A classe trabalhadora francesa dá mais uma demonstração de força, unidade e determinação na defesa dos seus direitos com uma greve geral que paralisa escolas, transporte público, aeroportos, centrais de energia, refinaria e diferentes setores e ramos da economia nesta terça-feira (31). O movimento tem por alvo a reforma da Previdência do governo Macron, que aumenta de 62 para 64 anos a idade mínima da aposentadoria e para 43 anos o tempo mínimo de contribuição para garantir o direito ao valor integral do benefício.
O projeto foi encaminhado pelo presidente ao Parlamento, onde sua tramitação avança. Foi a segunda greve nacional desencadeada pelos assalariados franceses com o objetivo de impedir sua aprovação. A primeira ocorreu em 19 de janeiro.
Em outubro de 2022 também foi realizada uma paralisação de âmbito nacional no país, em que trabalhadores e trabalhadoras reivindicaram aumento dos salários para fazer frente à inflação, agravada na Europa pelos desdobramentos econômicos do conflito militar entre Ucrânia e Rússia.
A reforma proposta por Emmanuel Macron é parte do amargo cardápio neoliberal defendido pela direita francesa. É parente ideológica da reforma das aposentadorias originária do golpe de 2016, aprovada durante o governo fascista de Jair Bolsonaro, embora pareça um pouco menos nociva para os trabalhadores.
No Brasil foi instituída a idade mínima de 65 anos para aposentadoria urbana dos homens (62 anos, no caso das mulheres) e abolida a aposentadoria por tempo de contribuição. Foram impostos, adicionalmente, retrocessos na forma de cálculo do valor dos benefícios e o aumento progressivo do tempo mínimo de contribuição.
A reação dos sindicatos, enfraquecidos pelo fim da Contribuição Sindical, e da classe trabalhadora, submetida a uma campanha midiática e governamental avassaladora pró-reforma, não foi suficiente para impedir o retrocesso. Os neoliberais justificam as mudanças alegando a necessidade de alcançar o equilíbrio fiscal e combater o desemprego, mas os resultados concretos das mudanças são bem diferentes das promessas de seus promotores.
Paralisação geral
Escolas, o transporte público, aeroportos, centrais de energia, o serviço público, refinarias: muitos setores estão interrompidos ou bloqueados na França nesta terça-feira, no segundo dia de paralisações contra a proposta de reforma da Previdência apresentada pelo governo de Emmanuel Macron. O primeiro foi em 19 de janeiro.
Tal como há 12 dias, pela manhã os protestos concentraram-se nas cidades pequenas e médias, com a tarde reservada para a marcha de Paris tendo início às 14h locais (10h em Brasília) e duração prevista para até 19h, indo da Place de l’Italia à Place Vauban, via Montparnasse.
Segundo uma fonte da polícia citada pelo jornal Libération, são esperadas hoje entre 70 mil e 100 mil pessoas na capital, 20 mil a mais do que a expectativa do dia anterior de mobilização. Estima-se que haja entre estes de 1 mil a 2 mil manifestantes dos coletes amarelos, que protagonizaram grandes atos de protesto contra o neoliberalismo francês.
O número de policiais também vai aumentar: 4 mil deles irão supervisionar o protesto parisiense, contra 3.500 anteriormente. Nacionalmente, são 11 mil agentes trabalhando. O Ministério do Interior manifestou o desejo de que os protestos transcorram “nas mesmas condições, sem incidentes graves” do dia anterior.
Retrocessos
A proposta de reforma é ampla, mas há duas cláusulas principais às quais os manifestantes se opõem: o aumento para 64 anos como idade mínima para a aposentadoria, em comparação aos atuais 62, e a exigência de 43 anos de contribuições para se ter direito a uma pensão completa. Ambas reduzem direitos e prejudicam os assalariados, que não estão dispostos a continuar pagando a conta da crise.
Mais cedo, centenas de milhares marcharam em centenas de cidades, de Toulouse, Marselha e Nice, no Sul, a Saint Nazaire, Nantes e Rennes, no Oeste.
A greve tem grande adesão no setor de transportes, com o tráfego de metrô e dos trens regionais RER “fortemente perturbado” na região de Paris. Na rede ferroviária, os trens viajam aos poucos, e estima-se, a depender da linha, que a circulação tenha caído a até 25% de seu índice normal.
Professores e petroleiros
Na educação, a mobilização é considerada menor do que no primeiro protesto. Em creches e escolas primárias, um em cada dois professores está em greve, de acordo com o sindicato Snuipp-FSU, índice abaixo dos 70% de grevistas anunciados anteriormente. No Ensino Médio, anunciam “55% dos grevistas”. Como um todo, o Ministério da Educação contabiliza 25,92% de professores em greve, contra 38,5% em 19 de janeiro.
Já o setor petrolífero mobiliza-se em peso. As principais refinarias e depósitos de combustíveis estão com entre 75% a 100% dos funcionários mobilizados, segundo a central sindicatal CGT.
O povo condena reforma e apoia grevistas
Segundo pesquisas, cerca de 70% da população francesa se opõem à proposta de reforma de Macron, embora a maioria da população entenda ser necessário alterar as regras de Previdência, um tema notoriamente espinhoso na França..
Este é o quinto ciclo de greves contra mudanças na Previdência na França nos últimos 30 anos, e a primeira vez em mais de 12 anos que as oito maiores centrais sindicais francesas aderem juntas a uma greve.
Em 2003 e 2010, as mobilizações não conseguiram impedir as reformas. Em 1995, ano citado como referência para os manifestantes, o primeiro-ministro conservador Alain Juppé abandonou a proposta face à resistência. O último ciclo foi em 2019, quando o presidente já era Macron, e a pandemia acabou por adiar seus planos de mexer na aposentadoria.
Enquanto ocorrem os protestos, a análise do texto transcorre numa comissão parlamentar. Após sete horas de discussões na Comissão de Assuntos Sociais, o primeiro artigo sobre o desaparecimento da maioria dos regimes especiais foi validado na segunda-feira. A maioria deles, incluindo os das indústrias de eletricidade e gás e do Banco da França, serão extintos, prevê o projeto.
Nesta terça-feira, começa a análise do artigo 2. Faltam duas discussões em comissão antes que o texto seja apresentado no plenário, na próxima segunda-feira, 6 de fevereiro. Lá, estão previstas duas semanas de debate.
Da Redação, com informações do Globo
Foto: Frederick Florin/AFP