Em virtude da tragédia que ocorreu na cidade de Petrópolis após as chuvas da última terça-feira (15), a CTB Rio de Janeiro se mobilizou por doações para ajudar o povo petropolitano a superar esse momento difícil. Desde cedo, a CTB-RJ orientou que suas entidades filiadas e sua base social se mobilizem por doações para a cidade serrana. A sede da CTB-RJ, localizada na Rua André Cavalcanti, 33 – 6º Andar, é um dos pontos de coleta de doações. A Central também recebe doações em espécie por intermédio da sua conta e vários sindicatos filiados já se colocaram também como postos de coleta.
Na região serrana, os cetebistas também se organizam por ajudas para o povo de Petrópolis. Liderados pela Coordenadora Geral da CTB-RJ na Região Serrana, a Professora Lívia Miranda, e pelo também professor, Daniel Iliescu, os cetebistas – ambos de Petrópolis – recolhem doações e organizam a ação daqueles que se disponibilizam para ajudar as vítimas da tragédia.
Mas para além do Luto, e da Luta, a CTB-RJ enxerga questões que precisam ser pontuadas nesse momento. Com exclusividade ao Portal CTB-RJ, o Presidente da Central Sindical Classista no Rio de Janeiro, Paulo Sérgio Farias, comentou sobre a situação do município:
“Os discursos das elites e de muitos governantes é que “a ocupação desordenada” é a responsável pelas tragédias que a cada ano acontecem em muitas cidades brasileiras. Aqui no Rio de Janeiro não é diferente. O discurso é o mesmo, e se repetem os velhos chavões que é preciso fazer obras de contenção, remover os moradores das áreas de riscos, etc. O fato é que a classe trabalhadora é quem paga, com a vida e com perdas materiais, a exclusão do pobre do orçamento público. O governo Bolsonaro, em 2021, cortou mais de 98% dos recursos destinados ao Fundo de Arrendamento Residencial (FAR), que financia as obras da faixa 1 do antigo Minha Casa Minha Vida. O Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab), aprovado em 2007, previa para 2033 a universalização dos serviços de água e esgoto. No ritmo atual de investimentos, entretanto, esse prazo foi esticado para 2060. O desemprego e a carestia empobrecem mais ainda a população e a favelas aumentam a cada ano. Não há saída com esse modelo de desenvolvimento. Para que sejam criadas condições de salvar vidas, temos que colocar o povo no orçamento para valer. É preciso que a urbanização das favelas, investimentos maciços em saneamento e construções de moradia sejam opções e decisões de políticas governamentais, senão vai ser mais do mesmo e todo ano vamos contar mortos e prejuízos materiais.”- afirmou o Presidente da CTB-RJ.
Uma tragédia que se repete
O que diz o Presidente da CTB-RJ em sua fala encontra eco ao analisarmos os fatos como eles são. Mais uma vez, como acontece em praticamente todo verão, uma cidade fluminense é vítima de fortes chuvas que ceifam vidas, geram uma multidão de desalojados e abre debates sobre questões de habitação, saneamento e o papel do poder público. Ontem (15), a cidade vítima foi Petrópolis, que soma, até o momento da elaboração desse texto, mais de 104 mortos e centenas de desalojados.
O argumento de sempre, dessa vez, é contestado até pela grande mídia. “Choveu em um dia mais do que o esperado para o mês inteiro” tem sido repetido ano a ano para justificar enchentes e tragédias socioambientais. Esse ano, esse mesmo argumento já foi usado para desastres em Minas e na Bahia, assim com foi usado ano passado e nos anos anteriores para justificar outras tragédias. Também já está presente o discurso, citado pelo Presidente Paulo Sérgio, sobre pessoas que moram em áreas de risco, como se elas estivessem escolhido morar lá.
A realidade é que desde a abolição da escravatura, em 1888, somente em poucos períodos da História do Brasil, o Estado se ocupou de dar moradia digna às pessoas. Lembremos que os negros libertos no Rio de Janeiro, sem emprego e com um Estado que buscava trabalhadores na Europa para suas lavouras, subiram os morros para criar suas moradias. O Morro da Providência, primeira favela registrada em nossa história, nasce assim, fruto de um estado Racista que liberou o povo negro mas não o inseriu em seu projeto de nação.
