Por Marcos Aurélio Ruy (Foto: Shutterstock)
Nenhuma novidade no veto do ainda presidente Jair Bolsonaro a artigos da Lei 14.214/21, da deputada federal Marília Arraes (PT-PE). Ele vetou justamente a distribuição gratuita de absorventes femininos para estudantes de baixa renda matriculadas em escolas da rede pública, pessoas em situação de rua ou em situação de vulnerabilidade, além de pessoas apreendidas e presidiárias e jovens internadas em unidades para cumprir medida socioeducativa.
A bancada feminina no Congresso já se articula para derrubar o veto e dessa forma garantir a integridade do Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual, instituído pela lei.
Celina Arêas, secretária da Mulher Trabalhadora nacional da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) afirma que esse “veto prejudica milhões de meninas que não têm condições financeiras de comprar absorvente, que é muito caro e deveria constar dos itens básicos para a higiene pessoal das meninas e mulheres e assim baratear o seu preço”.
Isso porque, como mostram o Fundo de Populações nas Nações Unidas e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), mais de 4 milhões de meninas não têm acesso à saúde menstrual no país. Segundo esse estudo, uma a cada quatro das meninas que menstruam faltam às aulas por não ter acesso aos itens básicos de higiene no período menstrual, que dura de 5 a 7 dias normalmente.
Segundo a reportagem de Joana Oliveira, do El País Brasil, nos artigos vetados pelo Executivo, os artigos vetados contemplam mais do que as 5,6 milhões meninas e mulheres com necessidade desse aporte. Ela explica que o número pode ser muito maior porque “não são apenas mulheres que menstruam, mas também homens trans e pessoas não-binárias” e “apenas em São Paulo, a maior cidade do país, cerca de 10% da população de rua é composta de pessoas LGBTQIA+, de acordo com levantamento da prefeitura”.
Para Flora Lassance, secretária da Mulher Trabalhadora da CTB-BA, “o acesso a itens básicos de higiene é um direito humano” e o presidente ignora que “28% das mulheres brasileiras deixaram de ir à aula por não conseguirem comprar o item de higiene menstrual”.
Ela conta também que “na Bahia, por exemplo, o governo estadual, através da Secretaria de Políticas para Mulheres lançou o Projeto Dignidade Menstrual, que pretende atender 206 mil estudantes”. Muito importante entender que “superar a pobreza menstrual é dar dignidade a milhões de meninas, mulheres e pessoas vulneráveis. Estamos em luta constante pela vida das mulheres e de todas as pessoas”.
A Lei 14.214/21 previa um gasto anual de R$ 84,5 milhões por ano para atender 5.689.879 de meninas e mulheres. “O argumento de Bolsonaro de que não foi designada a fonte de recursos não procede”, argumenta Berenice Darc, secretária de Relações de Gênero da Confederação Nacional de Trabalhadores em Educação (CNTE) e dirigente nacional da CTB, porque “recursos para banqueiros, para o agronegócio e para blogueiros disseminarem fake news tem de montão”.
Além disso, “são apenas R$ 84,5 milhões por ano para fazer um bem às mulheres e ao país”, reforça. Os recursos devem vir do SUS de acordo com o projeto, que também cria um Fundo Penitenciário para esse propósito.
O estudo “Pobreza Menstrual no Brasil: desigualdade e violações de direitos”, do Unicef, aponta para a existência de 713 mil meninas vivendo sem acesso a banheiro ou chuveiro em seu domicílio e mais de 4 milhões sem acesso a itens mínimos de cuidados menstruais nas escolas.
“É fundamental agirmos para mudar essa realidade com a derrubada desse veto e a luta incessante para maiores investimentos em educação pública, estruturando as escolas e proporcionando condições de higiene em todas elas”, afirma Heloísa Gonçalves de Santana, secretária da Mulher Trabalhadora da CTB-SP.
Para a deputada Celina Leão (PP-DF), coordenadora da bancada feminina na Câmara, “se R$ 84 milhões for muito dinheiro para o governo dar condições a meninas e a mulheres, eu acho que o governo tem de rever seus princípios. Ele tem de repensar a forma de tratar as mulheres do Brasil”.
Para Débora Nunes Henrique, secretária da Mulher Trabalhadora da CTB-RJ, “essa é mais uma das atitudes desse desgoverno que não tem o menor senso de justiça e sensibilidade para com as mulheres que estão em vulnerabilidade”. Ainda mais “em um país onde o desemprego só aumenta e a fome não para de doer, em vez de Bolsonaro se inclinar para trazer solução ele simplesmente veta um projeto que beneficiaria muitos meninas e mulheres que necessitam de verdade”.
Flora destaca a aprovação recente do Projeto de Lei 24.107/2021 da deputada estadual Olívia Santana (PCdoB-BA). A nova lei inclui na Política Estadual de Saúde da Mulher a realização de trabalho de campanhas, debates e conscientização sobre a saúde menstrual. Além de prever acesso gratuito a absorventes femininos nas escolas, unidades de saúde e prisionais do estado.
“A CTB se une à bancada feminina, a toda a sociedade e ao movimento feminista para a derrubada desse veto e assim garantir acesso aos itens básicos para a higiene menstrual”, garante Celina. “A nossa luta é para assegurar todos os direitos de saúde plena para as brasileiras”.