Por Marcos Aurélio Ruy
Alguns acontecimentos têm exigido respostas imediatas do movimento sindical para manter-se na resistência aos desmandos do capital e mobilizar a sociedade para impedir a destruição dos direitos ao trabalho decente e a uma vida digna.
O Relatório Mundial sobre as Desigualdades para 2022, liderado pelo economista francês, Thomas Piketty, revela que os 10% mais ricos detêm 52% da renda global, enquanto a metade mais pobre fica com apenas 8%.
Tradução feita por Vítor Costa para o site Outras Palavras, da reportagem de Rôney Rodrigues, revela que a disparidade é abissal. Enquanto a renda média anual dos mais ricos corresponde a US$ 122.100, mais do que 30 vezes superior a renda média individual dos mais pobres que é de US$ 3.920 por ano.
“Esse quadro de aprofundamento das desigualdades fica muito evidente com a situação vacinal da população mundial”, afirma Thaisa Daiane Silva, secretária-geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag). “Enquanto os países ricos contam com sobras de doses de vacinas, a maioria dos países pobres não conseguiu vacinar nem 10% de sua população”, assinala.
O estudo revela também que os 10% mais ricos do mundo possuem 76% de toda a riqueza, enquanto os 50% mais pobres têm somente 2%. Essa ação do capital contra o trabalho, no atual estágio do capitalismo, “cria mais concentração de riquezas e consequentemente o aumento da pobreza”, argumenta Ronaldo Leite, secretário-geral da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB).
Para ele, “a falta de ação do desgoverno federal para combater a crise sanitária, causada pela pandemia do coronavírus, aprofundou a crise econômica do país e acelerou a desindustrialização do país”.
A Pesquisa Industrial Anual 2019, divulgada neste ano pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostra que a desindustrialização acontece há décadas no país, mas se aprofunda com a política neoliberal dos anos 1990 e ainda mais com o ultraliberalismo do governo atual.
A repórter Regiane Oliveira, do El País Brasil, revela na matéria “Vamos virar uma grande fazenda”: Brasil vive acelerada desindustrialização, que de 2013 a 2019, o país perdeu 28.700 empresas e 1,4 milhão de postos de trabalho. “Essas empresas empregavam antes da crise sanitária 7,6 milhões de pessoas, uma redução de 15,6% sobre 2013”.
Como aponta a reportagem, “o auge da comparação da indústria de transformação aconteceu em 1985, quando chegou a representar 24,5% da economia do país. No terceiro trimestre deste ano, o peso do setor voltou a subir um pouco, chegando a 12,5% da geração de riquezas do país”, praticamente a metade do que representava nos anos 1980.
Para Leite, “a desindustrialização virou um projeto do desgoverno Bolsonaro” porque “ele quer transformar o Brasil em exportador de alimentos e destinado à mineração”. Isso explica “os grandes incentivos ao agronegócio, além de pretender ocupar as terras indígenas”.
Acontece que “nenhum país consegue sua independência da economia global sem um parque industrial que lhe proporcione avanços tecnológicos e científicos”, assegura Thaisa.
Ainda mais, “com os avanços tecnológicos e as consequentes mudanças no mundo do trabalho”, reforça Leite. “O atual governo brasileiro faz de tudo para impedir o movimento sindical de mobilizar a classe trabalhadora contra esse modelo concentrador de riquezas e exterminador de direitos”.
Segundo a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), houve, em contrapartida, um crescimento da participação do setor agropecuário no Produto Interno Bruto (PIB), ao contrário do que acontece com a indústria e o setor de serviços, que estão em queda. O setor agropecuário representou, de acordo com a CNA, 6,8% do PIB em 2020 e tem estimativa de atingir 7,9% neste ano e 8,3% em 2022.
Vânia Marques Pinto, secretária de Política Agrícolas da CTB e da Contag, questiona a quem esse crescimento beneficia. Porque “olhando para o campo brasileiro e com o potencial que a agricultura familiar tem para produzir alimentos o ideal é um projeto de sociedade que invista em políticas de inclusão produtiva e na organização e comercialização da produção, com investimentos nas agroindústrias familiares, nas cooperativas e associações”.
Ela reforça ainda a necessidade de “incentivos para facilitar a comercialização dessa produção beneficiada”. E aí “ao invés das agricultoras e agricultores comercializarem apenas a fruta in natura, poderiam comercializar geleias, polpas, sucos etc”.
A desindustrialização afeta a vida do país de forma “a aumentar a nossa dependência da economia globalizada”, emenda Thaisa. Isso “se revela inclusive na produção agrícola, onde os grandes produtores visam a exportação em abandono do mercado interno”, além de “concentrarem cada vez mais a posse da terra em poucas mãos” e “com uma produção totalmente mecanizada, criam poucos empregos”.
Enquanto Vânia acentua as dificuldades enfrentadas pela agricultura familiar no atual governo. “Existe uma real dificuldade no escoamento da produção, com problemas estruturais com estradas, feiras para comercializar e falta de recursos para a compra e a venda nos mercados institucionais”.
Mas, reforça, “a agricultura familiar brasileira é bem diversa” e “apesar das dificuldades tem se reinventado e resistindo para comercializar o excedente de suas produções”. Thaisa defende a reforma agrária como “para haver uma distribuição de terras compatível com a necessidade de quem trabalha no campo para a produção de alimentos saudáveis”.
Para Leite, “o novo governo, que assumir em 2022, deve priorizar a recuperação da indústria no país, preconizando uma produção sustentável, com investimentos para elevar o patamar de vida e aprimoramento do conhecimento sobre as novas tecnologias e melhorar a organização para enfrentar as mudanças no mundo do trabalho, tanto na cidade quanto no campo”.