Fotos: SIT-RN
De acordo com Mirella Lopes e Rafael Duarte, repórteres da Agência Saiba Mais, duas trabalhadoras domésticas foram resgatadas da escravidão contemporânea no Rio Grande do Norte, na segunda-feira (24) e na quarta-feira (26). Uma em Mossoró e outra em Natal.
Os auditores da Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), órgão de auditoria e fiscalização do Ministério do Trabalho e Previdência, dizem que as duas foram encontradas em situação degradante, uma trabalhava por moradia e comida e a outra recebia R$ 500 por mês, sem direito a descanso semanal e em jornada de trabalho definida.
A trabalhadora resgatada em Mossoró tem 48 anos e foi explorada pelos mesmos patrões há 32 anos, segundo a coordenadora da operação, Marina Sampaio. Então ela trabalhava na casa desde os 16 anos sem receber salário e sem os direitos trabalhistas respeitados. Além de tudo isso, a trabalhadora sofria abuso sexual. Já se sabe que o empregador é Geraldo Braga da Cunha, pastor da Assembleia de Deus.
Já a trabalhadora resgatada em Natal tem 65 anos e trabalhava na casa dessa família há 5 anos. Era obrigada a ficar à disposição 24 horas por dia, todos os dias da semana, com folgas apenas a cada 15 dias. Durante todo esse período, tirou férias apenas uma única vez, informa a coordenadora da operação.
Além disso, Marina contou à Agência Saiba Mais, que essa mulher resgatada “sabia que algumas coisas não estavam certas, especialmente a questão do descanso. Tentou negociar para que recebesse folga semanal, mas não deu certo. Recebia R$ 500, menos que um salario mínimo, desde que iniciou o trabalho. Nunca recebeu hora-extra, décimo-terceiro e quando veio a pandemia ainda ficou quatro meses sem receber salário”.
Informações do Ministério do Trabalho apontam o resgate de 27 trabalhadoras domésticas vivendo sob condição análoga à escravidão, em 2021, no país. No mesmo ano, 1.937 trabalhadoras e trabalhadores foram resgatadas da situação de escravidão contemporânea, em 443 operações. Segundo o ministério, esse é o maior número desde os 2.808 trabalhadores resgatados em 2013.
Para Felipe Lima, secretário da Juventude da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil, seção Rio Grande do Norte (CTB-RN), “esses resgates mostram a necessidade de termos um Ministério do Trabalho atuante, em defesa de que vive do trabalho”.
Ele diz também que “precisamos de uma fiscalização mais abrangente, em todo o território nacional, para pôr fim à essa desumanidade”.
Destaca a necessidade de amparo em todos os níveis às vítimas resgatadas de trabalho escravo. “Essas pessoas precisam ser trazidas de volta para a vida. A indenização cobrada aos abusadores deve ser compatível com a gravidade da violência sofrida por essas pessoas por anos e a recuperação delas deve ser responsabilidade do Estado”.
Os auditores do trabalho afirmam que as denúncias anônimas têm sido fundamentais para se chegar às pessoas exploradas pelo trabalho escravo contemporâneo. Para isso, destacam o e-mail [email protected] e o Disque 100 como formas de denunciar esses abusos. Também há a página no Instagram @trabalhoescravo.
Afinal, “todas as pessoas são responsáveis para salvar a vida de vítimas de violência e abusos”, alerta Felipe.
Marina Sampaio explica que os acusados responderão a processos administrativos quanto às infrações trabalhistas, mas após a conclusão dos relatórios serão denunciados à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal, visando a investigação criminal.
“Trabalho escravo não é trabalho, é crime”, argumenta o dirigente da CTB-RN. “Em pleno século 21, esse tipo de coisa não pode mais passar impune e o governo federal deve ampliar as verbas para a fiscalização, com a realização de concursos para auditores do trabalho e ir para cima desses péssimos patrões”.
Leonardo Sakamoto informa que “desde 1995, quando o Brasil reconheceu diante das Nações Unidas a persistência do trabalho escravo em seu território, até o final do ano passado, mais de 57 mil pessoas foram resgatadas”.