com 1.296 terras indígenas. Sendo 401 demarcadas, 306 em processo de demarcação e 530 sem nenhuma providência tomada pelo Estado. Com isso, crescem os conflitos e os ataques de latifundiários aos indígenas.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) anunciou dados preliminares do censo demográfico de 2022 apontando para a existência de 1.652.876 indígenas no país. Raoni segue afirmando que “é dever cuidar um do outro para podermos estar juntos aqui. Para proteger nós e a floresta, nós devemos estar juntos, falarmos juntos, escrevermos juntos para todo mundo ver. Isso vai viabilizar para que outros somem à nossa luta”
Como diz Ava Rendy, liderança que prefere se identificar pelo nome Kaiowá, “temos uma reivindicação em relação a tradição de nossa terra, um lugar pra viver e poder ser feliz, e todos agem contra nosso povo como se a empresa tivesse mais direito que nós”. Porque mineradoras, garimpeiros, madeireiras e fazendeiros exploram as terras indígenas, prejudicando suas vidas.
Michael Fakhri, Relator Especial sobre Direito à Alimentação da Organização das Nações Unidas (ONU), afirma que “há uma forte conexão entre extrativismo global, mudança climática e crescentes desigualdades, com reflexos no direito à alimentação” e “essa conexão não poderia ser mais clara no Brasil, especificamente no território Yanomami, onde anos de invasões de garimpeiros ilegais, somados ao desmantelamento da proteção e estruturas de saúde por parte do governo anterior, têm gerado uma crise humanitária”, emenda Fédora Bernard, diretora jurídica da Right Livelihood Award Foundation.
Por isso, “abraçar a causa indígena, como fez o presidente Lula com a criação do Ministério dos Povos Indígenas, é importante para o Estado brasileiro adotar uma nova visão sobre a questão ambiental e os direitos dos povos originários”, diz Thaisa Daiane Silva, secretária-geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag) e dirigente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB).
“A começar pela demarcação já de suas terras, muito ameaçadas nos últimos anos de total descaso do Estado” porque “celebrar a vida dos povos indígenas significa respeitar a humanidade”.