Hoje, o povo preto e das favelas segue fora do projeto de nação e do orçamento público e esse é o grande motivo de tragédias com as que, hoje, vive Petrópolis.
Saneamento, mudanças climáticas e orçamento: onde o Estado entra nessa equação?
Do mesmo modo que é comum os chavões já mencionados, é também comum que os cortes no orçamento público, para garantia de pagamentos de juros da dívida, superávits e manutenção do famigerado teto de gastos, sempre atinjam, prioritariamente, áreas que são essenciais para combater esse tipo de tragédia e dar dignidade ao povo.
Em 2021, o governo Bolsonaro reduziu em 75% o orçamento para ações de prevenção a desastres naturais do Ministério de Desenvolvimento Regional, principal responsável por programas para conter eventos climáticos extremos. O recurso passou de R$ 714 milhões em 2020 para R$ 171 milhões no ano passado. No mesmo ano foi feito o corte de 98% dos recursos do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR) que financia programas como o Minha Casa Minha Vida (hoje chamado de Casa Verde Amarela e que, na prática, não entrega casa alguma ao povo).
Nas questões referentes ao Saneamento Básico é ainda mais grave o descaso pois, enquanto a tendência mundial é do Estado assumir a gestão da água e dos Esgotos nas cidades, no Brasil o governo de Bolsonaro e Paulo Guedes, aliado ao governo de Claudio Castro, fez de tudo para vender a CEDAE e terceirizar para a iniciativa privada a responsabilidade pela universalização dos serviços de saneamento em nossas cidades. Em 2020, a redução nos investimentos em saneamento básico por parte do governo federal somaram 21%, cerca de R$ 200 milhões a menos para o setor.
No Governo do Estado do Rio de Janeiro a lógica de não investir na prevenção também se fez presente. A gestão do governador Cláudio Castro investiu apenas 47% do previsto em orçamento para o Programa de Prevenção e Respostas a Desastres. Mais de R$ 200 milhões do valor destinado para conter esse tipo de tragédia não foi empenhado pelo Governo de Cláudio Castro, o que colocou o programa “Prevenção e Respostas aso Riscos e Recuperação de Áreas Atingidas por Catástrofes” na 42ª posição do ranking de execução num total de 72 programas ativos na gestão estadual.
Esses dados revelam que a lógica presente à época da abolição ainda persiste. Hoje, pretos, pobres e moradores das favelas não se encontram no orçamento. E essa ausência reflete em crescimento de moradias em locais de risco, em fome, em tragédias como a da última terça-feira. Sem a inclusão do povo no orçamento, todo verão iremos chorar as vítimas de mais um desastre.
Mais ciência, menos negacionismo
Além de mais investimentos, é preciso mais ciência no combate aos “desastres naturais”. Há anos “se chove em dias o que era previsto para meses”. Alguns especialistas alertam que as mudanças climáticas mudaram os padrões das chuvas e, somente dando um basta no negacionismo e investindo em ciência e tecnologia vamos poder realmente saber os impactos das mudanças climáticas em nosso país. No entanto, essa é outra área atacada pelo governo federal.
Somente esse ano, o Ministério da Economia tentou reduzir em 87% as verbas de Ciência e Tecnologia e, mesmo com a “devolução” de parte do valor, segundo pesquisadores da USP, o Brasil vive hoje com o menor orçamento para o setor de toda a história. Fato que é confirmado pelo valor destinado ao CNPq, que esse ano recebe pouco mais da metade do que recebeu ano passado (quando já sofreu com robustos cortes). O CNPq é o órgão que paga por bolsas de pesquisa para estudantes da pós-graduação e para o mestrado, sendo a principal ferramenta de incentivo à pesquisa, ciência e tecnologia no país.
Para superarmos os desafios e dar uma vida digna ao povo pobre precisamos mudar a lógica como o Brasil é governado. Precisamos de mais saúde, saneamento, ciência e meio-ambiente. Precisamos derrotar não apenas o governo de Jair Bolsonaro e Claudio Castro, mas derrotar toda ideologia negacionista espalhada pelos mesmos ao longo dos últimos anos.